Indicação de juíza assusta conservadores

“A juíza [Sonia] Sotomayor é uma ativista judicial esquerdista de primeira ordem, que coloca sua agenda política pessoal acima da lei escrita. Ela acredita que juízes devem ditar a política e que gênero, raça e origem étnica de uma pessoa devem influir nas decisões tomadas pelos magistrados.”

Por HÉLIO SCHWARTSMAN, da Folha de S.Paulo 

AP PHOTO/PABLO MARTINEZ MONSIVAIS

Essa declaração de Wendy Long, membro da Rede de Confirmações Judiciais e incontinênti reproduzida na blogosfera conservadora americana, é emblemática. Resume em poucas linhas as principais restrições que a direita dos EUA faz à primeira indicada do presidente Barack Obama para a Suprema Corte: ativismo judicial e excessos na ação afirmativa.

Também a esquerda está apreensiva. A posição de Sotomayor em relação ao aborto não é bem conhecida. Poucos casos envolvendo a matéria passaram por seu tribunal. Num deles, de 2002, a juíza, que é católica, deu razão ao governo de George W. Bush, que sustentava ter o direito de não financiar com dinheiro federal ONGs internacionais que oferecem serviços de aborto.

O receio dos chamados grupos pró-escolha é que a chegada à Corte de mais um membro contrário à prática poderá levar à revisão de Roe vs. Wade, o precedente estabelecido em 1973 que considera o aborto protegido pelo direito constitucional à privacidade e impede Estados e o governo federal de criar leis que o restrinjam.

Tradicionalmente, o conservadorismo torce o nariz tanto para o ativismo judicial como para a ação afirmativa. “Legislar dos tribunais” costumava ser o pior insulto que um republicano podia lançar a um magistrado -hoje, alguns conservadores flertam com essa ideia, mas, asseguram, apenas para “consertar” os estragos que décadas de ativismo judicial de esquerda teriam causado.

Na visão mais tradicional, sempre que juízes se baseiam em interpretações muito genéricas da lei e da Constituição para firmar jurisprudência, eles usurpam o papel do legislador. E isso seria ruim porque, pela teoria da repartição dos Poderes, inovações devem vir do Legislativo. O Judiciário teria de ser um Poder essencialmente conservador, a fim de promover a segurança jurídica.

Teóricos mais liberais contestam. Afirmam que o uso de elementos extralegais é inevitável. Dizem também que inovações trazidas por magistrados são importantes para evitar que distorções típicas do Legislativo contaminem o sistema legal. Por serem eleitos, congressistas estariam sempre agindo para agradar a maioria -o que representaria ameaça a direitos de minorias.

Já a ideia de que é lícito favorecer grupos étnicos como compensação por desequilíbrios sociais fere, na visão da direita, o princípio fundamental da igualdade de todos diante da lei. Por ironia, entre os fatores que levaram Obama a escolher Sotomayor estão questões de gênero e etnia -é a primeira descendente de latino-americanos e a terceira mulher a chegar à Corte.

Sabatina

Os calafrios que a indicação da juíza provoca em alguns republicanos não devem ameaçar sua aprovação pelo Senado -onde os democratas têm maioria-, mas deverão fazer com que alguns pontos de sua biografia sejam questionados com firmeza na sabatina.

No que diz respeito ao propalado ativismo judicial da juíza, o fogo deverá recair sobre uma polêmica mesa-redonda na Universidade Duke em 2005, em que Sotomayor declarou: “É na corte de apelações que se faz política… eu sei que estou sendo filmada e que não deveria dizer isso, porque nós não fazemos a lei”.

Em relação a supostos excessos na ação afirmativa, é a decisão por ela tomada em Ricci vs. DeStefano que será escrutinada. Neste caso de 2008, Sotomayor e outros juízes do 2º Circuito de Apelações permitiram que o município de New Haven, em Connecticut, desprezasse os resultados de uma prova que deveria resultar em promoções para os bombeiros, porque nenhum candidato negro tinha passado no teste. O caso agora está na Suprema Corte, e as apostas são de que o acórdão será revertido.

Outras críticas à atuação de Sotomayor incluem seu destempero verbal e o fato de algumas de suas sentenças terem sido reformadas pela Suprema Corte. Em três ocasiões, os juízes afirmaram que Sotomayor errou na interpretação da lei.

 

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