O desabafo de Nicki foi sobre todos nós, negros!

O que mais vem sendo debatido sobre as indicações do VMA 2015 são os comentários de Nicki Minaj no Twitter, na terça (21). Afinal, a mídia branca adora colocar uma mulher negra como barraqueira e agressiva reforçando esse estereótipo racista sobre nós – mesmo ela não sendo e só falando o que outras negras já vêm dizendo há tempos, inclusive Azealia Banks, sobre o que a indústria da música é: RACISTA.

Por Stephanie Ribeiro Do Festival Marginal

Após as indicações do VMA saírem, Nicki usou sua rede social para desabafar sobre o fato do vídeo “Anaconda” não ter sido nomeado a Vídeo do Ano (mesmo após a própria MTV ter feito o maior auê na época da estreia):

nicki

Tradução livre do tuite 1: “Se o seu videoclipe celebra mulheres com corpos magros você será nomeada por vídeo do ano :D”

Tradução livre do tuite 2: “Eu não estou sempre confiante. Estou cansada. Mulheres negras influenciam a cultura pop tanto e são raramente premiadas por isso”

Azealia Banks aproveitou para reforçar o recado da amiga:

Captura-de-Tela-2015-07-22-às-01.23.56

Tradução livre: “Todos os meus vídeos merecem um VMA e meu álbum merece um Grammy, mas eu nunca terei um porque a América não gosta de mulheres negras com opinião”

Então o que deveríamos estar debatendo é como o racismo ainda recai sobre nossas escolhas e chances em todos os meios. Você pode até ser uma mulher negra, rica e poderosa, mas não estará nunca livre dos estereótipos e do silenciamento e apagamento diante uma pessoa branca, mesmo que o talento dela seja menor que o seu. Afinal, o branco sempre terá a branquitude a seu favor.

A reação de Taylor Swift foi o que se esperava de uma pessoa branca: acreditar que o problema É ELA e não o coletivo, levar para o pessoal e ainda se achar acolhedora quando diz “vamos para o palco juntas” (prêmio de consolação). Quando, na verdade, a única forma que ela poderia mostrar empatia nesse caso era repostando o que Nicki estava evidenciando. Entender de privilégios é isso, perceber seu lugar de fala e sua contribuição para a manutenção do sistema excludente para com os demais de minorias que você não faz parte. E nesse caso, Taylor fez o papel dela como branca opressora.

Assim que Nicki postou seus tuites, Taylor Swift se intrometeu na história e passou essa vergonha:

Captura-de-Tela-2015-07-22-às-01.27.27

Tradução livre para o tuite 1: “Se eu ganhar o prêmio, por favor suba ao palco comigo! Você está convidada para qualquer palco em que eu esteja”

Tradução livre para o tuite 2: “Eu não fiz nada, mas amar e dar suporte a você. É diferente de você que instiga mulheres a ficarem umas contra as outras. Talvez um dos homens tenha roubado sua indicação”

Podemos pensar várias coisas sobre isso. A primeira é fazer a crítica à indústria da música que vem sempre apagando negros. Se você quer se destacar precisa ser muito bom, muito bom MESMO. Já um(a) branco(a) só precisa ser mediano e ter um rostinho vendável. Um exemplo disso é Iggy Azalea, quem além de ser o símbolo da apropriação cultural, não esbanja nem ⅕ do talento de Azealia Banks e ainda assim as pessoas insistem em dizer que ela é “Rainha do Hip Hop”.

Num mundo com tantas mulheres negras fazendo músicas em todas as áreas campos e com assuntos dos mais diversos, por que uma mulher branca que apareceu ontem e se mostra totalmente aleatória é considerada rainha? Apenas mais um produto mídiatico vendável e branco, fazendo (tentando nesse caso) música conhecida pelo protagonismo negro.

O típico: queremos o som dos pretos, mas sem eles participando.

O racismo é tão surreal e as escolhas beiram tanto a mediocridade que vivemos num mundo onde Macklemore ganhou o Grammy em cima de Kendrick Lamar. Esse que pelo menos foi humilde em reconhecer sua mediocridade e dizer que não merecia – coisa que Iggy não faz e parece que Taylor também não (não engoli ela ganhando da Beyoncé ainda).

tuite-novo

Talvez todos nós negros tenhamos um pouco de Kanye West em nós, afinal estamos bem cansados de uma história sempre nos calando ou “esquecendo”. Vamos ser sinceros: a questão não é inveja, é pura e simples revolta contra a sociedade racista que sempre nos desmerece e ainda empurra que é falta de “mérito” da nossa parte.

“Eu só concorro com artista negros, com estilos da música negra, nunca um prêmio principal. Tenho 29 anos, 22 Grammys. Vocês acham que eu não entendi o recado???” – Kanye West

A mídia não consegue entender que fazer da Nicki uma agressora e descontrolada é racismo. Fãs da Taylor não conseguem aceitar que o mundo não gira em torno dela e não param de supor que magrofobia e/ou racismo reverso existe.

foto-midia

vma

E músicas/videoclipes como “Alright” não serão debatidos além dos meios negros e duvido que ele mesmo sendo indicado a vídeo do ano ganhe, pelos motivos já citados acima.

Já a Beyoncé continuará sendo a negra que eles aceitam mais, e isso está inclusive ligado à estética que ela tem, e mesmo assim ainda vamos ter que ficar lendo matérias que falam que Katy Perry superou a Bey, como se Katy pudesse fazer isso.

Azealia Banks vai continuar sendo vista como “agressiva” e enquanto isso vamos continuar num mundo onde “ativistas” da Ku Klux Klan tem CORAGEM de ir para rua e fazer uma manifestação, onde um homem branco mata 9 negros numa igreja, onde jovens negros são mortos pela polícia por existirem e mulheres negras são as maiores vítimas de crimes como estupro.

Esse mundo lindo onde racismo não “existe”, magina, é coisa da nossa cabeça agressiva.

nicki-fim

 

 

+ sobre o tema

O deputado Leréia PSDB-GO quer processar policial que o acusou de racismo

O deputado Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO) quer abrir um...

A situação colonial, ou a arrogância do colonizador

Zoológicos humanos: entre 1877 e 1912, foram montadas, em...

A Justiça Militar nos pisoteia

Na próxima vez que o policial militar que pisou no...

Campanha do Estado sobre racismo institucional é finalista de prêmio nacional

A campanha sobre o racismo institucional do Governo do...

para lembrar

Em 4 semanas, mortes de pretos e pardos por Covid-19 passam de 32,8% para 54,8%

A porcentagem de pacientes mortos por Covid-19 entre os...

Ações policiais no Rio de Janeiro juntam brutalidade com ineficiência, critica pesquisador

Enquanto os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) debatiam...

“Dear White People” é a série necessária para um homem branco como eu

A nova produção da Netflix promove uma reflexão sobre...

“O racismo não é uma doença incurável”, afirma Thuram

Campeão do mundo e criador de fundação que combate...
spot_imgspot_img

Os incomodados que se retirem

O racismo "dói na alma". Palavras de um jovem atleta que carrega consigo "um defeito de cor" que se sobrepõe ao talento: é negro. Essa é...

A polêmica tem nome: racismo

O carnaval chegou ao fim, tiremos a fantasia. Existe um nome para a polêmica sobre os desfiles das escolas de samba do Grupo Especial. Sete letras....

Para quem acredita na vida

A categoria “enredo afro” me soa sempre como um pleonasmo, algo como “feijoada brasileira” ou “fado português”. Ninguém é obrigado a nada, mas escolher...
-+=