Mensagem do presidente da Fundação Palmares ao Dia da Mulher

Hoje, 8 de março, comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Data instituída, em dezembro de 1977, pelas Nações Unidas, para lembrar as conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres. Em todo o mundo, a história das mulheres é marcada por lutas, mas coroadas pelas vitórias. Conquistas dignas de seu espírito realizador.

Um exemplo são As Candaces, mulheres guerreiras que reinaram por direito próprio e não na qualidade de meras esposas, mas com todos os poderes de administração civil e militar. Assim como elas, outras mulheres negras na África e no mundo defenderam e defendem com sabedoria e influenciam tudo a sua volta.  Outro destaque é a lendária rainha Nzinga ou Ginga no estado do Congo, que mais tarde se tornaria Angola, que resistiu durante muitos anos à conquista portuguesa.

Conhecedor do protagonismo da mulher negra na sociedade, o presidente da Fundação Cultural Palmares, Hilton Cobra, acredita que tecendo cotidianamente suas mais diversas formas de enfrentamento, as mulheres negras, ao longo da história africana e da diáspora, afirmam-se como força matriz e nutriz dos grupos. São elas o espírito condutor da vida e dos modos de resistência.

Neste 8 de março,  o presidente lembra com emoção das mulheres excepcionais que marcaram a vida dele e presta uma singela homenagem a todas as  guerreiras negras e não negras, que lutaram e lutam todos os seus dias para transformar a sociedade e a realidade em que vivem, com o poema “Da Mulher, o Tempo”, de Conçeição Evaristo.

“ Durante minha trajetória pessoal e profissional a força, o dinamismo, a sensibilidade femininas foram fontes inspiradoras a abrirem os caminhos. Mulher negra é beleza, é resistência. E tenho quatro referências fundamentais. Primeiro, minha saudosa mãe, Maria Helena . Guerreira que me deu a vida, colocou no mundo, me formou e mostrou o que é a vida. À ela toda minha gratidão.

Minha grande amiga Luiza Bairros, hoje ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), que me fez perceber homem negro consciente e orgulhoso de sua negritude.

Lélia Gonzales, socióloga, antropóloga, pensadora, feminista, ativista, mulher que transmitia conhecimento. Satisfação imensa em tê-la conhecido e nos tornado amigos. Com certeza, o período em que estivemos juntos foi significativo para o enriquecimento de minha história e corroborou para a minha arte, inquietação e insatisfação, características necessárias para o fazer artístico.

E minha neta Flávia, 9 , que  não permite que minha vida seja monótona, hoje, aos 57 anos. Enriquece o meu dia e me faz o homem mais feliz do mundo e me coloca no prumo para tocar esse novo bom barco desafiador que é a Fundação Cultural Palmares. Às mulheres, Da Mulher, o Tempo ”.

A mulher mirou-se no espelho do tempo,
Mil rugas, (só as visíveis) sorriram,
perpendiculares às linhas
das dores.
Amadurecidos sulcos
atravessavam o opaco
e o fulgor de seus olhos
em que a íris, entre
o temor e a coragem
se expunha
ao incerto vaivém
da vida.

A mulher mirou-se no espelho de suas águas:
_ dos pingos lágrimas
à plenitude da vazante.
E no fluxo e refluxo de seu eu
viu o tempo se render.
Viu os dias gastos
em momentos renovados
d’esperança nascitura.
Viu seu ventre eterno grávido,
salpicado de mil estrias,
(só as contáveis estrelas)
em revitalizado brilho.

E viu que nos infindos filetes de sua pele
desenhos-louvores nasciam
do tempo de todas as eras em que a voz-mulher
na roquidão de seu silêncio
de tanto gritar acordou o tempo
no tempo.

E só,
só ela, a mulher,
alisou as rugas dos dias
e sapiente adivinhou:
não, o tempo não fugiu entre os dedos,
ele se guardou de uma mulher a outra…

E só,
Não mais só,
recolheu o só
a outra, da outra, da outra…
fazendo solidificar uma rede
de infinitas jovens linhas
cosidas por mãos ancestrais
e rejubilou-se com o tempo
guardando no templo
de seu eternizado corpo.

Autora: Conceição Evaristo

 

Fonte: Fundação Palmares

+ sobre o tema

Musas não, torcedoras

O machismo no futebol é notável: somos vistas como...

Projeto sobre homofobia adiado

Segundo a relatora Marta Suplicy (PT-SP), não havia segurança...

Católicas Pelo Direito de Decidir lançará campanha em defesa do aborto legal

Católicas Pelo Direito de Decidir A organização feminista Católicas Pelo Direito de...

Talvez você esteja ao lado de Bolsonaro e nem perceba

Em discurso no plenário da Câmara, nesta terça (9),...

para lembrar

Nota para imprensa: Mulheres e PNDH III

NOTA PARA IMPRENSA MULHERES E PNDH3. NOTA À IMPRENSA   Omissão: organizações...

8ª edição da FLUP destaca o feminismo negro e celebra a poesia falada

Realizado pela primeira vez no Museu de Arte do...

Paternidade ativa: ilustrações registram amor entre um pai e sua filha

Paternidade ativa: ilustrações registram amor entre um pai e...

Silêncios e rompimentos da mulher negra

Sempre fui uma criança muito silenciosa. O meu “não...
spot_imgspot_img

Órfãos do feminicídio terão atendimento prioritário na emissão do RG

A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) e a Secretaria de Estado da Mulher do Distrito Federal (SMDF) assinaram uma portaria conjunta que estabelece...

Universidade é condenada por não alterar nome de aluna trans

A utilização do nome antigo de uma mulher trans fere diretamente seus direitos de personalidade, já que nega a maneira como ela se identifica,...

O vídeo premiado na Mostra Audiovisual Entre(vivências) Negras, que conta a história da sambista Vó Maria, é destaque do mês no Museu da Pessoa

Vó Maria, cantora e compositora, conta em vídeo um pouco sobre o início de sua vida no samba, onde foi muito feliz. A Mostra conta...
-+=