Ganhadora de prêmio do Faustão é vitima de racismo em loja de Curitiba

Michele Mara conta que não pôde provar acessório por conta do cabelo.
Em 2011, cantora de soul foi eleita a ‘Maior Imitadora da América Latina’.

Por Alana Fonseca, do G1 

A cantora de soul music Michele Mara, de 35 anos, afirma ter sido alvo de racismo em uma loja de acessórios de Curitiba. De acordo com a artista, uma lojista não a deixou provar um dos adornos por conta do seu cabelo. “Ela disse que meu cabelo danificaria o produto”, diz.

Michele conta que o constrangimento ocorreu no dia 30 de junho, na Rua XV de Novembro. No mesmo dia, ela registrou Boletim de Ocorrência (B.O). Entretanto, foi só no domingo (10) à noite que a cantora tornou público o caso.

A artista postou uma foto do B.O no Facebook, relatando o que aconteceu. Sua página tem mais de 10,4 mil curtidas. Em 2011, ela foi eleita a “Maior Imitadora da América Latina”, concurso promovido pelo programa “Domingão do Faustão”. Ela venceu a competição como cover da cantora norte-americana de soul Aretha Franklin.

O que aconteceu
A artista conta que no dia 30, à tarde, passeava com uma amiga quando as duas decidiram entrar em uma loja de acessórios no Centro. “A minha amiga experimentou uma espécie de turbante, em que você coloca todo o cabelo por dentro dele, e disse que eu precisava provar, que era a minha cara”, lembra.

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Michele registrou Boletim de Ocorrência no mesmo
dia (Foto: Michele Mara/Arquivo pessoal)

Então, conforme a cantora, ao colocar o acessório, a dona da loja saiu do caixa e veio até elas.

“Acho que ela era chinesa. Veio em nossa direçaõ gritando em português e inglês, dizendo que eu não podia experimentar porque ia estragar o produto, mas que a minha amiga, que é branca, podia”, relata.

A artista conta que ela e a amiga ficaram perplexas. “Ainda perguntei duas vezes se eu não podia experimentar por causa do meu cabelo e ela respondeu ‘sim’. A minha amiga fez a mesma pergunta e recebeu a mesma resposta. A lojista disse ainda ‘olha o seu cabelo!'”, relata.

Michele diz que ficou ainda mais revoltada por sofrer preconceito de um estrangeiro no seu próprio país. Ela conta que, imediatamente, saiu da loja e foi direto para a delegacia fazer o B.O.

“Eu não vou me calar, é inadmissível. A gente vive passando por isso. A gente precisa se aceitar como é e não fazer o que a socidade quer, que é alisar. O nosso cabelo é a nossa resistência. Ele nasce assim porque sou negra e eu me aceito. Uma pessoa dizer que eu não posso usá-lo assim é racismo, é me privar de algo por conta da raça”, explica.

O G1 tenta contato com a loja de acessórios envolvida no caso.

Alvo frequente
Não é a primeira vez que Michele passa por uma situação assim. Em 2013, ela também foi alvo de comentários racistas feitos por funcionários do Supermercado Condor, em Curitiba.

À época, a artista contou, em entrevista ao G1, que foi ao local para fazer compras e, ao entrar no estacionamento do mercado, um grupo de funcionários que estava no intervalo fez piadas em relação à aparência e ao cabelo dela.

“Fui indenizada em R$ 20 mil, nem precisei processar. No ano passado, participei da campanha do supermercado como cantora e eles também passaram a incluir negros em suas propagandas publicitárias. Antes, eram só famílias brancas felizes. Acredito que foi uma conquista”, explica.

À época, o supermercado também lamentou o ocorrido.

“O Condor lamenta profundamente o ocorrido em relação à cantora Michele Mara e destaca que assim que teve conhecimento do caso retornou de imediato à cliente e tomou todas as providências cabíveis. Na semana que vem a diretoria do Condor receberá a Sra. Michele na sede da empresa. O caso trata-se de um fato isolado e o Condor não compactua com qualquer atitude que possa causar mal-estar às pessoas. A rede reafirma seu compromisso com o respeito às pessoas e com a melhoria contínua do atendimento aos seus clientes”.

Para Michele, registrar B.O é essencial. “Não é só comigo. Só nos últimos dias, três amigas também passaram por situações semelhantes. É preciso ir adiante, ir até o Ministério Público (MP), não se calar. Racismo é crime!”, finaliza.

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