Pela melhora verdadeira da educação estadual

Por: MARIA IZABEL AZEVEDO NORONHA

 

 

É aceitável que professores estaduais tenham condições de trabalho tão ruins para cumprir função das mais importantes na sociedade?

O ARTIGO “‘Melhora sutil'” (“Tendências/Debates”, 4/3), do secretário estadual da Educação, Paulo Renato Souza, tenta transformar os resultados do Saresp em indicador da melhoria da qualidade do ensino. Mas educadores e especialistas concordam que os resultados da avaliação foram “pífios” ou, quando muito, “insuficientes”.

 

Os investimentos em educação vêm caindo ano a ano no Estado de São Paulo. Em 2009, o governo estadual deixou de gastar R$ 360 milhões no setor educacional. Neste ano, não há previsão de reajuste salarial para o magistério.

 

Todo profissional precisa ser bem remunerado, ter carreira justa, condições de trabalho e jornada de trabalho adequada. Por que no caso dos professores seria diferente?

 

A greve que realizamos neste momento busca o atendimento dessas reivindicações. Nossos salários estão defasados e precisam ser reajustados em 34,3% para recuperar o poder de compra de março de 1998.

 

O secretário tenta comparar o incomparável ao dizer que, se um aumento de 5% no PIB nunca seria considerado “sutil”, o aumento do Idesp (indicador criado a partir do Saresp) deveria ser comemorado.

Como economista, o secretário deveria perceber que a comparação é descabida. Não há equivalência entre o crescimento do PIB, que mede as riquezas materiais produzidas pela nação, com os resultados do processo ensino-aprendizagem.

 

Para nós, os resultados de avaliações não são absolutos nem totalmente quantificáveis. O principal resultado da educação é a formação de cidadãos e cidadãs. O ser humano deve ser o centro do processo educativo.

 

As avaliações são importantes instrumentos para a localização dos problemas e das potencialidades de cada aluno, classe, equipe, escola e do sistema como um todo. Ajudam a rever métodos, readequar conteúdos e direcionar atenção e recursos aos elos mais frágeis.

 

Mas seus resultados estão condicionados por um conjunto de fatores que inter-relacionam e precisam ser considerados em qualquer avaliação. Pela forma como o governo lê os resultados das avaliações, a gestão educacional nada tem a ver com eles. As autoridades educacionais, assim, isentam-se de responsabilidade.

 

O secretário diz que “os professores são vítimas de um sistema de formação docente que privilegia o teórico e o ideológico em detrimento do conteúdo e da didática”. Por que, então, a prova aplicada aos professores temporários foi focada na aferição de conhecimentos teóricos e não avaliou a prática pedagógica? Não acreditamos em teoria sem prática nem em prática sem teoria.

 

É também por meio de uma prova de conhecimentos que o governo define quais professores terão direito a reajuste salarial, ainda assim limitando a “até” 20% da categoria.

 

O governo bate na tecla da má formação dos professores. Por que não promove, então, programas de formação continuada no local de trabalho durante a jornada do professor? Por que se opõe à destinação de um terço da jornada de trabalho para atividades de formação e atualização da categoria? Por que aplica apenas o mínimo (20%) definido para essa finalidade pelas diretrizes nacionais, enquanto a capital, por exemplo, destina 33% da jornada para tal fim? Além disso, os cursos promovidos pela secretaria são insuficientes e restritivos.

 

Não aceitamos a afirmação de que nossas posições têm motivações eleitorais. As ações da Apeoesp são determinadas pelas representações em todas as regiões do Estado. A greve é deliberada por pessoas que, nesse sentido, assumem uma posição política.

 

Sou presidenta do maior sindicato da América Latina, não sou candidata a nenhum cargo nas eleições de outubro, mas, como cidadã, não tenho o direito a preferência partidária? O governador, sim, é candidato.

 

Por que o governador e o secretário podem ser vinculados a uma organização partidária, o PSDB, e o restante da população não pode? Paulo Freire dizia que não existe neutralidade na educação. A própria neutralidade é, na verdade, uma posição política diante da realidade.

 

O que importa, mesmo, é saber se a educação estadual, hoje, corresponde às necessidades da população. É aceitável que os professores estaduais tenham salários tão baixos e condições de trabalho tão ruins para cumprir uma das funções mais importantes na nossa sociedade?

Lançamos aqui um desafio ao secretário: promova a reposição do poder de compra dos nossos salários e nos dê um tempo. O senhor e toda a população verão que a educação vai melhorar -e muito.

Fonte: Folha de S.Paulo

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