Os autos de resistência, ou a chamada resistência seguida de morte, colocam os policiais “acima da lei”, na opinião da ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros. A expressão é usada nos boletins de ocorrência, relativa às mortes de pessoas em alegado confronto com a polícia. Na prática, esse tipo de registro faz com que a morte não seja investigada com o mesmo rigor de um homicídio convencional.
“Isso acaba colocando a polícia totalmente acima da lei. Para você ter uma ideia, qualquer funcionário público está sujeito a uma apuração rigorosa de qualquer tipo de falha que possa cometer, como a perda de data para entrega de uma prestação de contas. Por que um policial não pode ser investigado quando em sua ação cotidiana uma pessoa acaba perdendo a vida?”, questionou a ministra ao participar de um ato na noite de hoje (3) pela aprovação do Projeto de Lei 4.471, de 2012. A proposta, em tramitação na Câmara dos Deputados, extingue esse tipo de registro. Pelo texto, essas situações devem ser chamadas de “morte decorrente de intervenção policial”.
Segundo Luiza Bairros, a violência policial causa insegurança social, especialmente entre a população negra. “A relação da polícia com os negros, especialmente com os jovens, tem um histórico bastante longo de violência, de suspeição, mesmo quando não há nenhum problema envolvido”, ressaltou em entrevista durante o evento, no Centro Acadêmico da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no Largo de São Francisco, centro paulistano.
O autor da proposta, deputado Paulo Teixeira (PT-SP), disse que além de mudar a forma de registro, o projeto estabelece um protocolo para esse tipo de ocorrência. O texto diz que as vítimas de confronto só podem receber socorro dos serviços especializados, é obrigatória a perícia do local em caso de morte e os inquéritos devem ter controle externo do Ministério Público e da Defensoria Pública.
Medidas semelhantes, adotadas no estado de São Paulo, em especial a determinação de que policiais não podem socorrer feridos em confronto, reduziu em 39% o número de mortos pela polícia ao longo de 2013.
Para Teixeira, o modelo atual é resquício das práticas de extermínio que a ditadura militar usava contra os opositores. “No Brasil existe uma situação inconcebível para um país que quer ser democrático e legalista. É muito grande o número de cidadãos que, sob o domínio do Estado, morrem pela violência policial”, disse ao ressaltar que muitas das mortes registradas como confronto são, na verdade, execuções de pessoas já dominadas.