‘Narcopentecostais’: casos de intolerância religiosa crescem com expansão de facção no Rio

Só em 2019, até setembro, a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa contabilizou 176 terreiros fechados após ataques ou ameaças de traficantes

Por Rafael Soares, Da Época

Imagem contendo itens sagrados em religião de matriz africana
Itens sagrados em religião de matriz africana (Foto: Georgenes Sampaio)

Aos 23 anos, Wendel Rodrigues Oliveira é um homem de fé. Em 27 de junho, postou no Instagram uma foto da Bíblia em seu colo, com a legenda: “Indo à casa do pai agradecer por cada dia de vida e pela paz que ele vem concedendo à comunidade do Parque (Paulista) e pelo seu povo”. Mas ele é também um homem do crime, e o relógio de ouro na foto com o livro sagrado é só um indicativo de seu poder. Na comunidade que cita em suas preces, o Parque Paulista, um bairro em que moram mais de 30 mil pessoas de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, o jovem é conhecido como Noventinha e comanda o tráfico de drogas. Foragido da polícia, tem mandados de prisão em seu nome por isso e por assassinato.

Esse fenômeno paradoxal dos traficantes evangélicos não é novo no Rio, mas vem se alastrando rapidamente nos últimos dois anos.Desde 2017, dobrou o número de favelas que o grupo de Noventinha domina no Rio, na esteira da derrocada de uma das facções rivais. Antes concentrada na Zona Norte do Rio, a facção se espraiou por outras regiões e chegou à Baixada Fluminense.

O crescimento desses “narcopentecostais” acrescentou uma chaga a mais nas favelas que essa facção domina. Além do tráfico de drogas e da violência cotidiana, a devoção torta aos Evangelhos se reflete na intolerância em relação às religiões de matriz africana — o que, vale sempre ressaltar, não encontra respaldo entre os verdadeiros evangélicos, que pregam a convivência pacífica e a tolerância.

Só em 2019, até setembro, a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, organização que reúne membros de várias religiões e representantes do Tribunal de Justiça e do Ministério Público, contabilizou 176 terreiros fechados após ataques ou ameaças de traficantes — mais da metade dos casos na Baixada Fluminense. No ano passado, a comissão não recebeu nem 100 denúncias.

As investigações da Polícia Civil revelam que o aumento dos casos está diretamente ligado a um plano expansionista da facção. Quem está por trás das ordens para os ataques são os traficantes que se dizem evangélicos e se apresentam nas redes sociais como o “Exército do Deus Vivo”, como os pastores evangélicos costumam se referir aos fiéis.

 

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