Meu Beco Virou o Alvo da Segurança Pública

“No Brasil, a cor do medo é negra!”

Por Crislayne Zeferina, do Calango Notícias

Foto: Ricardo Borges/Folhapress

A nova era da perseguição começou quando foi assinado o novo pacto do Estado Presente no atual governo do Espírito Santo. Os becos e nossas vielas são todos os dias os alvos da má Segurança Pública que sobem nossas periferias com seus carros cercados de violência, discriminação e preconceitos a procura dos corpos pretos juvenis.

A validação desta violência começou no dia 13 de abril de 2019 no bairro São Benedito, quando policiais chegaram atirando bala de borracha nos moradores do bairro. Era para ser mais uma festa de 40 anos do time da comunidade: sorrisos, afetos, churrasco, cerveja, pula-pula, pipoca, crianças e famílias reunidas, celebrando a resistência de um time de futebol que leva entretenimento, vivências, samba e união para a comunidade de São Benedito, um dos bairros do Território do Bem.

A partir deste fato moradores da comunidade criaram uma rede de periferias para denunciar esses maus tratos da PM. Uma manifestação foi realizada pela comunidade e a corregedoria e a defensoria pública foram acionadas, porém, o retorno da justiça é lento e enquanto isso nossos becos continuam sendo alvo da Policia Militar.

A violência dentro das comunidades periféricas é alarmante e cada vez mais moradores têm denunciado, porém os opressores (PMs) se “justificam” dizendo que estão sendo oprimidos pelas comunidades. O que se questiona é: quem nunca foi opressor, pode oprimir alguém?

Eu me lembro de quando o beco da periferia era nosso parque de diversão. Hoje eu me lembro dos carrinhos e das bonecas quebrados, pois a PM faz questão de pisar nos nossos objetos e xingar nossas crianças dizendo: “vá para casa, anda! Eu estou mandando, ninguém mandou morar no morro”.

As políticas de (in) segurança chegam aos territórios periféricos caçando jovens negros para exterminar e encarcerar. Cada vez mais a pedagogia da crueldade é instalada nos territórios periféricos e os moradores buscam meios de dialogar para o fim destas violências.

A forma como a Segurança Pública faz uso da política genocida é gritante e só não enxerga quem todos os dias dorme em seus colchões de algodão, enquanto nossas mães nem dormem chorando pela perda de seus filhos.

Existe um genocídio institucionalizado, sistematizado e permitido pelo Governo Brasileiro que inicia jorrando o sangue dos corpos pretos periféricos e descendo até o asfalto. Assumir o fator racial e de classe em uma sociedade desigual e racista é quebrar o paradigma da miscigenação que prega que todos somos iguais e temos oportunidades iguais.

Segundo Gomes (2014, p.8)

[…] Assumir, de fato, a seriedade do que está acontecendo implica ao Estado, à justiça e demais instituições envolvidas ir além da indicação da necessidade de políticas públicas de ações afirmativas. Elas precisam ser acompanhadas de ações práticas. É importante reconhecer que as políticas de ações afirmativas só terão eficácia se acompanhadas de efetivo montante de recursos públicos, de articulação interministerial e interinstitucional, da superação da impunidade aos atos violentos praticados contra a juventude negra pela política, milícia, tráfico e pelos autointitulados cidadãos “de bem” que se julgam no direito de matar jovens negros pela simples suspeita de um ato infracional sem provas. Implicará, também, na urgente articulação e coparticipação entre União, Estados, municípios e DF, na revisão da política nacional de segurança pública, na desmilitarização das polícias e um posicionamento democrático do sistema de justiça e do Congresso Nacional.

Diante disso, entendemos que a truculência é a única garantia de comando da PM sobre territórios periféricos e corpos negros, e que a pedagogia da crueldade é a estratégia de reprodução do sistema patriarcal, machista, sexista, homofóbico, transfóbico e racista.

Mais a pergunta que fica é: Até quando? Para quem é esse Estado Presente? Para quem é essa Segurança Pública?

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