Cineasta Joel Zito Araújo avalia que mídia tradicional é injusta no debate racial

Passados 125 anos da lei que libertou africanos e seus descendentes da escravidão no Brasil, o cineasta negro Joel Zito Araújo avalia que, na mídia, há “desequilíbrio” na apresentação de temas relacionados à questão racial, como ações afirmativas, entre elas as cotas, e políticas destinadas a comunidades quilombolas.

O cineasta propõe uma reflexão sobre o tema ao trazê-lo ao debate em seu mais novo filme, Raça, uma parceria com a documentarista americana premiada com o Oscar, Megan Mylan. O lançamento, marcado para a próxima sexta-feira (17), ocorre 25 anos depois que a temática foi levada às telas pelo cineasta e ator negro Zózimo Bulbul com o documentário Abolição, sobre a situação da população negra brasileira.

Araújo é categórico ao afirmar que seu documentário tem o objetivo de apresentar ao público uma “versão dos fatos” e argumentos ignorados pela imprensa nos últimos anos.

“As mídias tradicionais foram injustas no debate racial. Sempre privilegiaram aqueles que eram a favor de sua posição editorial, ou seja, contra cotas, contra terra para quilombos, e ignora coisas graves que aconteceram e acontecem, como a exterminação de jovens negros na periferia”, diz ele, que também é especialista com pós-doutorado em comunicação pela Universidade de São Paulo (USP) e foi professor visitante na Universidade do Texas, nos Estados Unidos.

A percepção de Araújo tem fundamento teórico. O Grupo de Estudos Multidisciplinares de Ação Afirmativa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), coordenado pelo professor João Feres Júnior, constatou que, entre 2001 e 2009, 96% dos editoriais de jornais e revistas no Rio e em São Paulo foram contrários a ações afirmativas raciais. Reportagens e artigos de opinião se posicionaram de maneira parcial em relação às cotas, de acordo com a pesquisa.

Cineasta Joel Zito Araújo avalia que mídia tradicional é injusta no debate racial
Cineasta Joel Zito Araújo avalia que mídia tradicional é injusta no debate racial

Diante desse cenário, o cineasta acredita que o público de classe média, que vai ao cinema, não conheceu o “outro lado”, em favor dos negros. Por isso, reuniu em seu filme os temas que polarizaram a mídia: a discussão sobre o Estatuto da Igualdade Racial, no Congresso Nacional,  o julgamento da constitucionalidade das cotas raciais, no Supremo Tribunal Federal (STF), e a regularização de terras quilombolas. “O filme é uma espécie de justiça histórica em função do desequilíbrio do debate”, declara.

Ele avalia que o próprio cinema peca na forma como retrata o racismo, e a mídia brasileira precisa rever sua abordagem. “O cinema brasileiro tem muitos filmes sobre cultura negra, sobre o carnaval, sobre o candomblé, sobre isso e sobre aquilo, mas evitar falar do racismo é [ser] cúmplice da ideologia do branqueamento”. Para ele, de modo geral, “ a mídia tem uma profunda dificuldade de encarar que somos um país diverso, cuja metade da população é negra”.

Para produzir Raça, o cineasta acompanhou, de 2005 a 2009, o senador Paulo Paim (PT-RS), a ativista quilombola Miúda e o empresário e cantor Netinho de Paula – vereador paulista que criou a primeira emissora de TV feita por negros.

 

 

Fonte: Agência Brasil

+ sobre o tema

COP28 – Movimento Negro e perspectiva para o futuro climático

Nos dias 6 e 7 de novembro de 2023,...

Adeus, capitão Krohokrenhum

Morto aos 90 anos, Krohokrenhum, líder do povo gavião...

Leilão de escravos na Líbia causa indignação em toda a África

Jovens africanos na rota migratória para a Europa, vendidos em...

As mães negras precisam ser cuidadas

Nós, mães negras, ouvimos o tempo todo que precisamos...

para lembrar

Brasil tem o 3º pior salário mínimo do mundo, aponta estudo

Pesquisa analisou rendimento mínimo garantido por lei em 37...

Blog fecha acordo com advogados para denunciar fascistas

Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, mobiliza ação para...

Empresas ainda falham em garantir diversidade em cargos de liderança, diz levantamento

Parte das maiores empresas e entidades financeiras do país...

Holandeses se irritam com fala de Damares sobre pais masturbarem crianças

A minista da Mulher, Família e Direitos Humanos Damares...
spot_imgspot_img

Mais de 335 mil pessoas vivem em situação de rua no Brasil

O número de pessoas vivendo em situação de rua em todo o Brasil registradas no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) do governo federal,...

Geledés participou do Fórum dos Países da América Latina e Caribe

A urgência da justiça racial como elemento central da Agenda 2030 e do Pacto para o Futuro, em um ano especialmente estratégico para a...

Na ONU, Anielle Franco diz que reparação pela escravidão é ‘inegociável’

A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, defendeu na ONU, nesta segunda-feira, a ideia de uma reparação diante dos crimes contra a humanidade cometidos...
-+=