50 anos de morte do poeta guerrilheiro, Amílcar Cabral

Biografia: Amílcar Cabral

Amílcar Lopes Cabral nasceu em Bafatá, Guiné-Bissau, em 12 de setembro de 1924, e morreu em 20 de janeiro de 1973, em Guiné Conacri. Amílcar Cabral foi secretário geral, porta voz e representante internacional do Partido Africano para Independência de Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Cabral é considerado um dos grandes intelectuais e estrategista (militar e político) do século XX. Destacou-se por suas análises densas sobre a realidade africana, no que tange ao nacionalismo, ao pan-africanismo, à questão agrária, à cultura, à literatura, ao racismo, à educação, às relações de gênero, ao colonialismo e à libertação nacional. Obteve destaque também como poeta e por inovar a teoria marxista. Em 2020, foi eleito pela BBC World Histories Magazine o segundo maior líder de todos os tempos.

Apesar de Cabral ter nascido em Guiné-Bissau, seus pais, Juvenal Cabral (1889-1951) e Iva Pinhel Évora (1893-1977), eram cabo-verdianos, naturais da Ilha de Santiago. Ainda criança, aos oito anos de idade (1932), Cabral muda-se para Cabo Verde. Na adolescência, passa a escrever poemas inspirados na literatura de Jorge Amado – suas obras eram proibidas nas colônias portuguesas –, no Liceu Gil Eanes, na ilha de São Vicente, se destaca intelectualmente e se envolve ativamente com as atividades desportivas do Liceu.

Por conta de seu desempenho escolar, Cabral é contemplado com uma bolsa de estudos para cursar engenharia agrônoma no Instituto Superior de Agronomia (ISA), em Portugal. Em 1945, inicia seus estudos e, no curso de agronomia, conhece sua primeira esposa, Maria Helena de Ataíde Vilhena Rodrigues – com quem casa-se em 1951. Durante o período de estudos universitários, Cabral tem contato com a literatura negritudinista do senegalês, Léopold Sedár Senghor (1906-2001) e o martinicano, Aimé Césaire (1913-2008) – o que o faz refletir sobre a questão racial nas colônias portuguesas e desenvolver o conceito de “reafricanização dos espíritos”.

Cabral, juntamente com outros estudantes de países africanos, como Mário Pinto de Andrade (Angola, 1928-1990), Agostinho Neto (Angola, 1922-1979), Marcelino dos Santos (Moçambique, 1929-2020), Alda Espirito Santo (São Tomé e Príncipe, 1926-2010) e outros, funda o Centro de Estudos Africanos, que tinha por objetivo pesquisar sobre o continente africano e conhecê-lo em suas múltiplas determinações. Ali, passa a conhecer e se relacionar com a perspectiva pan-africanista. Durante sua estadia na Europa, assume diversas funções na Casa dos Estudantes do Império (CEI), milita no movimento antifascista e se aproxima do Partido Comunista Português (PCP) através do MUD-Juvenil.

Em 1952, Cabral defende sua tese doutorado sobre a erosão do solo. Nessa pesquisa, mobiliza diversos conhecimentos para além da agronomia e apresenta uma série de reflexões sociológicas. Após a obtenção do título acadêmico, Cabral e sua esposa, Maria Helena, seguem para Guiné-Bissau a serviço do Ministério do Ultramar. Nesse período, Guiné passava por muitas dificuldades econômicas e ocupava a posição de país mais pobre da África. Cabral ficou responsável por coordenar o recenseamento agrícola do país, por esta razão, visitou muitas regiões e conheceu diversos povos e suas respectivas particularidades culturais.

No ano de 1954, Cabral é obrigado a deixar Guiné-Bissau, por conta de seus esforços para criar uma associação desportiva e de lazer. Em 1955, funda o Movimento para Independência Nacional de Guiné (MING). Entre os anos de 1955 e 1956, vai trabalhar em Angola. Nas cartas a sua esposa, Cabral fica impressionado com a pobreza, a desigualdade social e a violência do colonialismo português em Luanda. Ainda no ano de 1956, juntamente com Viriato da Cruz (1928-1973), cria o Partido da Luta Unida dos Africanos de Angola (PLUA). Nesse mesmo ano, participa da elaboração de um documento que seria enviado à Organização das Nações Unidas (ONU) para debater as especificidades do colonialismo português.

Em 1956, no dia 19 de setembro, juntamente com Aristides Pereira, Luís Cabral (seu meio irmão), Júlio de Almeida, Fernando Fortes, Elisée Turpin, funda, na clandestinidade, uma das organizações mais importantes para a luta pela independência nacional, o Partido Africano para Independência de Guiné e Cabo Verde, o PAIGC.

