Noite da chegada ao Rio vou ao Supermercado, defronte ao hotel fazer umas comprinhas básicas. Os caixas do supermercado estão em ebulição festiva. As filas quilométricas.

Eu a vi de longe. Era uma menina preta, com os cabelos espichados pelos ferros quentes modernos, dessas que a gente já foi um dia.
Trazia nas mãos um pacote de fraldas e me perguntou se podia passar na minha frente, disse-lhe que sim.
Ao chegar próximo reparei no olhar, cruelmente observador, da moça do caixa para a menina. Olhava-a da cabeça aos pés, numa análise social, dessas que a gente preta está cansada de sentir.
O olhar da moça acompanhava a menina, como a expulsá-la do local. Olhava para o produto que ela tinha nas mãos e para os trocados que iriam pagar a mercadoria.
Havia uma aspereza tão exposta no olhar da moça que resolvi questionar seus olhares e fitei-a ostensivamente e provocativamente para saber qual era o propósito.
Sim, estava disposta a dar-lhe um troco, com palavras rudes, e esperava uma demonstração mais física..
Ah! Mas é claro que ela não faria, porque o racismo é esperto o bastante para não deixar rastros e ser judicialmente, sentenciado.
É o tal do racismo velado, que de velado não tem nada.
A menina, talvez, nada tenha percebido, mas, eu vi e aquilo me incomodou muito.
Na hora de passar o produto da menina, a moça tratou-a como se nada fosse e a menina com uma caixinha de confeitos na mão pediu:- Veja se meu dinheiro dá para comprar essa caixinha, também.
A reação da moça foi de uma insipidez terrível e não ouvi respostas. Ao saber que o dinheiro era insuficiente para adquirir a segunda compra, a menina começou num choro lamentoso e perguntei a caixa quanto era a tal caixinha:- Dois reais-respondeu ela.
Disse-lhe que entregasse a menina, que foi embora toda contente.
Depois de pagar minhas contas, saí de lá estranhamente triste.
Sim, ainda estamos sós.