Por Cidinha da Silva
Um amigo jovem, revolucionário,
indignado com as injustiças do mundo e proativo no cotidiano da transformação
mandou-me um pequeno texto que não entendi. Ele criticava o fato de utilizarem
uma atitude do jogador Neymar para discutir o racismo à brasileira.
De fato, não captei e parti para
a conversa que poderia trazer o entendimento. Sugeri que ele detalhasse as
idéias para ser mais compreendido, não só por mim, mas por seus leitores. Ele
foi taxativo, embora gentil, como sempre. Explicou-me que não quer detalhar
nada, pois não está à procura de clientes para as próprias idéias. Não quer
persuadir ninguém, apenas segue o próprio coração e demonstra solidariedade a
jovens pretos que ainda não morreram de frustração e são os melhores naquilo
que se dispõem a fazer.
Muito que bem. Redargüi que quando a gente argumenta é porque
pretende externar um ponto de vista (a opinião dele sobre o tratamento dado ao
caso de racismo envolvendo Neymar) e uma visão de ponto determinado (a
solidariedade aos jovens pretos que não morreram de frustração, ainda… e são
os melhores naquilo que se propõem a fazer).
O texto
como estava não deu conta da riqueza de propósitos defendida pelo autor em nossa
conversa, principalmente da parte mais importante, a solidariedade aos jovens
pretos que vencem, conseguem respeito pelo que fazem, a despeito do racismo que
tentará destruí-los (incluindo o racismo internalizado) porque sobrepujaram a norma do fracasso.
Não concebo
a expressão “cliente” quando utilizada para caracterizar pensamentos que
movimentam o mundo em direção a mudanças, ao respeito humano, à saúde plena. Quem
tem cliente para as idéias são pessoas como Silas Malafaia, Edir Macedo e
demais fundamentalistas de rapina das igrejas eletrônicas. É quem vende a
propaganda enganosa de sucesso e felicidade do Big Brother. É quem convence
pobres desamparados a escreverem milhares de cartas sofridas para merecer uma
casa mobiliada ou uma passagem de ônibus para deixar o sul maravilha e
regressar ao nordeste.
Da
mesma forma que o racismo internalizado embaça a visão de muitas pessoas negras
no tema racial, a generalização pseudo-revolicionária da noção de cliente
também nos deixa obtusos. Não é possível confundir a lavagem cerebral que os
profetas da desgraça imprimem ao aliciar corações e mentes para as fileiras de
suas idéias nefastas, com o despertar para idéias transformadoras. Que o gato e
a lebre não sejam trocados, como se fossem a mesma coisa. Há gente, por
exemplo, que critica certos concursos, despreza-os, melhor dizendo, mas
participa escondido. É bom ter atenção para não dormir no reggae dos outros e
repetir certos clichês, abrindo mão da reflexão.
A fé
cega vendida pelos pastores de cérebros de ovelhas tem sido faca amolada,
tortura, tiro certeiro que mata muita gente transgressora, principalmente
transexuais, gays, lésbicas e mulheres, indiscriminadamente. Os agentes desta
barbárie são clientes das idéias desses monstros.
Pessoas
que se inspiram em idéias transformadoras, reveladoras, e por isso as admiram e seguem são matéria de outra magnitude. Alhos e bugalhos são coisas distintas.