A educação não é tarefa individual

Mario Sergio Cortella é filósofo, mestre e doutor em educação pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo. Na universidade, é professor do Departamento de Teologia e Ciências da Religião e da pós-graduação em educação. Com suas ideias sobre o papel da escola – e da família – na formação escolar, Cortella abre hoje, às 9 horas, o Seminário Municipal de Educação, em Rio Negrinho. Ele falará sobre o tema “Como ser educador na sociedade do conhecimento e da informação?”.

Fonte: A Notícia

Em entrevista ao jornal “A Notícia”, Cortella antecipou qual a sua visão sobre o assunto. Cerca de 500 pessoas são esperadas para o evento, que é promovido em parceria com o Senac. Além da conferência, há cinco oficinas voltadas à educação e a peça “O que te Impede de Ser Mais?”, do grupo Toque de Areia. O seminário é apenas para os profissionais da rede municipal de ensino, que já se inscreveram para as atividades.

Essa é a segunda atividade do tipo promovida pelo Senac na região. Entre os dias 13 e 16 de julho, houve uma jornada pedagógica em São Bento do Sul.

Se fosse possível sintetizar os problemas da educação em um só, qual seria?

Cortella – O principal problema da educação é o desprestígio da escola. As pessoas desprezam a estrutura escolar como algo secundário na formação dos jovens e crianças. Esse desprezo se manifesta no descuido que se permite que o poder público tenha com a estrutura da escola. De nada adianta dizer que a educação é a prioridade se não exigirem dos governantes que se impeça o descaso.

Podemos dizer que o professor é um dos responsáveis pelo desinteresse dos jovens na escola?

Cortella – Não é a questão de um professor. A educação escolar não é uma tarefa individual. É uma tarefa coletiva de um grupo maior de pessoas. A família precisa colaborar mais nesse aspecto.

Como a família pode ajudar a escola nesse processo?

Cortella – A família não colabora com a educação dos filhos por um simples motivo: ela é a maior responsável pela educação. A tarefa colaborativa é da escola, não da família. O que a escola faz é cuidar da escolarização, não da educação. A educação é muito mais ampla do que isso. A escola é que deve colaborar com a família na educação, e não o contrário.

O senhor viaja o País todo. O que vê na educação catarinense que não tem em outros Estados?

Cortella – Santa Catarina tem uma educação muito comunitária. Tem uma presença muito grande da comunidade na escolarização. É uma sociedade que se organiza e que se obriga a ter uma presença muito forte da comunidade nas coisas, mesmo que o equipamento seja público. Isso dá um diferencial muito significativo e positivo para os catarinenses. Boa parte das famílias se sente, de fato, aquilo que ela é: proprietária da escola pública.

O senhor é a favor da criação de um ano extra no ensino fundamental (EF)?

Cortella – Sou absolutamente favorável a um EF de nove anos, inclusive porque é assim em países desenvolvidos. A França, que é nossa grande inspiradora, tem EF de nove anos. Claro que isso não pode ser colocado de forma abrupta. Mais do que isso: defendo que a educação básica seja obrigatória, em todos os níveis, inclusive no médio.

O senhor acha o vestibular um modelo justo de acesso à universidade?

Cortella – Há duas coisas que só existem no Brasil: jabuticaba e esse modelo de vestibular. Esse modelo é absolutamente cruel em relação à democratização do acesso. Quando se tem políticas de aumento do número de vagas, permitindo um acesso amplo, o vestibular deixa de ter o seu lugar. A partir daí, é necessário que o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) seja incorporado na estrutura da seleção.

O senhor concorda, então, com o novo modelo do Enem?

Cortella – Sem dúvida. Não precisa ser feito tudo de uma vez. Defendo, também, a nacionalização do Enem, ou seja, que pessoas de qualquer região disputem em condições de igualdade com as pessoas da região.

E o sistema de cotas é positivo?

Cortella – Sou um defensor das cotas para afrodescendentes alunos da rede pública. Para afrodescendentes, como uma medida emergencial. Ela não é suficiente, mas é necessária. Defendo que envolva pelo menos uma geração completa, tal como aconteceu nos EUA. Nós não teríamos um Barack Obama como presidente formado em Harvard se ele não tivessem investido nessa política.

 

+ sobre o tema

Bruno Gagliasso fala sobre a adoção de Titi e Bless

Bruno Gagliasso foi o convidado de João Vicente de...

Por que é importante que pessoas brancas falem sobre racismo?

Vamos deixar a ilusão da democracia racial de lado...

O combate ao racismo no trabalho, por Sueli Carneiro

Uma iniciativa pioneira da sociedade civil vem resultando em...

para lembrar

Racismo de John Mayer

John Mayer usou o Twitter para se desculpar...

Famosos divulgam mensagens de apoio à Titi Gagliasso, vítima de racismo por socialite Day McCarthy

Artistas como Glória Maria, Thiaguinho e Zezé Motta compartilharam...

LEAMESP lamenta e repudia ato contra cotas de alunos durante a Pré-Intermed

No último dia 20, durante uma partida de tênis...

Estudantes contam como diretores do IFAL desencorajam denúncias de casos de racismo

Mobilizados contra casos de racismo, assédio e LGBTfobia no...
spot_imgspot_img

Atriz Samara Felippo presta depoimento em delegacia sobre caso de racismo contra filha em escola de SP

A atriz Samara Felippo chegou por volta das 10h desta terça-feira (30) na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, no Centro de São Paulo. Assista o...

Número de pessoas mortas pela PM paulista cresceu 138% no 1º trimestre

Dados divulgados pela Secretaria Estadual de Segurança Pública de São Paulo mostram que o número de pessoas mortas por policiais militares em serviço no...

Livro continua a ser o melhor investimento de uma pessoa

Em janeiro de 2017, o mundo já era bastante confuso e acelerado. Mal sabíamos o que o futuro nos reservava. Parece até que estou falando...
-+=