A melhor notícia que li este ano veio do IBGE: a parcela do povo que se autodeclara de raça/cor preta aumentou de 8,6% em 2017 para 10,6% em 2022. O percentual pode parecer pequeno numa população estimada em 213 milhões, mas não é. Ao contrário.
É bastante coisa para uma sociedade que desde o século 19 vem mascarando sua identidade étnica a ponto de criar a classificação de pardo para quem não tem a tez retinta e de se auto intitular uma “democracia racial”. Somados, pretos e pardos (45,3%) são 55,9% dos brasileiros.
Trata-se de um claro (não resisti ao trocadilho) sinal de que nós, negros, estamos ainda mais dispostos e determinados a seguir resistindo e lutando pelo respeito a nossos corpos e a nossos direitos.
No livro “Tornar-se negro – ou as Vicissitudes da Identidade do Negro Brasileiro em Ascensão Social“, a psicanalista Neusa Santos Sousa afirma que “no Brasil, nascer com a pele preta e compartilhar de uma mesma história de desenraizamento, escravidão e discriminação racial não organiza, por si só, uma identidade negra”.
Isso reforça a importância de políticas de ação afirmativa, como as cotas nas universidades, e da ampliação do debate nacional sobre as desigualdades criadas e mantidas por questão racial.
Não é por acaso que pouco se fala sobre racismo nas escolas do país e que o protagonismo de personagens negras e indígenas em diversos momentos da nossa história seja ocultado. Ou que a lei que tornou obrigatório o ensino da história e da cultura afro não seja realidade efetiva apesar de existir há 20 anos (lei 10.639/03).
O letramento racial é fundamental para enfrentar o imaginário racista e institucionalizado de que o ser humano, bonito, desejável e digno de valor é branco. Milhões de brasileiros foram criados para sentir vergonha de suas origens, como se fossem descendentes de povos sem mérito ou cultura. O dado do IBGE mostra que a consciência desse coletivo está mudando.