ONU busca combater o racismo e resgatar importância dos afrodescendentes

Vista de longe, de um vago senso comum, a América Latina é uma região com forte presença de negros no Brasil, de índios na Bolívia, no Peru e no Equador e de brancos na Argentina, no Uruguai e no Chile. Esse esboço de retrato da etnia latino-americana foi construído ao longo dos séculos, desde a colonização espanhola e portuguesa no século 16. Mas o surgimento e o avanço da ideia de diversidade cultural e de respeito aos direitos humanos ampliaram a presença na foto dos afrodescendentes e estão reconstituindo a história dos escravos negros que ajudaram a colonizar a região de uma ponta à outra, do México à Patagônia.

A chegada de africanos a esse pedaço do continente se deu de modo e intensidade específicos, mas todos vieram em grandes levas. Nova corrente migratória aconteceu depois do fim da Guerra Fria. A forte crise econômica que se abateu na África trouxe outra leva de africanos para a América Latina, nos anos 1990, especialmente para países que estavam no caminho dos barcos que saíram do continente africano rumo aos Estados Unidos e à Europa. Muitos negros ficaram na costa da América Central e do Caribe.

Revisitando a história oficial, pesquisadores e instituições internacionais estimam que na América Latina e no Caribe existam 150 milhões de afrodescendentes, quase 30% de todos os habitantes da região. Ou seja, o sangue negro corre em quase um terço da população latino-americana. Em países como Brasil, Colômbia, Cuba e Panamá, a presença negra é maior. Mais de metade da população brasileira é constituída de pretos e pardos — 51,1%, segundo estimativas mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em países como Equador, Peru, Venezuela e Uruguai, eles representam entre 3% e 6% da população. Mas estão também na Argentina, no Chile e no Uruguai, ainda que essas nações, em menor ou maior grau, resistam à ideia da presença negra na sua história. O certo é que os afrodescendentes de toda a América Latina têm uma marca em comum: são vítimas da pobreza, da exclusão social e da discriminação racial.

Para provocar a discussão do tema na mídia desses países, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) convidou jornalistas latino-americanos para uma oficina (ou um workshop, em inglês, ou um taller, em espanhol) de um dia em Manágua, Nicarágua, na qual a eles foi apresentada a publicação Derechos de la población afrodescendiente de América Latina: desafíos para su implementación, que reúne estudos sobre a implementação dos pactos e dos convênios internacionais para defesa e promoção dos direitos das populações afrodescendentes. A ideia do encontro, explicou Silvia García Savino, coordenadora do projeto População Afrodescendente da América Latina, foi a de esclarecer os convidados sobre os “clichês discriminatórios que continuam a existir na relação entre populações afrodescendentes e jornalistas” (veja entrevista). Silvia lembrou que ninguém nasce racista. “O racismo se aprende em casa, na escola, no trabalho, com a imprensa.”

Falaram aos jornalistas representantes de conjuntos agrupados de países da América Latina. O antropólogo afrocolombiano Jhon Antón Sánchez pegou pesado ao fazer um relato da situação dos descendentes de negros na Colômbia, no Equador, no Peru e na Venezuela. Disse que o comportamento dos governos em relação ao tema é uma “falácia democrática, um liberalismo multicultural enganoso”. Os afrodescendentes, ressaltou Sánchez, vivem uma realidade “de flagrante violação dos direitos humanos”. O representante brasileiro no encontro, Marcelo Paixão, coordenador do Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Laeser), disse que, apesar dos avanços institucionais brasileiros, que têm servido de exemplo à região, o país está longe de praticar a justiça social. “As desigualdades entre brancos e negros se mantêm muito profundas.”

 

 

Fonte: Correio Braziliense

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