Projeto usa celular para mobilizar jovens quilombolas na Bahia

Redação Correio Nagô – Março de 2008. Um navio norueguês atraca no Porto de Aratu e derrama cinco mil litros de óleo lubrificante na Baía de Todos os Santos, contaminando fauna e flora de extensa área de mangue próximo à praia da Bananeira, na Ilha de Maré. Pescadores e marisqueiras da comunidade quilombola da região são afetados, mas encontram dificuldades para denunciar a violação para o poder público e imprensa.

O caso relatado acima é apenas mais um exemplo entre as inúmeras exclusões de que são vítimas os povos tradicionais da Bahia. Para ajudar a mudar esse quadro o Instituto Mídia Étnica (IME), em parceria com o Center for Civic Media, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), vem desenvolvendo um projeto pioneiro no Brasil “Vojo Brasil: ampliando vozes quilombolas por meio do celular”.

O projeto atua no sentido de empoderar jovens quilombolas para que estes possam fazer o mapeamento das violações que sofrem e utilizar o celular para se comunicarem de maneira rápida e interativa com outros blogueiros e meios de comunicação.

A iniciativa, que é um projeto piloto, pretende se espalhar para outras comunidades tradicionais que possuem pouco, ou nenhum, acesso a internet, como comunidades em zonas rurais remotas, indígenas, ocupações habitacionais e demais grupos vulnerabilizados e excluídos da produção de informação.

A tecnologia VOJO possibilita a qualquer pessoa possa criar e atualizar um blog mesmo que este não possua computador ou internet em seu aparelho de celular. A ferramenta permite envio de reportagens de áudio por celulares de baixo custo e até mesmo de telefones públicos. No caso do uso do celular, ainda pode-se enviar fotos e vídeo.

A ideia do projeto é possibilitar jovens de comunidades o acesso à tecnologias e conectar as diversas comunidades em torno de uma rede para que possam se articular e buscar maior visibilidade, perante a opinião pública, em relação as suas demandas sociais, culturais e políticas. O projeto conta com o apoio do MIT, por meio do seu corpo técnico de pesquisadores do Media Lab, um dos maiores centros de excelência em tecnologia do mundo.

“Um dos principais obstáculos que o país precisa superar é o de envolver plenamente a sua população historicamente marginalizada no processo de desenvolvimento, democratizando o uso das tecnologias. A ferramenta pode possibilitar o acesso à tecnologia a comunidades remotas e socialmente marginalizadas em todo o país”, destaca Paulo Rogério Nunes, diretor executivo do Instituto Mídia Étnica.

Com quase oito anos de atuação, o Instituto Mídia Étnica é uma organização social que desenvolve projetos no campo da comunicação e diversidade e é responsável por diversos ações de comunicação comunitária e jornalismo cidadão, como o portal Correio Nagô (www.correionago.com.br).

Funcionamento – Um total de 20 jovens de comunidades remanescentes de quilombo da Ilha de Maré, Salvador, estão sendo treinados na metodologia. A primeira experiência prática foi a cobertura da III Conferência Estadual de Promoção da Igualdade Racial (III CONEPIR). Utilizando seus aparelhos celulares, os jovens fizeram entrevistas e fotos com os participantes e postaram nas mídias sociais. Os quilombolas das comunidades de Bananeiras, Martelo, Porto dos Cavalos, Maracanã e Praia Grande integram o projeto Vojo.

A tecnologia Vojo foi criada originalmente com o projeto VozMob para ser usada por imigrantes latinos nos EUA e, em parceria com o Instituto Mídia Étnica, foi testada pela primeira vez com trabalhadoras domésticas brasileiras residentes em Boston. O projeto integra as estratégias de uso das novas tecnologias para consolidação de uma comunicação comunitária e cidadã do portal Correio Nagô (www.correionago.com.br), que deve lançar até o próximo mês uma nova versão de sua plataforma digital.

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Segundo Luciane Neves, publicitária e uma das coordenadoras do projeto. “além da tecnologia VOJO, os jovens tiveram palestras sobre Gênero, DST/AIDS, Identidade Negra, Democratização da Comunicação e Técnicas de Jornalismo. Depois do treinamento, a ideia é que eles possam replicar a tecnologia para outras comunidades de Salvador e outras partes do Brasil.”

Ilha – Segundo dados da pesquisa “Urbanização (In)sustentável em Ilha de Maré: Estudo de Caso da Vila de Santana”, da Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia, a Ilha de Maré localiza-se a cerca de 5 km de São Tomé de Paripe, subúrbio de Salvador, possui uma população de 5.712 habitantes (dados do IBGE, 2000), distribuída em uma área de 1.378,57 ha ou 13,79 km2.

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A comunidade em questão encontra-se localizada em uma área de difícil acesso da Região Metropolitana de Salvador, em uma ilha cercada de empreendimentos portuários, por conta da presença de indústrias transacionais e da Zona Portuária de Aratu (para o qual as comunidades tradicionais não são uma prioridade) e, por isso, o local é palco de luta constantemente pelo reconhecimento do seu território e pela manutenção das características de sua comunidade, como a pesca artesanal.

O projeto Vojo Brasil pretende dar voz a juventude local para cobrar políticas públicas de inclusão e também dar visibilidade ao local que possui uma natureza exuberante e uma história secular.

Fonte: Correio Nagô

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