Thiago Vinicius: “A periferia vive em ‘cárcere social’”

A primeira mesa de discussão do seminário “A periferia no centro” contou com a presença de Semayat Oliveira (Nós, mulheres da periferia) Thiago Vinicius (Agência Solano Trindade), Theles Henrique (Liga do Funk), Pablo Capilé (Mídia Ninja) e Guilherme Boulos (MTST)

Por Redação

O primeiro a usar da palavra foi Thiago Vinicius, que, para acordar o público, lançou um “bom dia” em alto e bom som: “Tá parecendo festa de rico. Aqui é quebrada, tio!”. Comentando sobre a cultura periférica como método de “afirmação” de território, ele disse: “Isso é uma questão super importante, pois se antes o Campo Limpo, o Jardim Ângela e o Capão Redondo formavam o triângulo da morte – como os locais mais perigosos do país -, hoje ele é o triângulo da cultura da periferia”. Como consequência, Thiago afirma que isso provê um sentimento de pertencimento e que, a partir daí, com saraus, funks, hip-hop e outros movimentos culturais, faz com que o jovem da periferia, que “vive em um cárcere social”, torne a “quebrada” um lugar melhor.

Semayat Oliveira utilizou da própria composição da mesa como um simulacro da posição da mulher negra na sociedade: “Sou a única mulher aqui”. Contando sobre como começou o grupo “Nós, mulheres da periferia”, Semayat disse que surgiu de um blog chamado Mural e que o nome é muito forte, pois sai do singular para o plural – dando às mulheres uma voz coletiva para contarem suas histórias. “Cadê as histórias dessas mulheres que saem de casa para trabalhar, cuidam da casa e da família dos outros e depois têm de voltar para cuidar da sua casa e de seus filhos?”, questiona. E conclui que, pelo fato de tais mulheres serem em sua grande maioria negras, elas são muito mais marginalizadas: “Se torna uma combinação marginal de gênero, classe e raça”.

O coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, afirma que a sociedade brasileira não foi feita para o trabalhador e para a periferia, já que existe uma negação da cidade para essas pessoas: “Existe um setor que lucra com a cidade – imobiliária e construção – e com isso a maioria perde, pois não consegue acessar esse mercado”. Boulos forneceu alguns dados, como a valorização imobiliária na cidade (em São Paulo teve um aumento de 212% nos últimos 5 anos, sendo 185% só em Itaquera). “E o salário do peão continua 600, 700 reais. E aí, como é que fica?”, pergunta. A consequência, de acordo com o convidado, é que ele sai de Itaquera para ter que ir morar em Ferraz de Vasconcelos ou em Poá. “Surge uma periferia da periferia […] Pois quando recebe um Bolsa Família ou salário mínimo com uma mão, o aluguel vai tomar com a outra”, conclui.

Theles Henrique, um dos representantes da Liga do Funk nesse seminário, afirma que o funk está presente em 100% das comunidades periféricas e por isso ultrapassa a classificação de apenas gênero musical, “é um movimento cultural de gueto, como foi o samba”, diz. Em um nível mais pessoal, ele revelou já ter levado um tiro durante um assalto e que carrega essa cicatriz como um eterno lembrete para continuar lutando para fortalecer o funk para que os jovens acreditem em um futuro melhor: “Se esse moleque tivesse tido oportunidade, talvez ele não estivesse me assaltando”. Theles conta que um dos objetivos da Liga é que o funk seja, de fato, reconhecido como movimento cultural, pois a sociedade ainda o enxerga como simplesmente ligado ao crime e ao tráfico de drogas: “O funk tem também um poder mobilizador dos jovens que se encontram em vulnerabilidade social”.

Encerrando a primeira mesa de discussão, Pablo Capilé falou sobre a história do Fora do Eixo, que teve início em Cuiabá, capital do Mato Grosso. Ele explicou como ocorreu a criação do circuito cultural que a princípio interligou diversas cenas pelas regiões Norte e Centro-Oeste (daí o nome “fora do eixo”) e que hoje atua como um grande “corredor cultural”, que atingia não só o cenário musical, mas também a literatura, o cinema, e outros meios artísticos.

 

Fonte: Revista Fórum

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