No início das atividades, o caminho adotado pelo PAIGC eram os meios pacíficos, mas o partido optou pela luta armada após as tropas portuguesas matarem 50 pessoas e ferir outras 100 na greve de marinheiros e estivadores do porto de Pidjiguiti, em Guiné-Bissau, no de 1959 (o massacre de Pidjiguiti). Entre os anos de 1959 e 1963, Cabral ajudou a organizar a guerrilha em Bissau, conseguiu apoio da União Soviética, China, Cuba, Guiné Conacri, Senegal e outros países, obtendo, assim, armamento, formação militar e de enfermagem para membros do PAIGC, medicamentos, alimentos etc. Em 23 de janeiro de 1963, inicia-se a luta de guerrilha nas florestas úmidas de Guiné-Bissau.

Em 1962, Cabral torna-se secretário geral do partido. Em 1966, casa-se pela segunda vez, agora, com a guerrilheira Ana Maria Foss de Sá. Nesse mesmo ano, participou do congresso tricontinental do 7º aniversário da revolução cubana, onde defendeu a tese de que o motor da história não é a luta de classes, mas o desenvolvimento das forças produtivas. Em 1970, é recebido no Vaticano pelo Papa Paulo VI. Nesse mesmo ano, recebe o título de doutor Honoris Casa pela Universidade Lincoln nos Estados Unidos. Ao longo da década de 1960 e início dos anos 1970, Cabral, fez algumas intervenções na ONU para denunciar o colonialismo português, publicou artigos em que debatia sobre questões práticas e teóricas da luta anticolonial, concedeu entrevistas para a imprensa internacional e colaborou com a formação (política, ideológica e militar) dos quadros do partido.

A obra de Amílcar Cabral é extensa, se avolumam artigos, discursos, entrevistas, cursos de formação, debates, cartas e poesias. Em ordem cronológica, destacaria as obras: A minha poesia sou eu, publicada na revista Seara Nova, 1946; Acerca da utilização da terra na África negra, publicada no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, 1954; A arma da teoria, discurso pronunciado na Primeira Conferencia Tricontinental dos Povos da Asia, África e América Latina, em Havana, Cuba, 1966; Análise de alguns tipos de resistência, conversas no Seminário de Quadros do PAIGC, 1969; e Unindo as lutas, conversa com integrantes de movimentos negros no Estados Unidos, 1972.

Amílcar Cabral foi assassinado em 20 de janeiro de 1973, em Guiné Conacri. Até hoje, sua morte não foi totalmente elucidada, há diferentes versões sobre como teria sido sua execução, quem efetuo os disparos e quem encomendou o assassinato. Em entrevista concedida para o documentário A Morte de Amílcar Cabral 1973 (Joaquim Furtado, 2012), Ana Maria Foss de Sá relata que os dois estavam se aproximando da residência, após regressarem de uma atividade na embaixada da Polônia, quando foram abordados por três membros do PAIGC que estavam em um Jipe. Estes tentaram amarrar Cabral e levá-lo à força, mas ele resistiu, não deixou ser amarrado, por conta disso, foi alvejado por diversos disparos.

Mesmo com o assassinato de Amílcar Cabral, o processo de libertação nacional das colônias portuguesas era um caminho sem volta. No dia 24 de setembro de 1973, alguns meses após sua morte, Guiné-Bissau declara sua independência, e seu irmão Luis Cabral assume a presidência do país. No dia 05 de julho de 1975, Cabo Verde declara sua independência e quem assume a presidência é Aristides Pereira, que havia assumido a função de secretário geral do PAIGC no lugar de Cabral. Dia 20 de janeiro é dia dos heróis nacionais tanto em Guiné-Bissau quanto em Cabo Verde, em homenagem a Amílcar Cabral. Nos dois países, diversos espaços públicos e privados, como escolas, universidades, praças públicas, ruas, avenidas e museus, receberam seu nome.

Referências

ANDRADE, Mario Pinto de. A geração de Cabral. Arquivo Mário Pinto de Andrade. Disponível em: <http://casacomum.org/cc/visualizador?pasta=10198.001>. Acesso em: 21/12/2021, às 21h20min.

FURTADO, Joaquim. A Morte de Amílcar Cabral 1973. Duração: 53’53”, 2012. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=EongbXgKjg0>. Acesso em: 22/12/2021, às 20h.

NDJAI, Tcherno. O pensamento político de Amílcar Cabral: Teoria e prática em momentos decisivos na libertação da Guiné-Bissau (1959-1969). Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, 2012. Dissertação de mestrado. Disponível em: <https://repositorio.ufes.br/handle/10/6336>. Acesso em: 21/12/2021, às 19h30min.

VILLEN, Patricia. Amílcar Cabral e a crítica ao colonialismo. São Paulo: expressão Popular, 2013.

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