A festa de São João na ilha de São Luís é ópera de rua

Parafraseando o saudoso artista maranhense Joãosinho Trinta, que disse que “Carnaval é ópera de rua”, ouso afirmar que o São João na ilha de São Luís é ópera de rua cheia de encanto e magia. Há mais de 20 anos, eu não ia ao Maranhão nas festas juninas. A maior felicidade foi ouvir Clarinha dizer: “Quero ver boi, vovó!”. E vimos muitos, cada um mais belo que o outro. É uma mineirinha que virou boieira. Sem falar que a turma dela do maternal dançou o “requebradinho”. Em São Luís, há um arraial junino completo em cada escola.

Por: Fátima Oliveira

É contagiante a alegria dos batalhões de bumba meu boi e seus inebriantes sotaques – de orquestra, de matraca, de zabumba, de batida costa de mão… Para Américo Pellegrini Filho, folclorista da USP, “é um dos folguedos mais representativos da cultura brasileira, pois reúne traços de três grandes ramos da formação do nosso povo: europeu, indígena e afro-negro”.

Dona Lô pontua que “bumba meu boi é coisa complexa, não apenas pelo sincretismo e pelas relações de poder que desvela”, e que, no “Auto do Boi de Catirina e Pai Francisco”, há mais do que supõe a nossa vã filosofia, pois “boi tem ciência. E é complexa… É uma ópera popular reveladora do inconformismo e da insubordinação. É toda uma cultura de resistência, proibida, durante um século, de se apresentar em ‘redutos de brancos’, o centro da cidade, e só chegava até o areal do ‘Caminho Grande’, hoje bairro do João Paulo”.

Melissa Alecrim, em “Bumba Meu Boi é Pura Cintilância”, relembra que é uma ópera popular surgida no século XVI tipificada como um bailado popular dramático; um auto genuinamente brasileiro, sem similar em Portugal e África, em que se mesclam teatro, dança, música e circo; o “couro do boi” é ricamente bordado, de brilho incomum e beleza deslumbrantes, com brincantes de vestes cintilantes: brilhos, sedas, canutilhos, miçangas, paetês, purpurina, plumas, fitas e fitas…

E destaca que brincar boi não é apenas apresentá-lo no São João. Tradicionalmente, o boi passa por um ciclo de vida: ensaios, batismo, apresentações públicas e a morte. Teoricamente, em 30 de junho, dia de são Marçal, os festejos juninos são encerrados, há 85 anos, com a concentração de bois de matraca no João Paulo, porém, na semana seguinte há o lava-bois no balneário de São José de Ribamar, a 30 km da capital, surgido nos anos de 1950, festança que encerra o ciclo junino maranhense e abre os festejos julinos!

Há outras danças no São João maranhense, como tambor de crioula, danças portuguesa, francesa, cigana, do coco, lelê, cacuriá e as quadrilhas puxadas em francês impecável, numa diversidade de ritmos e de vestuários que encanta. As bebidas e comidas da época e as típicas, como arroz de cuxá e torta de camarão, exibem a orgia alimentar dos arraiais da ilha…

Para Ney Vilela, mestre em comunicação midiática, em “Festas Juninas: Rituais pagãos”, as festas do quarteto de santos de junho (santo Antônio, são João, são Pedro e são Marçal) são pagãs, e não cristãs, pois são anteriores ao cristianismo: no confronto do solstício do meio do ano, o catolicismo perdeu para o paganismo.

“Os gregos festejavam os solstícios com bebedeiras homéricas e orgias dionisíacas. Rituais como beber, comer, pular fogueiras e dançar quadrilhas são herdados da sabedoria pagã e da filosofia grega”. Embora sinais de fé cristã, como a elevação do mastro do santo e até procissões, se façam presentes em algumas regiões, “os rituais dionisíacos, típicos da cultura pagã, predominam no imaginário social”.

 

 

 

Fonte:  O Tempo

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