Porcos e cachorros ou da grandeza última do não

por:Edson Lopes Cardoso

 

Leio opinião de Clovis Rossi (FSP, 29.07.09, p. 2) sobre características brasileiras, que faltariam ao governo chinês, na briga por um futuro grandioso no século XXI: nossa “democracia, porca, mas democracia, e a ausência de conflitos étnicos”.

Já fomos, em plena ditadura, uma democracia racial. Sobram evidências retóricas de que aceitamos viver na pocilga, mas não aceitamos o racismo. Com a ajuda da negação tudo leva a crer que construímos um curral de porcos, é verdade, mas nossos grunhidos não cessam de refutar com veemência o racismo. O que vale são os grunhidos.

Fernando Henrique Cardoso (“Os limites da tolerância”, Correio Braziliense, 02.08.09, p 21) concorda com Clóvis Rossi, mas acrescenta algo: “Temos a sorte de viver sob uma cultura que também aprecia a tolerância ( a despeito de recentes tentativas de fazer nascer um ‘racismo antirracista’, como diria Sartre)”. FHC acrescenta que todo aquele que não aceita seu “proper place” pratica racismo. A tolerância brasileira tem, portanto, o pavio muito curto.

Não há nada que se possa comparar, em nosso mundo intelectual, a essa negativa (não confundir com incapacidade de percepção). Obra maior da civilização nos trópicos, essa negação (não deve, não pode) concentra e resume o verdadeiro sentido de nossa existência como nação. Viva o (nosso) não!

A democracia porquinha confia ao “não” a tarefa sublime do aperfeiçoamento de suas instituições. A negativa é o sujeito de uma construção futura grandiosa que nos projetará como nação adiante da China e dos EUA, nações divididas. O não existe na e para o aperfeiçoamento da nação.

O desaparecimento forçado de antigas oposições e a plena aceitação de que tolerância tem limites tornam absolutamente dispensável a pronúncia de certas palavras (negro, afro, etc.). Como disse Rossi, o país tem que explorar melhor suas características se quer realmente ser cachorro grande no século XXI.

Matéria original: Porcos e cachorros ou da grandeza última do não

+ sobre o tema

Fome extrema aumenta, e mundo fracassa em erradicar crise até 2030

Com 281,6 milhões de pessoas sobrevivendo em uma situação...

Presidente de Portugal diz que país tem que ‘pagar custos’ de escravidão e crimes coloniais

O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse na...

O futuro de Brasília: ministra Vera Lúcia luta por uma capital mais inclusiva

Segunda mulher negra a ser empossada como ministra na...

Desigualdade ambiental em São Paulo: direito ao verde não é para todos

O novo Mapa da Desigualdade de São Paulo faz...

para lembrar

O racismo da defesa exclusivista do molde “cristão” de família – por Robson Fernando de Souza

  A família “cristã” idealizada pelo imaginário conservador: branca, com...

A banalização do mal na sociedade brasileira

Não podemos admitir de maneira nenhuma a violência contra...

Comandada por filhos de imigrantes, França vence a Croácia e é bicampeã mundial

Mandzukic (contra), Griezmann, Pogba e Mbappé marcaram os gols...

Por uma sociedade que saiba a diferença entre ficção e realidade – Por: Leonardo Sakamoto

Nas últimas semanas, escrevi três posts que abusaram da...

Foi a mobilização intensa da sociedade que manteve Brazão na prisão

Poucos episódios escancararam tanto a política fluminense quanto a votação na Câmara dos Deputados que selou a permanência na prisão de Chiquinho Brazão por suspeita do...

MG lidera novamente a ‘lista suja’ do trabalho análogo à escravidão

Minas Gerais lidera o ranking de empregadores inseridos na “Lista Suja” do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A relação, atualizada na última sexta-feira...

Conselho de direitos humanos aciona ONU por aumento de movimentos neonazistas no Brasil

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, acionou a ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer um alerta...
-+=