Uma disputa judicial envolve 462 famílias de trabalhadores rurais ocupantes da antiga Usina Ariadnópolis, em Minas Gerais, que sofrem um processo de reintegração de posse, proposta em 2011 pela Massa Falida da Companhia Agropecuária Irmãos Azevedo.
Solidária a essa comunidade, a Comissão Arns ressalta que “o direito a moradia digna não se circunscreve ao direito a propriedade de um imóvel, mas está relacionado a outros direitos, como o direito ao saneamento básico, ao trabalho, à cidade e ao campo, à educação, à saúde e à convivência familiar e comunitária, apontando para a universalidade e interdependência de tais direitos”.
Desde a primeira ocupação, há cerca de 20 anos, o local foi revitalizado pelos sem-terra, com parcerias de organizações da região. Em 2017 e 2018, os agricultores produziram, na área de mais de 4 mil hectares, mais de 8.500 mil sacas de café, 55 mil sacas de milho e 500 toneladas de feijão. Além de hortaliças, verduras, legumes. E da criação de galinhas e gado.
Em carta de apoio aos ocupantes da usina, a Comissão Arns conclama o Poder Judiciário a “cumprir seu papel protagonista na efetividade das normas constitucionais diante da histórica desigualdade social e da crise que a sociedade brasileira atravessa”. Acompanhando de perto o julgamento, previsto para esta semana, a Comissão indica a Resolução nº 10, de 17 de outubro de 2018, do Conselho Nacional de Direitos Humanos, que dispõe sobre soluções garantidoras de direitos humanos e medidas preventivas em situações de conflitos fundiários coletivos rurais e urbanos.
Leia a íntegra da carta:
Carta de apoio às famílias ocupantes da Usina Ariadnópolis
A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns, fundada em 20 de fevereiro de 2019, cuja missão é realizar a defesa e a promoção dos direitos humanos da sociedade em geral, vem, por intermédio desta carta, reconhecer o trabalho e manifestar apoio às famílias ocupantes da Usina Ariadnópolis/MG, que buscam garantir o direito fundamental a moradia, ao trabalho e a propriedade, frente ao processo de Reintegração de Posse nº 0024.11.188.917-6, proposta em 17.06.2011, pela Massa Falida da Companhia Agropecuária Irmãos Azevedo.
Considerando o atual estágio do processo judicial envolvendo 462 famílias de trabalhadores e trabalhadoras em área que foi objeto de decreto expropriatório destinado a fins de reforma agrária, recentemente revogado, a Comissão Arns conclama os julgadores a efetivarem sua missão institucional e social de promover o bem de todos e construir uma sociedade livre, justa e solidária.
Sobretudo sobrepesando e garantindo a efetividade dos direitos e garantias fundamentais do ser humano, especialmente o direito a moradia digna previsto nas normas constitucionais e internacionais, do qual o Brasil é signatário, determinando um dever do Estado.
Ressaltamos que o direito a moradia digna não se circunscreve ao direito a propriedade de um imóvel, mas está relacionado a outros direitos, como o direito ao saneamento básico, ao trabalho, à cidade e ao campo, à educação, à saúde e à convivência familiar e comunitária, apontando para a universalidade e interdependência de tais direitos.
Desta forma, quando há aparente conflito entre princípios e direitos fundamentais, como o direito a propriedade e o direito a moradia, é preciso decidir com cautela e responsabilidade, utilizando todos os meios legais de mediação e conciliação, para garantir o desenvolvimento da vida para o maior número possível de pessoas. O direito a propriedade encontra limitação em sua função social, cabendo ao Estado Juiz decidir pela melhor utilização socioeconômica da propriedade.
Por fim, a Comissão Arns, além de reiterar a responsabilidade dos julgadores no caso em tela, conclama o Poder Judiciário a cumprir seu papel protagonista na efetividade das normas constitucionais diante da histórica desigualdade social e da crise que a sociedade brasileira atravessa. E, ainda, indicamos a Resolução nº 10, de 17 de outubro de 2018, do Conselho Nacional de Direitos Humanos, que dispõe sobre soluções garantidoras de direitos humanos e medidas preventivas em situações de conflitos fundiários coletivos rurais e urbanos, que segue em anexo.