A Unicamp abriu um grupo de trabalho que será responsável por criar um serviço para acolher e fazer tratativas institucionais sobre denúncias de racismo. A equipe foi formalizada em 27 de maio pela reitoria da universidade estadual, em Campinas (SP), e atende uma das reivindicações apresentadas pela “Carta Antirracista” elaborada no ano passado por estudantes e professores da disciplina “Tópicos Especiais em Antropologia IV: Racionais MC’s no Pensamento Social Brasileiro”.
A equipe é composta por 15 profissionais, entre eles, a professora e diretora executiva de Direitos Humanos na Unicamp Silvia Santiago, na função de presidente. Os trabalhos devem ser concluídos em 90 dias, informa portaria assinada pelo reitor da instituição, Antonio José de Almeida Meirelles.
As reivindicações da “Carta Antirracista” surgiram após suposta ofensa racial praticada por um professor da Faculdade de Engenharia Mecânica durante aula. Outro pedido da carta é a concessão do título “doutor honoris causa” aos músicos do Racionais MC’s, mas ainda não há confirmação.
Silvia complementou que o caso que motivou a “Carta Antirracista” foi um dos que desencadearam na iniciativa do serviço, e reforçou que o objetivo é contemplar casos de racismo contras as comunidades negra e de estudantes indígenas. A diretora mencionou ainda os cuidados previstos nos trabalhos.
“Queremos organizar um serviço que cuide das pessoas vítimas do racismo para que haja entendimento e possibilidade de ação que seja eficaz para si e para a comunidade universitária, especialmente a comunidade negra e indígena. Um serviço que possa abordar e curar as dores, os desalentos, antigos e atuais, para que essas pessoas possam seguir adiante e construir vidas que resgatem a dimensão da felicidade e da cidadania plena, que compreendam seus direitos. Neste sentido, individual e coletivo, trabalhar com cada sujeito e coletivamente o cultivo de si, que aponte para um olhar cuidadoso e de reconstrução de suas comunidades de origem […] O racismo atinge a pessoa, mas é estratégia social de discriminação dos povos”, explicou a docente ao g1.
O que diz a Unicamp?
A Unicamp não mencionou se o serviço que será proposto pelo grupo de trabalho deve começar a funcionar este ou não. À época em que a carta veio à tona, a assessoria da universidade mencionou em nota acreditar que o diálogo e a multiplicação de medidas educativas são o melhor caminho para a resolução de conflitos e “necessário amadurecimento” institucional da universidade.
Além disso, a assessoria frisou que a transformação de currículos na direção da abordagem do racismo, e de incorporação de saberes advindos das culturas chamadas “periféricas” tem sido “fortemente discutida”, em várias instâncias e unidades da universidade.
Em novembro de 2022, a Unicamp ressaltou que havia mediação entre as partes envolvidas no evento que originou a Carta. Porém, nesta semana, Jaqueline disse que ela terminou sem acordo e o caso agora é tratado entre institutos. A Unicamp, contudo, não se manifestou sobre o andamento.
Ainda no ano passado, a instituição estadual também alegou que tem dado grande espaço e apoio à organização de eventos artísticos e acadêmicos que levem para a instituição “a voz de culturas que permaneceram por muito tempo à sua margem, como a indígena e a afro-brasileira“.
Outras reivindicações da Carta Antirracista
- Adoção de um percentual mínimo de produções e referenciais acadêmicos de negros, indígenas e países do sul global nos programas de disciplina e conteúdos formativos oferecidos pela universidade, reconhecendo as contribuições científicas e tecnológicas desses povos e regiões que foram subjugados pelo ocidente, mas que contribuem muito para o desenvolvimento da humanidade;
- Inclusão de produções culturais e sociais elaboradas por diferentes grupos da sociedade nos percursos formativos oferecidos pela universidade, como produção cinematográfica, musical, teatral, literária e outras expressões culturais, assim como narrativas de movimentos e coletivos que mobilizam as transformações da sociedade;
- Receber atores de saberes populares para lecionar nas disciplinas oferecidas na universidade (como curandeiras e seus saberes sobre ervas e plantas medicinais, parteiras, educadores sociais, agricultores familiares, artesãos, escritores periféricos, etc.);
- Formação dos profissionais e docentes da universidade sobre racismo institucional e violência de gênero;
- Investir e fortalecer o Projeto Memória do Movimento Negro do Arquivo Edgard Leuenroth, que já conta com arquivos das mais importantes organizações antirracistas do Brasil, e utilizar esses materiais para a formação da comunidade acadêmica em educação para as relações étnico-raciais;
O que diz a Unicamp?
À época em que a carta veio à tona, Unicamp mencionou em nota acreditar que o diálogo e a multiplicação de medidas educativas são o melhor caminho para a resolução de conflitos e “necessário amadurecimento” institucional da universidade.
Além disso, a universidade estadual frisou que a transformação de currículos na direção da abordagem do racismo, e de incorporação de saberes advindos das culturas chamadas “periféricas” tem sido “fortemente discutida”, em várias instâncias e unidades da universidade.
“O evento que originou a Carta está sendo objeto de uma mediação entre as partes envolvidas. Foi feita, também, uma ação educativa na unidade envolvida, por parte da Diretoria de Direitos Humanos (DeDH), para conscientização da comunidade sobre o racismo estrutural presente na nossa sociedade e na nossa comunidade. A Universidade tem o projeto de multiplicar essas ações educativas”, diz nota divulgada à época.
Após o caso A Unicamp, contudo, não se manifestou sobre o andamento desta mediação.
Em outro trecho, a universidade estadual também alegou que tem dado grande espaço e apoio à organização de eventos artísticos e acadêmicos que levem para a instituição “a voz de culturas que permaneceram por muito tempo à sua margem, como a indígena e a afro-brasileira”.