O nude é racista?

O tom mais comentado (e usado) do momento vira alvo de polêmico debate

Michelle Obama já se acostumou a causar comoção com seus vestidos. Mas não poderia adivinhar o furor mundial que provocaria quando escolheu um longo que arrastava no chão, em um adorável tom de nude, para o encontro com o primeiro-ministro da Índia. O traje foi descrito por seu criador, Naeem Khan, como um vestido tomara-que-caia nude, com florais abstratos e lantejoulas em prata-esterlina. A agência de notícias Associated Press disse que era cor de carne, a cor da própria carne de Michelle. Agora, a AP parece ter revisado aquela descrição, redefinindo-a como champagne, ato que engatilhou um debate sobre o uso da palavra nude na moda.

Para qualquer um que lê revistas do ramo, esses termos são familiares. Os tons de nude (off-white, passando pelo rosa pálido ao dourado – nude refere-se a essas cores um tanto esmaecidas) estão em todos os lugares nessa primavera no hemisfério norte, tendo dominado as passarelas nas coleções apresentadas em Milão, Paris e Nova York.

A questão é que o tom nude vem sendo usado para referir-se ao mesmo tom de mulheres de tez branca. E aí reside toda a polêmica. E quando as mulheres negras usam o nude? Estão usando que cor?

– Para mim, nude seria se eu vestisse marrom – reivindica Dodai Stewart, editora-adjunta (negra) da revista Jezebel. – Nude não é nude para todas as mulheres, como as pessoas não percebem isso?

Não é apenas a descrição da cor que tem se mostrado ofensiva, mas a maneira como as peças em tom nude têm sido apresentadas em editoriais de moda. Na capa da InStyle de maio, a atriz Gemma Arterton aparece em um vestido tão próximo de seu tom de pele que parece misturar-se a seus seios e ombros, as duas peças lívidas, carne e vestido, de certa forma tingindo uma à outra, deixando o conjunto do look ainda mais claro.

Na edição de maio da revista Elle, que traz a palavra nude repetida nove vezes em uma única página, o “nude é a cor para a primavera-verão”. A editora Lorraine Candy diz que essa polêmica toda é bobagem e que o tom serve para todas.

– Nude é uma cor definida e acho que as mulheres não têm que entrar nessa neurose. Ainda mais a poderosa e incrível Michelle Obama. É errado ela se preocupar com isso – rebate.

Reina Lewis, professora de estudos culturais na London College of Fashion, faz coro:

– Michelle Obama estava incrível – elogia. – Escolheu um vestido fabuloso. Porém, na pele dela, o nude é revelado como uma cor, bem longe de ser algo neutro, como propõe o significado da palavra – corrige.

De fato, parece errado pensar nesses tons como neutros, quando o debate deixa claro que a tendência é qualquer coisa menos isso.

Fonte: Zero Hora

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