Santana do Riachão, o cenário imaginário de “Vidas Trocadas” – Por: Fátima Oliveira

Escrevi três romances: “A Hora do Angelus” (2005), “Reencontros na Travessia: A Tradição das Carpideiras” (2008) e “Então, Deixa Chover” (2013), publicados pela Mazza Edições. Não é incomum receber e-mails que indagam como escrevo meus romances.

Não deixo sem resposta e-mails de quem me lê, seja em crônica, artigo ou livros, estes num total de seis, além dos romances; e sou coautora de, pelo menos, oito livros coletivos dos quais escrevi um capítulo, em geral reflexões filosóficas e políticas sobre bioética, na interface com engenharia genética e/ou direitos reprodutivos. Recebo algumas cartas sobre os livros, daquelas antigas, escritas à mão, que acho pura ternura.

Na semana passada, uma leitora comentou, por e-mail, a crônica “A imanência e a transcendência das coisas e da vida no sertão” (O TEMPO, 6.4.2010): “Como em Nova York e à beira do lago Michigan, em Chicago, pode ficar pensando no torrão natal no meio do nada daquele Maranhão?

“Ao ler sua poética crônica, fiquei buscando descobrir o que disse ao escrever: ‘Costumo dizer que o sertão que conforta e acaricia o meu viver é, como dizem os rosiólogos, uma paisagem mental perene, que nutre a minha vida e a minha produção literária. Há algo de imanente ao sertão que não nos larga nunca e nos acompanha o tempo todo’.

“Só a entendi quando terminei de ler, ontem, ‘Reencontros na Travessia: A Tradição das Carpideiras’, que abriu meus olhos para as belezas que o sertão encerra, que eu, embora sertaneja, não enxergava. Filha de retirantes nordestinos, não compreendo como, com a vida ‘classe A’ que têm hoje em São Paulo, falam com saudades daquela pobreza crua, imensa e profunda que deixaram lá! Mamãe, tal qual você, diz que a alma sertaneja é só para quem tem uma e é para sempre. Eu perdi a minha e a reencontrei em seu romance!

“Finalizo perguntando: como escreveu um romance daquele, que é puro sertão, se saiu de lá menina? Quero apenas imaginar como nasce a sua inspiração, porque a beleza do seu livro encanta e desperta a gente!”.

Como escrevo? Por não encontrar as palavras mais adequadas para dizer como é o meu escrevinhar, faço minhas as palavras do escritor português José Saramago (1922-2010), citadas por Dad Squarisi: “Escrever é trabalho guiado pela inspiração. Há escritores que fazem um plano do que será o livro, com os personagens, as situações e tudo. Eu prefiro deixar que cada palavra que escrevo dê origem à palavra seguinte. E a palavra nova vai criando situações também novas dentro da minha cabeça. E aí me cabe decidir se continuo pelo caminho pelo qual ia ou se aceito a minha provocação involuntária de tomar novo rumo. E essa é a coisa mais interessante que há nesse ofício de escrever”.

Sou leitora compulsiva e adoro escrever. Fui menina nota dez em redação, descrição, interpretação de textos e de imagens. Escrevo para tocar as pessoas. Ao garatujar um romance, o meu único compromisso é contar uma história de vida e, nela, partes de muitas outras. É como desenrolar um novelo de linha com muitas pontas.

Enquanto escrevo, moro no mesmo lugar em que vivem as personagens! É uma imersão no mundo delas, até o meu cardápio muda: degusto o que as pessoas dali apreciam comer… Há quase um mês, moro em Santana do Riachão, cidade imaginária onde desenvolvo a trama do romance que estou escrevendo, “Vidas Trocadas”, que são memórias de uma médica do interior, lá nas brenhas, desde quando nem Conselho Federal de Medicina havia! Eram ela, sua consciência, o amor ao povo e o governo nem aí!

Fonte: O Tempo

+ sobre o tema

Fome extrema aumenta, e mundo fracassa em erradicar crise até 2030

Com 281,6 milhões de pessoas sobrevivendo em uma situação...

Presidente de Portugal diz que país tem que ‘pagar custos’ de escravidão e crimes coloniais

O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse na...

O futuro de Brasília: ministra Vera Lúcia luta por uma capital mais inclusiva

Segunda mulher negra a ser empossada como ministra na...

Desigualdade ambiental em São Paulo: direito ao verde não é para todos

O novo Mapa da Desigualdade de São Paulo faz...

para lembrar

Passagem de ônibus em SP vai aumentar para R$ 3

Declaração foi feita pelo prefeito Gilberto Kassab na manhã...

População idosa negra e covid-19: por que invisibilizar e negar direitos?

Um dos mais preocupantes movimentos políticos observados nesses últimos...

Vale do Dendê potencializa inovação na periferia de Salvador

A empresa de impacto social Vale do Dendê está...

A vida é raçuda

Alvorada Acordar cedo é fonte de sofrimento para Celina Macunis....

Foi a mobilização intensa da sociedade que manteve Brazão na prisão

Poucos episódios escancararam tanto a política fluminense quanto a votação na Câmara dos Deputados que selou a permanência na prisão de Chiquinho Brazão por suspeita do...

MG lidera novamente a ‘lista suja’ do trabalho análogo à escravidão

Minas Gerais lidera o ranking de empregadores inseridos na “Lista Suja” do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A relação, atualizada na última sexta-feira...

Conselho de direitos humanos aciona ONU por aumento de movimentos neonazistas no Brasil

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, acionou a ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer um alerta...
-+=