Um jovem fotógrafo de São Paulo denunciou, em seu perfil no Facebook, um incidente de racismo envolvendo um motorista de Uber, na manhã deste domingo. Vinícius Ferreira afirma ter solicitado o serviço para ir a uma travessa próxima à Rua Consolação. Após a chegada do motorista acionado, reparou no comportamento estranho dele.
por Pedro Willmersdorf no Extra
“Chegando, sem parar o carro, reconheci o rosto e cumprimentei “opa, Daniel?”. Ele fazia uma cara estranha e parou o carro a uns 7 metros mais a frente. Ok, entrei no carro e ele tava com um semblante de estranheza. Eu estendi minha mão pra cumprimenta-lo “tudo bem?”. Daniel não me respondeu e perguntou onde eu ia. Falei o nome da rua, dizendo que era ali na Consolação”, relembra Vinícius em seu post no Facebook.
Em seguida, o fotógrafo afirma que o motorista avançou mais 50m, abordando uma viatura da Polícia Militar. “Eu sou motorista de Uber e achei esse passageiro suspeito”, teria dito o condutor a dois policiais, segundo Vinícius.
“Eu não sabia como reagir, perguntando se era sério em meio a uns palavrões. Um dos PM ordenou que eu descesse do carro e começou aquela revista escrota e as perguntas, do tipo, onde eu comprei meu celular. Depois de ver se eu tinha passagem, o motorista foi embora e eu fiquei la com cara de bosta, tentando entender o que tinha acabado de acontecer, até que, enquanto checavam o número MEI do meu celular, apareceu um cara relatando uma atitude realmente suspeita, um cara tava armado próximo dali. O PM devolveu meu celular e disse pra eu descer a pé que chegava onde queria”, finaliza Vinícius, relatando que sua abordagem só foi encerrada porque os policiais foram acionados por outro chamado próximo dali.
Ao EXTRA, Vinícius relata o que se passou em sua cabeça durante aqueles poucos e perturbadores minutos da manhã de domingo.
— Eu fiquei me perguntando o tempo todo o que levou o motorista e os PMs a pensarem que eu era suspeito — especula o fotógrafo, revelando que o motorista também era negro, como ele — É aquela história do capitão do mato preto, né? — ironiza.
Relembrando o ocorrido, o rapaz afirma que precisou se controlar muito, sentindo um misto de “angústia muito grande, raiva, decepção”.
— Me sentia sozinho, fora da minha cidade e ninguém que eu conhecia em volta, sabe? A cidade acontecendo e eu ali, como se tivesse sido flagrado fazendo algo ilícito — desabafa Vinícius, que é natural de Sorocaba, interior paulista — Eu tô sentindo muita coisa ainda. Não tenho nenhum trauma, mas transtornos psicológicos são tão comuns, que poderia ser alguém cuja cabeça desencadearia uma parada muito grande e danosa à saúde — pondera o fotógrafo.
Acionada por Vinícius via Facebook, a Uber informou ao rapaz que irá investigar o caso e averiguar o incidente. Já o fotógrafo afirma que todo este ambiente de agressão o leva a refletir sobre o contexto de preconceito racial que ainda existe a olhos nus no país.
— O apoio é muito importante pra gente ver que não tá sozinho. Tem muita gente cansada com esse tipo de atitude. A luta é conjunta e isso que eu tô fazendo, de falar abertamente, entre as medidas legais, passa a ser responsabilidade minha, sabe? Isso é maior que eu, eu tô pensando nos outros negros que passam por isso, ou são até mortos por serem “confundidos” ou vistos como suspeitos. Isso tem que parar o quanto antes. Não quero botar um filho preto num mundo injusto assim.
A empresa Uber foi procurada, mas não se pronunciou até a publicação desta reportagem.