Negro, filho de mãe solo e morador de Junqueiro, no Estado de Alagoas, ele conta que tinha sensação de ser invisível.
“Eu tinha algumas características sociais de alguém que não ia vencer na vida. Vinha de uma conjuntura difícil”, diz à BBC News Brasil.
Mesmo tendo a vida transformada pelos livros, o alagoano ressalta que nunca gostou muito de ler e tinha dificuldade em se apaixonar por conteúdos pedagógicos.
Durante o ensino fundamental, seu professor o “castigou” para ser monitor da biblioteca e foi aí que começou a ler sua primeira obra. Desde então, não parou mais.
Depois da graduação em Gestão de Recursos Humanos, cursou Psicopedagogia como especialização e passou em um concurso dos Correios para trabalhar como carteiro. Porém, a profissão não era a que mais o agradava, e sua vontade de ajudar crianças por meio da leitura falava ainda mais alto.
Enquanto trabalhava, tentava fazer horas extras para conseguir folgas e poder viajar pelo Brasil. Seu intuito era “mochilar” pelo Nordeste, mas de um jeito diferente.
“Eu combinei com o meu chefe, e ele entendeu um pouco meu propósito. Pensei que poderia começar a viajar pelo Brasil distribuindo livros para crianças e adolescentes. As do interior do país têm uma limitação geográfica e temos uma deficiência muito grande no acesso aos livros”, destaca.
Em 2013, o trabalho voluntário começou em Alagoas, onde mora, e seguiu para os Estados vizinhos de Sergipe, Bahia e Pernambuco. Por causa das viagens e da distribuição, ele ganhou o nome de “mochileiro pela educação“.
Começo difícil
Como tinha estabilidade financeira e folgas acumuladas, Thiago conseguia viajar em determinados dias, e começou a colocar seu plano em prática.
Para ver quem poderia ajudar, entrava em contato com escolas, ONGs e procurava por cidades que tinham um baixo índice de desenvolvimento humano (IDH). “Comecei a bater na porta das escolas, mandava email, entrava por meio das redes sociais e fazia contato”, diz.
O intuito era promover a transformação social por meio da literatura e proporcionar o acesso aos livros para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. No entanto, conseguir livros e material para as doações era trabalhoso.
Ele ia atrás de feiras literárias e tentava conseguir o máximo possível de livros. Muitas vezes, quando recebia os livros doados, eram materiais velhos de pouca utilidade. “A gente recebia muito livro ruim, livro mofado, e era lixo. A pessoa queria se livrar dos livros”, diz.
Quando não recebia de forma gratuita, comprava do próprio bolso algumas publicações. Hoje, para evitar qualquer tipo de material em péssimo estado, ele faz um questionário para identificar a qualidade do material que será recebido. “Quem doa começa a perceber que tem uma gestão por trás.”
Ação trabalha três pilares
Mesmo atuando na área social, ele não quis e nem deseja transformar o projeto em uma ONG. O mochileiro conta que prefere ter flexibilidade para criar e conseguir ir para os lugares de forma prática. “Acho que ficaria com aquele dinheiro engessado. Eu gosto de criar e ser livre. É o perfil do mochileiro”, afirma.
Para ajudar na triagem dos livros e desenvolvimento da empresa, ele conta que pessoas na área administrativa e uma pedagoga para curadoria dos livros recebidos.
Além da distribuição de livros, durante as visitas nas escolas, ele oferece programas de mentorias aos estudantes. ”Eles criam projetos para apresentarem para bancas avaliadoras”, conta Thiago.
No quadro “Boas ideias não têm idade”, crianças e adolescentes podem desenvolver ideias e projetos para inovação em diferentes âmbitos de impacto social.
O mochileiro também realiza oficinas de leitura para o público carente das cidades. Em alguns locais, já foi entregue uma estante literária que simula uma biblioteca móvel com mais de 200 livros, um tablet para gerenciar o aluguel das obras e materiais para colorir.
Hoje, para conseguir recursos e desenvolver o projeto em grande escala, ele vai atrás de empresas e vende palestras. A ideia é fazer com que cada companhia “adote” uma escola pública e repasse uma verba financeira aos locais visitados.
Desde 2013, Thiago já passou por 79 cidades, 10 Estados e distribuiu 10.650 livros. Sua viagem mais recente foi para São José do Egito e Tabira, ambas em Pernambuco.
Histórias que marcaram
Como o foco é viajar para locais menos favorecidos e do nordeste, Thiago diz se surpreender toda vez que ajuda uma criança ou conhece uma história de impacto.
Uma vez, na cidade de Irecê, na Bahia, conheceu uma menina que montava uma “casinha” de livros e distribuía cada uma delas em praças públicas. A atitude chamou atenção do empreendedor social, já que o projeto era realizado por uma criança de apenas dez anos. “Ela tem um perfil de liderança e teve essa visão de não guardar só para ela”, destaca.
A jovem, hoje com 13 anos, montou 20 casas literárias em três Estados do Brasil (Bahia, Pará e Ceará) e consegue gerenciar “guardiões” para limpar o local e supervisionar os livros. A ideia é sempre pegar um livro e deixar outro.
Em uma outra ocasião, no sertão do Pajeú (Pernambuco), ouviu de uma menina que nunca pensou que uma pessoa como ele fosse visitar a escola dela.
Além de realizar projetos de impacto social, Thiago leva a sério o título de mochileiro. Em seu canal no Youtube, ele mostra sempre histórias curiosas e atrações turísticas das cidades que visita.
“Gosto de mostrar a curiosidade de um prédio, da cidade, de uma casa”, diz. E sempre que chega em uma cidade vai atrás de histórias e pergunta: “Aqui é terra de quê?”.
Ele ainda apresenta personagens e pessoas que se destacam em determinada região. “Eu vivo a experiência e a educação é isso. Inserir um instrumento novo, mas não negligenciando a cultura. Você não rompe aquele elo das pessoas com a região”, afirma.
O próximo passo é distribuir livros em escolas e ONGs das regiões Norte e Centro-Oeste.
Ele ainda deseja capacitar e formar novos mochileiros para realizar um trabalho igual ao dele e levar o acesso a livros para diversas cidades do Brasil. Em paralelo, pretende criar uma espécie de portal, para que jovens encontrem o primeiro emprego e tenham acesso a programas de aceleração de carreira.
Por último, pretende ter uma sede fixa e uma escola com metodologia própria. “Quero transformar o país no que mais lê no mundo.”