“Vidas trocadas: memórias de médicas” tem o SUS como cenário

Compartilho o ponto final de mais um romance que escrevi e seguiu para o prelo. É o “Vidas Trocadas: Memórias de Médicas…”, que tem a construção do Sistema Único de Saúde (SUS) como cenário e as pelejas de duas “médicas de aldeia”, a avó e a neta, durante quase um século fazendo medicina nas brenhas, saga iniciada quando a saúde ainda não era direito de todos nem dever do Estado, como diz a protagonista drª. Dália: “Nunca foi fácil fazer chegar medicina aos pobres”.

Por Fátima Oliveira enviado para o Portal Geledés

Não fizeram só medicina. Participaram da luta pela construção da saúde pública no país. Amaram. Sofreram. Constituíram família. São mulheres libertárias e hedonistas que se pautam na vida pessoal pelo que disse Alfred Kinsey (1894-1956): “Ninfomaníaco é alguém que faz mais sexo do que você”.

A drª. Dália se formou em 1945 na Faculdade Nacional de Medicina, hoje Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi contemporânea de três figuras de destaque na medicina e na política maranhenses: Antônio Jorge Dino (1913-1976) e José Duailibi Murad (1920-2011), formados em 1940; e Maria José Camargo Aragão, a célebre Maria Aragão (1910-1991), que passou no vestibular em 1935, mas só concluiu o curso em 1942! Então, no romance são quatro vidas que se cruzam, porém cada uma optou por exercer a medicina e fazer política de modos distintos!

A drª. Dália diz: “Todo o meu fazer médico, tudo o que fiz até hoje aqui, é política! Sempre fiz política. Votava em quem achava menos pior! Desde que aqui cheguei não houve um candidato a governador, a senador, a deputado e a prefeito que não fez uma visitinha à drª. Dália!”. Nunca declarou seu voto. Na eleição de Sarney a governador, 1965, anulou o voto!

Dália de Lourdes, a neta, médica gineco-obstetra, sobre a avó, a drª. Dália: “Era 1998. A drª. Dália, com 78 anos, formada em 1945, chegou a Santana do Riachão em 1948, aos 28 anos. Foi a primeira médica da cidade e da região, pau para toda obra, competência chegou ali e fez morada: atendia crianças, adultos, fazia parto, cesariana e cirurgias ginecológicas, principalmente as que ela chamava de ‘perereca suja’ (DIP, Doença Inflamatória Pélvica). Gineco-obstetra de formação. Meu avô, o dr. Celso, cirurgião geral e parteiro (aprendeu com minha avó!), chegou após a vovó. E partiu bem antes dela, morreu há muito tempo. (…).

“Foi médica de um posto de saúde até se aposentar, sem nunca ter faltado um dia. E dizia: ‘Sou médica da prefeitura 20 horas semanais, que cumpro religiosamente’. Do hospital recebia pelas consultas, internações, partos e cirurgias de ‘pererecas sujas’ que fazia; e um pró-labore como diretora, 5% mensais do lucro”.

1998: “O Samaritano é hospital privado de médio porte que também se sustenta de convênios médicos. Dos seus 80 leitos, metade conveniada com o Sistema Único de Saúde (SUS). Tendo 40 pacientes internados pelo SUS, encerrou. Não há mais vagas.

“Em tese, como ela diz, porque o Samaritano não deixa ninguém morrer em sua porta por falta de dinheiro! A ordem é colocar pra dentro. Partos são emergências e são sempre atendidos. Receber pelo serviço prestado é uma encrenca, a depender do prefeito de plantão. Acabam pagando, como diz vovó: ‘Prefeito aqui é quem me deve favor; eu não devo nada a prefeito; e nem tenho obrigação de sustentá-lo!

“Perguntei à vovó se o hospital poderia deixar de atender SUS. Disse-me que sim, mas ela tem compromisso com o povo da cidade que lhe deu tudo o que tem na vida. Então, é não! Que o Samaritano sempre vai atender SUS porque ela não vai deixar seu povo ao deus-dará!”.

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