A Legitimação do Intelectual Negro no meio Acadêmico Brasileiro : Negação de Inferioridade Confronto ou Assimilação Intelectual – Por: Ari Lima


 

Ari Lima**

Para Lande e Nelson Maca.
Dois intelectuais subalternos.
{xtypo_quote}One day I learnt
a secret art,
Invisible-Ness, it was called.
I think it worked
as even now you look
but never see me…
Only my eyes will remain to watch and to haunt,
and to turn your dreams to chaos
Meiling Jin{/xtypo_quote}

 

 

Qual o homem negro mais conhecido e admirado no Brasil? Parece óbvia a resposta. Este homem é Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, “o maior jogador de futebol do planeta”, também eleito o atleta do século.
Qual mulher negra é tão conhecida e unanimemente admirada no Brasil quanto Pelé? Esta resposta não é nada óbvia, aliás desconfio que não seja possível alcançá-la. Desconheço qualquer mulher negra brasileira, viva ou morta, cujo nome esteja associado a ímpar intervenção cultural, talento memorável nas artes, universalmente celebrada no mundo acadêmico ou em qualquer outra esfera social. Conhecida e unanimemente alentada e admirada, acredito que temos não uma mulher negra, mas uma sua representação naturalizada ainda que submetida ao arbítrio da história, uma sua versão biossocial “melhorada”, pivô de uma complexa problemática racial, germe de uma inusitada questão de gênero genuinamente nacional. É claro que estou aludindo àquela que categorizamos como mulata, símbolo do país do samba assim como Pelé o é do país do futebol.
Vitoriosos subalternos, sem nada a declarar uma vez que seus corpos são uma verdade visceral de ensimesmada eloqüência. Se masculino e sujeito, é uma potência individualizada, encerrada em um só homem negro. Se feminino, é uma representação coletiva, politicamente estéril, escompromissada com o gênero tanto quanto com a raça.1 Mas existe um outro Brasil possível para os negros além do samba e do futebol?

Acredito que um outro país possível para o negro é aquele esboçado no meio acadêmico brasileiro. Entretanto, quando ciente da sua subalternidade, o intelectual negro saberá dos limites da sua fala uma vez que antes de ser agente reflexivo é “objeto científico”. Saberá que se sua consciência subalterna lhe autoriza a falar sobre a diferença negra no Brasil, por outro lado, espreita seu grau de incorporação de uma “objetividade” científica universal, de ajuste a tropos e apelos disciplinares.
Ela é seu senhor, é a autoridade que o protege, como intelectual, do descontrole do sentimento de diferença e da insurgência que isto pode representar visto que se é possível registrar a diferença, há que se silenciar sobre as mais profundas compreensões, os mais profundos desejos de reversão da desigualdade racial e injustiça social.2

 

 Notas :

* Este texto foi originalmente apresentado no GT Desigualdades Étnicas e Sociais ocorrido no XI
Congresso Nacional de Sociólogos, em Salvador, maio de 1999, coordenado pelos professores
Livio Sansone (UERJ/CEAA) e Jeferson Bacelar (UFBA) e no Fórum Simpática Antropologia
ocorrido na 22ª Reunião Brasileira de Antropologia, em Brasília, julho de 2000, coordenado
pelos professores Livio Sansone (UERJ/CEAA), Maria do Rosário (UFBA) e Michel Agier
(ORSTOM/CNRS). Agradeço aos coordenadores citados pela acolhida e estímulo e aos participantes
destes fóruns. Agradeço ao parecerista anônimo desta revista pelas críticas e sugestões.
Também agradeço aos colegas do grupo de Estudos de Relações Raciais no Brasil e no Mundo da
Unicamp e, por fim, em especial, a Nelson Maca, Lande, Osmundo de Araújo Pinho e Sales A.
dos Santos pela atenção, comentários e sugestões.

** Doutorando em Antropologia Social na Universidade de Brasília – UnB.
282 Afro-Ásia, 25-26 (2001), 281-312

1 Trabalharei aqui com categorias como “raça”, “negro” e “cultura negra”. Esclareço desde já que
evitarei usá-las em um sentido essencialista. Deste modo, absorvo a discussão de Mireya Suárez,
“Desconstrução das categorias ‘Mulher’ e ‘Negro’”, Série Antropologia, 133 (Brasília, Depto.
de Antropologia/UnB, 1991) pp. 1-25, onde a autora afirma que “enquanto os homens brancos
são classificados como seres culturais, as mulheres de todas as cores e os homens negros têm sido
situados, em alguma medida, no campo da natureza que é o campo do ‘dado ao homem’, do
subordinável, do essencialmente imutável e, portanto, impermeável ao arbítrio da história. (…) A
dominação exercida sobre mulheres e negros é causada por interesses práticos e configura relações
sociais substantivas. Entretanto, essas relações de dominação somente podem acontecer
quando existe um imaginário inteligível e persuasivo o suficiente para as pessoas poderem encontrar
nele sentidos para as relações sociais das quais participam, seja enquanto dominadoras,
dominadas ou, como é mais freqüente, dos dois modos”, pp. 7;13.

 

2Gayatri Spivak, “Can the subaltern speak?”, in Patrick William & Laura Chrisman (eds). Colonial
discourse and post-colonial theory. A reader (New York, Columbia University Press, 1994),
pp. 66-111

Leia artigo completo em anexo PDF

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Fonte: Revista Afroasia, n.25/26 p. 281


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