O emprego do filho de Eduardo Campos e a lenda de meritocracia. Por Sacramento

Para um jovem prestes a se formar em Engenharia Civil, a busca por um emprego é motivo de apreensão. Com a taxa de desemprego de 9% verificada em dezembro do ano passado, não está fácil encontrar um trabalho com ótimo salário e sem necessidade de experiência prévia.

Do DCM 

A não ser que esse jovem seja herdeiro de um clã político de Pernambuco, como o filho do ex-governador do estado e ex-candidato à Presidência da República Eduardo Campos.

João Campos, de 22 anos, é o novo chefe de gabinete do atual governador Paulo Câmara. Caso ele tenha o mesmo ordenado que o titular anterior do posto, receberá um salário bruto de R$ 8.456,00, segundo informações do portal de transparência do Governo de Pernambuco.

A divulgação da nomeação de um rapaz inexperiente e sem precisar prestar concurso para o cargo de primeiro escalão provocou indignação nas redes sociais.

Como já está virando rotina nas polêmicas da internet, criaram a hashtag #meuprimeiroemprego, usada por internautas para relatar as primeiras experiências no mercado de trabalho, todas elas bem menos remuneradas e pomposas que a do filho do Eduardo Campos.

O protesto é válido, embora nomeações como a de João Campos sejam tão comuns no serviço público quanto o café no copo de plástico e a caneta Bic amarrada à mesa com barbante.

Cargos comissionados, como são chamados os cargos públicos de livre nomeação sem necessidade de concurso público, servem como moeda de troca nos acordos políticos e para abrigar aliados ou apadrinhados.

Em tese, são destinados para cargos de chefia, assessoramento e direção. Na prática, distribuem cargos comissionados até para funções mais simples como telefonista, copeira ou motorista.

Na maioria dos casos os ocupantes estão lá para ganhar um dinheiro fácil, sem muito esforço e até mesmo sem precisar despachar na repartição, como a irmã da ex-amante de FHC, agraciada com um cargo no gabinete de José Serra.

Há, por outro lado, contratações relacionadas a um plano maior, como parece ser o caso de João Campos, que não esconde a intenção de disputar uma vaga de deputado federal em 2018.

A função de chefe de gabinete, que entre outras atribuições gerencia a agenda do governador, pode capacitar o mancebo nas artimanhas políticas e aumentar sua rede de contatos. Tolice é achar que ele está ali só pelos R$ 8.456…

João, aliás, está ocupando um cargo que já foi do seu pai, que chefiou o gabinete do governador Miguel Arraes na década de 80. A propósito, Arraes era avô de Eduardo Campos.

O sucessor de Eduardo Campos só está repetindo a jornada de herdeiros como ACM Neto, Marco Antônio Cabral (deputado federal e filho do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral) e Aécio Neves – como não lembrar dele, presenteado com um cargo público aos 17 anos?

Para quem tem essa linhagem, o sobrenome qualifica para qualquer cargo. Capacidade técnica e necessidade de processo seletivo ficam para os reles mortais, nascidos fora dos berços dourados das oligarquias políticas.

A tal meritocracia, propalada e endeusada por esta elite, não passa de uma “lenda do folclore brasileiro”, como escreveu a internauta @sammy-karoline no “tuitaço” em protesto contra a nomeação do Campos.

Um mito que graças à internet aos poucos se desmancha.

 

MARCOS SACRAMENTO

Marcos Sacramento, capixaba de Vitória, é jornalista. Goleiro mediano no tempo da faculdade, só piorou desde então. Orgulha-se de não saber bater pandeiro nem palmas para programas de TV ruins.

+ sobre o tema

Mulheres marcadas pelo cárcere enfrentam dificuldades para receber salário penal

Muitas mulheres encarceradas não são pagas adequadamente por seu...

Teremos sorte em estarmos vivos até a COP30

Todo começo de ano é a mesma coisa. E...

A lenga-lenga do Ibama e o calor de 50°C

Na semana em que a região Sul do Brasil...

B3 não vai recuar em agenda de diversidade apesar de mudanças nos EUA, diz presidente

O presidente da B3 Gilson Finkelsztain disse que a Bolsa brasileira...

para lembrar

Itamar vive: primeiro museu virtual sobre um artista negro brasileiro será inaugurado em 20 de novembro

Cantor, compositor, escritor, instrumentista, ator, produtor, artista. Itamar Assumpção...

“O Brasil não resolve sua crise sem eleição direta e governo legítimo”

Em entrevista à TV247, o economista, ex-ministro de FHC...

Cai liminar sobre escolha de professor de SP

Governo paulista reverte decisão sobre distribuição de aulas de...

Pochmann: “sociedade que deu origem ao PT não existe mais. Estamos com um retórica envelhecida”

Estamos vivendo uma mudança de época profunda na história...

Não é possível falar de racismo sem pensar nos impactos da crise climática, defende Anielle Franco

A primeira pessoa que fica sem acesso à moradia e território é a pessoa de favela. Chuvas torrenciais, enchentes, alagamentos e onda de calor são...

Censura de Trump atinge projetos no Brasil; ordem veta clima, gênero e raça

Projetos e pesquisas realizados no Brasil e financiadas por recursos americanos começam a ser alvo do governo Trump. O UOL recebeu documentos que revelam como termos...

Conferência Global de Crianças e Jovens (COY20) será realizada no Brasil em novembro de 2025

Pela primeira vez na história, o Brasil será o palco da Conferência Global de Crianças e Jovens sobre Mudança Climática (COY20), que acontecerá em...
-+=