O calvário dos meninos que se confessaram ao papa

Eles vivem um inferno na terra.

O artigo abaixo foi publicado originalmente na versão em português do site alemão DW.

Eles vêm de famílias desestruturadas, são pobres e estão atrás das grades. Os cinco menores infratores que se confessaram com o papa Francisco nesta sexta-feira (26/07), na Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro, só conheceram Deus no centro de detenção.

A vida do lado de dentro dos muros altos e sob vigilância constante, porém, mais se assemelha a um inferno na Terra.

Muitos jovens detidos já ouviram falar no calvário de Cristo – que milhares de fiéis lembraram na noite desta sexta-feira em Copacabana. Mas a maioria continua presa ao círculo vicioso das drogas e da violência.

No Centro Socioeducativo Dom Bosco, no Rio, há 215 jovens infratores entre 12 e 17 anos de idade, apertados em 21 celas.

A maior parte foi detida por envolvimento no narcotráfico. Gritos e gemidos vêm de todos os lados da estreita passagem entre as celas. Braços se esticam para fora das grades.

“A situação aqui é terrível, estamos com superlotação”, admite o diretor do centro, Flávio Artur Alves da Cunha.

Ele explica que, na verdade, muitos dos internos deveriam passar apenas 50 dias e depois ser transferidos para outras instituições. Mas, como a verba para as obras de expansão é curta, o ritmo dos trabalhos é lento.

O número de jovens infratores no Rio de Janeiro cresce de maneira preocupante. Enquanto 700 menores de idade foram detidos pela polícia nos três primeiros meses de 2011, entre janeiro e março deste ano este número subiu para 1,7 mil, de acordo com o Instituto de Segurança Pública do estado.

Poucos, dentre os jovens aglomerados no centro de detenção, se sentiram envolvidos pela proposta de “revolução da fé” feita aos jovens pelo papa Francisco durante a Jornada Mundial da Juventude.

“Temos um concorrente muito forte. É impressionante o poder das armas”, afirma Roberto José dos Santos, da associação beneficente Amar. “A sensação de onipotência de um jovem com uma arma na mão é enorme”, diz.

Santos, de 64 anos, é um dos 50 pregadores leigos que regularmente celebram missas no Centro Dom Bosco, nas proximidades do Aeroporto Santos Dumont.

Assim que ele chega para as orações, os jovens fazem silêncio para ouvi-lo. “Agora vamos falar sobre Jesus, que está vivo e quer que vocês cresçam e amadureçam”, diz aos adolescentes.

Em suas pregações, Santos faz um pedido aos jovens: “Pensem numa pessoa querida, que vocês gostariam que estivesse ao seu lado, agora. Pensem que ela ressuscitou igual a Jesus”.

Silêncio.

Muitos simplesmente não têm em quem pensar, muitos vêm de famílias desestruturadas e perderam contato com seus parentes.

A ex-interna Michelle Félix, por exemplo, foi parar nas ruas fugindo da violência da mãe envolvida com drogas. Depois, passou um ano e meio numa instituição socioeducativa para garotas.

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Atualmente, a jovem de 21 anos produz, juntamente com outros meninos e meninas dos centros de detenção, vídeos para o canal de TV Novo Degase, veiculado internamente, financiado com recursos do governo do estado do Rio.

“Hoje, a minha família são os alunos, e o meu pai é o diretor da televisão”, afirma.

Há aproximadamente um mês, a “General Michelle”, como é chamada pelos alunos, entrevistou o arcebispo do Rio de Janeiro, dom Orani João Tempesta.

Indagado sobre o que achava de o papa ter lavado os pés de internos de durante a uma visita a um presídio em Roma, Tempesta respondeu: “Essa é uma tradição católica, que mostra que a Igreja também está a serviço dos jovens excluídos”, disse o arcebispo, de semblante tranquilo e aberto.

Ele ressaltou que, ao receber os menores infratores durante sua passagem pelo Rio, o papa gostaria de levar a eles a esperança e a confiança.

Para Roberto José dos Santos, da Amar, trata-se de um sinal importante. “É difícil colocar estes jovens de novo no bom caminho.”

Dos menores detidos, 99% vêm de favelas. Após serem soltos, muitos voltarão a ser presos. “Se eles vão para casa, não têm perspectivas para o futuro. Voltar para suas comunidades não basta”, diz Santos. “Precisamos fazer mais por eles.”

 

Fonte: DCM

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