Leilane Assunção morreu nessa terça-feira (13) aos 37 anos. Ela, que é considerada uma das primeiras professoras transexuais de uma universidade pública do Brasil , estava internada no hospital Giselda Trigueiro, no Rio Grande do Norte e morreu por contágio fúngico.
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Imagem retirada do site
A professora deu entrada no hospital há 30 dias com quadro de anorexia que resultou em uma pneumonia. Ela teria sido levada no último fim de semana à Unidade de Terapia Intensiva (UTI), onde teve uma infecção e não resistiu.
No dia 1º de novembro, ela chegou a gravar um vídeo de agradecimento às mensagens positivas e ajuda em uma vakinha aos amigos, professores e ex-alunos. “Eu queria agradecer a toda onda de solidariedade e amor. Vocês estão sendo fantásticos, eu nunca pensei que fosse tão amada e querida por tanta gente”, declarou.
Leilane era conhecida pela atuação na Universidade Federal do Rio Grande do Norte durante 18 anos. Era doutora em Ciências Sociais e professora da Pós-Graduação em História da UFRN. Seu mestrado foi sobre Clara Nunes, trabalho que ela sonhava em publicar um livro. A especialização acadêmica era em pesquisas históricas sobre o Brasil contemporâneo e as artes.
Ela também era ativista dos direitos humanos, sobretudo LGBT, sendo uma das coordenadoras do Instituto Brasileiro Trans de Educação (IBTE). Ela também era defensora de um debate profundo e sem moralismos sobre a descriminalização das drogas. Segundo ela, a proibição levava ao tráfico, a violência e também ao consumo.
Em 2011, representou a professora Berenice Bento no Prêmio Nacional de Direitos Humanos pela defesa dos direitos das travestis e mulheres trans sexuais. Recebeu a premiação das mãos da então presidenta Dilma Rousseff (PT) e foi citada como “uma exceção em meio à exclusão”.
TRANSFOBIAS
Mas nem tudo foram flores na vida da acadêmica. Leilane enfrentou muitas transfobias institucionais, sobretudo quando deu início à sua transição de gênero dentro da universidade, aos 24 anos. O nome social foi desrespeitado até 2011, obrigando-a assinar com dois nomes entre aspas.
Em 2017, ganhou uma indenização por danos morais, já que para ministrar as aulas uma servidora se negava entregar a chave, dizendo que “só abriria a porta para o professor”, não reconhecendo a qualificação e a identidade da professora.
Recentemente, ela perdeu uma bolsa de ensino, já que era também era aluna de pós-graduação, após a readequação financeira que o Governo Federal. Ela continuou como professora substituta, mas o contrato não foi renovado após os dois anos pré-estabelecidos. Desde então passava por dificuldades financeiras.
Amigos chegaram a organizar uma vakinha para a recuperação da professora. Eles pediam R$ 5 mil, mas acabaram recebendo 14.078,00. Eles acreditam que, pela situação que estava passando, Leilane foi adoecendo, com depressão, anemia, até sua internação e morte.
FOI RESISTÊNCIA E HOJE É SÍMBOLO
Nas redes sociais, familiares, amigos, professores e estudantes lamentaram a morte da professora e destacaram sua contribuição. A professora Rebecka de França declarou que Leilane era referência em educação feita por pessoas trans e que é difícil receber a notícia de sua morte.
“Nossa pioneira a enfrentar o mundo acadêmico sem política de nome social e muitas vezes desrespeitada pela própria instituição. Leilane vai-se, mas deixa um legado incrível de perseverança, luta e quebra de estigmas”, escreveu.
A professora Sayonara Nogueira, do Instituto Brasileiro Trans de Educação, também lamentou. “Perdemos uma grande profissional e parceira hoje. Leilane Assunção, professora, transexual, historiadora e Doutora, era uma das coordenadoras do IBTE e ativista dos Direitos Humanos. Mais uma estrela a abrilhantar o Universo”.
Já a esteticista Lina Fônseca Albuquerque, amiga que estudou ao lado de Leilane e que permaneceu ao seu lado na internação, diz que a professora foi transgressora ao ir na contra mão de todas as expectativas sociais.
“Mostrou que conseguiu a mais alta titulação acadêmica por mérito. Era uma intelectual. Foi a primeira doutora trans do Brasil. Amava a educação, a arte e a cultura. Amava conhecer. É uma perda imensurável para a educação do nosso país, para as universidades públicas, para a causa LGBT que representava com tanta expressividade. Leilane foi resistência e hoje é símbolo”, declarou.