Profa. Maria Niza: Memórias e realidade social da população negra em Londrina é tema de projeto

“O principal objetivo do projeto é tornar conhecida a história, memória e a trajetória da população negra em Londrina”, diz Maria Nilza da Silva, coordenadora do projeto “A população negra em Londrina: Memórias e Realidade Social”. Ela é graduada, mestre e doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), e pós-doutora pelo Centro D’Analyse Et D’Intervention Sociologiques junto a Ecole des Hautes Etudes também em Ciências Sociais. O Conexão Ciência conversou com a professora pós – doutora Maria Nilza da Silva para saber mais sobre o assunto.

Conexão ciência: Qual o objetivo do projeto?

Profª Pós-Dra Maria Niza: O projeto tem como principal objetivo tornar conhecida a história, memória e a trajetória da população negra em Londrina. Vários grupos raciais de diversas origens étnicas têm sua história contada pela população, porém isso não acontece com os afrodescendentes, que só tem sua trajetória lembrada por eles mesmos. O trabalho visa analisar não só o passado do negro, mas também a realidade social cotidiana e contemporânea, para que estes possam se orgulhar de sua origem e valor na consolidação da cidade, buscando forças para acabar com a discriminação.

Conexão ciência: Qual foi a metodologia utilizada para a pesquisa?

Profª Pós-Dra Maria Niza: É utilizada uma metodologia com bases quantitativas e qualitativas nesse projeto. Quantitativa através de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) com o objetivo de fazer uma análise demográfica da população. E qualitativa por intermédio de estudos e entrevistas coletadas com pessoas que moram na cidade a mais de 30 anos. Uso pesquisas e dissertações feitas por outras pessoas, assim como os meus próprios estudos e de estudantes que vêm coletando dados há alguns anos.

Conexão ciência: Essas pesquisas já renderam alguma publicação?

Profª Pós-Dra Maria Niza: Sim, publicamos cartilhas sobre dois personagens negros que desempenharam um importante papel na colonização da cidade de Londrina. 

Conexão ciência: Quantas e quem são essas personagens?

Profª Pós-Dra Maria Niza: Uma das cartilhas retrata a vida de Justiniano Clímaco da Silva, um dos primeiros médicos que trabalhou na cidade. Ele atendeu seus pacientes num contexto repleto de epidemias, que exigia a dedicação total ao ofício, ultrapassando as imensas barreiras da falta de condições para o exercício da clínica. E a outra retrata a história da Vilma Santos de Oliveira, conhecida como Dona Vilma ou Yá Mukumby, outro personagem muito importante para Londrina. 

Serão analisados 10 personagens para que se possa elaborar um livro.

Conexão ciência: Qual a realidade do afrodescendente em Londrina?

Profª Pós-Dra Maria Niza: A realidade dos negros brasileiros no Brasil e aqui em Londrina não tem muita novidade, pois ao estudar a trajetória deles em todo o país nós percebemos que ainda existe o problema da discriminação racial e, sobretudo da desigualdade de oportunidades.

Até pouco tempo havia muitas pessoas que acreditavam ter uma democracia racial no Brasil, porém em torno de uns 10 anos começou a ter um debate maior sobre a situação da população afro no Brasil e hoje é difícil alguém dizer que não há preconceito e segregação.

Conexão ciência: Qual a repercussão da escravidão para os afrodescendentes nos dias atuais?

Profª Pós-Dra Maria Niza: A sociedade pós escravidão pensava que para ter um país desenvolvido era preciso que a sociedade “embranquecesse”, então houve todo um incentivo pra que ocorresse uma imigração de europeus e a consequente invisibilidade do negro que é o principal problema sofrido por eles. Os imigrantes vieram, contribuíram pra o Brasil entrar no mundo moderno, mas ao mesmo tempo o governo brasileiro deixou de lado aquela população que já estava trabalhando por 400 anos. Foi assim que os afrodescendentes ficaram a margem da sociedade, sem condições de estudo e trabalho, trazendo repercussões pros dias de hoje.

Conexão ciência: E o que foi feito para que essa invisibilidade fosse combatida?

Profª Pós-Dra Maria Niza: Para tentar combater essa invisibilidade e transformar esse pensamento, foi criada, em 2003, a lei 10.639/03 que tornou obrigatória a implementação de estudos sobre a História da África e da cultura Afro-brasileira nas escolas. Com isso a sociedade poderá conhecer mais além do que a história da escravidão, e saber que antes desta muitos dos negros eram reis, viviam numa sociedade livre, ou seja, o negro não nasceu escravo como se pensa no senso comum.

Conexão ciência: Quais são as conclusões obtidas até o momento?

Profª Pós-Dra Maria Niza: O que se pode concluir é que através dessa referência histórica diferenciada o negro pode se conscientizar da discriminação que sofre e se orgulhar da sua trajetória, conquistas e cultura. Pois se eles obtiverem orgulho de sua participação na construção da cidade de Londrina e de todo o Brasil, ele vai ter mais força pra superar desafios e ter uma vida melhor, sem preconceito.

Crédito da foto: Flávia Cheganças

Fonte: Conexão Ciência

+ sobre o tema

para lembrar

Combate ao racismo na primeira infância é tema de audiência na Câmara dos Deputados

Geledés Instituto da Mulher Negra participará da audiência pública...

Desafio Campus 2030 para estudantes e professores universitários recebe inscrições até 16 de fevereiro

Estudantes e professores universitários de todo o mundo têm...

Em 16 anos de cotas raciais, UnB formou 4.791 pretos, pardos e indígenas

Pioneira na adoção de política de cotas raciais para...
spot_imgspot_img

Geledés participa do I Colóquio Iberoamericano sobre política e gestão educacional

O Colóquio constou da programação do XXXI Simpósio Brasileiro da ANPAE (Associação Nacional de Política e Administração da Educação), realizado na primeira semana de...

Aluna ganha prêmio ao investigar racismo na história dos dicionários

Os dicionários nem sempre são ferramentas imparciais e isentas, como imaginado. A estudante do 3º ano do ensino médio Franciele de Souza Meira, de...
-+=