Desigualdade de gênero e raça vai muito além de questão identitária, diz Marcelo Medeiros

Pesquisador afirma que discriminação de mulheres e negros no mercado de trabalho é pilar da concentração de renda do país

Marcelo Medeiros, professor visitante na Universidade Columbia, em Nova York, defende que toda política deve ser uma política de combate à desigualdade.

Em “Os Ricos e os Pobres” (Companhia das Letras), o pesquisador expõe alguns contornos da gigantesca concentração de renda do Brasil: os 5% mais ricos da população se apropriam de metade do crescimento econômico do país, enquanto as pessoas entre os 50% mais pobres vivem com menos de R$ 30 por dia.

Medeiros calcula que uma mãe que vivia abaixo da linha da pobreza usada pelo Bolsa Família precisaria, por exemplo, passar cinco dias sem comer se precisasse comprar duas doses de antibiótico para um filho.

No livro, o economista e sociólogo também aponta que os 80% mais pobres da população brasileira compõem um universo relativamente igualitário, enquanto o grupo dos mais ricos é muito heterogêneo, com grandes variações de renda.

Neste episódio, Medeiros diz que não existe panaceia para reduzir os níveis de desigualdade no Brasil. Em sua avaliação, esse processo, de longo prazo, requer uma mobilização política de envergadura e vai esbarrar em resistências de grupos organizados. Para o pesquisador, reformas de envergadura na educação pública e na tributação são medidas necessárias, mas não serão suficientes.

Medeiros também discute a sobreposição de desigualdades de gênero, raça e renda no Brasil e afirma que tratar a discriminação de negros e mulheres no mercado de trabalho a partir da noção de política identitária é uma bobagem.

As pessoas têm que entender que desigualdades raciais são dos pilares da desigualdade de classe. Não existe uma oposição entre essas duas coisas. Na verdade, reduzir a desigualdade de renda como um todo exige tocar nesses assuntos. Assim como as pessoas têm que entender, por exemplo, que a discussão sobre aborto não é uma discussão sobre pauta de costumes. Aborto é controle da vida reprodutiva das mulheres e, portanto, controle do seu acesso ao mercado, se elas vão querer sair do mercado de trabalho por causa de filhos. É muito menos pauta de costumes, é muito menos discussão de identidade e é muito mais discussão dos pilares fundamentais. Quem diz que isso é uma cortina de fumaça, na verdade, está enevoado, não está vendo nada. Está olhando para a cortina de fumaça e está perdido

Marcelo Medeiros
Professor visitante na Universidade Columbia

+ sobre o tema

Quilombolas pedem orçamento e celeridade em regularização de terras

O lançamento do Plano de Ação da Agenda Nacional...

É a segurança, estúpido!

Os altos índices de criminalidade constituem o principal problema...

Presidente da COP30 lamenta exclusão de quilombolas de carta da conferência

O embaixador André Corrêa do Lago lamentou nesta segunda-feira (31)...

Prefeitura do Rio revoga resolução que reconhecia práticas de matriz africana no SUS; ‘retrocesso’, dizem entidades

O prefeito Eduardo Paes (PSD) revogou, na última terça-feira (25), uma...

para lembrar

Holandeses se irritam com fala de Damares sobre pais masturbarem crianças

A minista da Mulher, Família e Direitos Humanos Damares...

Será a volta do monstro? por Cidinha da Silva*

Parece que o vento virou, à direita, e os...

Povo: em busca de um conceito

Há poucas palavras mais usadas por distintas retóricas do...

Ministra de Promoção da Igualdade Racial visita Morro da Providência

Por: Renata Sequeira Luíza Bairros ficou encantada com o...

Decisão de julgar golpistas é histórica

Num país que leva impunidade como selo, anistia como marca, jeitinho no DNA, não é trivial que uma Turma de cinco ministros do Supremo...

A ADPF das Favelas combate o crime

O STF retomou o julgamento da ADPF das Favelas, em que se discute a constitucionalidade da política de segurança pública do RJ. Desde 2019, a...

STF torna Bolsonaro réu por tentativa de golpe e abre caminho para julgar ex-presidente até o fim do ano

A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quarta-feira (26), por unanimidade, receber a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) e tornar réus o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)...
-+=