Emicida: ‘Vivemos num país racista’

Emicida, rapper paulista, lembra a infância pobre, fala da proximidade com o crime e conta que até hoje é vítima de preconceito

POR KAMILLE VIOLA

Quando tinha 9 anos, Emicida era vítima de bullying e chegou até a ser jogado numa vala por meninos mais velhos. “Eu sofria discriminação, porque era o único pobre e negro na escola”, lembra ele. O tempo passou e Leandro Roque de Oliveira, hoje com 26 anos, é conhecido em todo o País. Mas, mesmo tendo melhorado de vida e mudado do bairro pobre, ele continua vítima de preconceito.

“Ainda sofro racismo. Esses dias mesmo levamos uma dura. Os caras chegaram agressivos, não acreditaram que a gente era músico. Revistaram tudo no táxi, mas não tinha nada mesmo”, conta o rapper, que se apresenta sábado na festa Xarpi, no Circo Voador. “Vivemos num país racista para c*. A postura de algumas pessoas comigo é diferente, mas isso só piora as coisas, porque mostra que por dinheiro elas fingem que não são racistas”, detona.

Criado na Vila Cachoeira, bairro pobre de São Paulo, Emicida teve uma infância muito humilde. “Perdi muitos amigos para o crime. A gente vive muito próximo do crime. É f…, eu não vou dizer que nunca vislumbrei a possibilidade de virar bandido. Para quem está ali e não tem outra referência, é f…: os caras têm as minas mais ‘da hora’, os carros mais ‘da hora’, as motos, vivem com dinheiro, cordão. Dá um parafuso na sua cabeça. Graças a Deus, com uns 16 anos virou uma chave na minha cabeça e eu entendi tudo o que a minha mãe tinha feito”, admite.

O pai do rapper morreu quando ele tinha só seis anos, deixando a mulher, Jacira, com quatro filhos para criar. “A minha mãe virou empregada doméstica, terminou os estudos, fez curso técnico de enfermagem e arrumou dois empregos”, lembra. “Isso me inspirou muito. Aí pensei que tinha que ficar rico. Comecei a trabalhar num ‘pico’ fixo aos 15 anos, mas antes eu fiz bico de pedreiro, catei papelão na rua, carreguei sacola no mercado. Que era mó m…, porque você carregava 200 toneladas, subia 300 ladeiras, chegava lá e a tiazinha te dava cinquenta centavos”, diz.

Assumir o rap como trabalho foi algo que demorou. “Até hoje, eu tenho frio na barriga. Na minha cabeça, ser cantor de rap era um ‘bagulho’ distante. O meu pai era DJ e virou alcoólatra porque se frustrou com a música. Ele morreu num bar. Então eu ficava: ‘Eu não vou repetir isso’ . E a minha mãe viu que eu tinha uma responsabilidade assustadora com essa parada (o rap)”, conta. “Eu comecei a rimar cedo. Mas demorei a subir num palco e cantar. Subi e foi dando certo. Hoje, acho que estou bem tranquilo com isso”.

Desde 2001 se apresentando profissionalmente, ele lançou duas mixtapes. Mas foi com o EP (um CD reduzido) ‘Doozicabraba e a Revolução Silenciosa’ (2011), com o qual viu seu nome atravessar as fronteiras de São Paulo.

“Em 2011, rolou o Rock in Rio, o Coachella (importante festival de rock americano)… Fui no ‘Altas Horas’, no Jô Soares, no ‘Fantástico’, e de forma independente. Quando você aparece na televisão, é muito louco”, explica Emicida, que em breve lança o clipe de ‘Zica, Vai Lá!’, com participação de Neymar

Agora, ele planeja um álbum ainda para este ano, no qual gostaria de ter participações de artistas como Pitty e Tom Zé. “Quero misturar outros estilos, mostrar que o rap é abrangente”, conta.

Fonte: O Dia

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