Apesar da importância que a discussão sobre a crise climática carrega em si, o assunto ainda passa longe de ser algo presente no consenso crítico e social da grande maioria das pessoas brasileiras – e isso acontece por diversos motivos.
Porém – e ainda bem! -, cada vez mais surgem expressivas figuras dedicando suas vozes e vitalidade para disseminar pautas urgentes que, por um passado colonizador e abusivo de nossa nação, foram tiradas da ótica e perspectiva daqueles que mais necessitam delas.
É o caso do coletivo ‘Perifa Sustentável‘, que leva à 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26) uma narrativa plural e acessível sobre uma problemática intrínseca da sociedade brasileira: o racismo ambiental. Formado pelas jovens ativistas Amanda Costa, Ellen Monielle, Vitória Pinheiro e Mahryan, o grupo carrega em si trajetórias cheias de particularidades que, combinadas, somam forças para trazer uma imperativa e fundamental representatividade negra ‘de quebrada’ ao evento.
“Por muitos séculos, as populações pretas e periféricas foram excluídas, silenciadas, oprimidas em diversos sentidos. Então, poder colocar os nossos corpos, nossas narrativas nesse espaço, é algo muito doido, muito desruptivo, algo muito inovador”, pontua Amanda, que também é jovem embaixadora da ONU e delegada do Brasil no G20 Young Summit, em conversa exclusiva com a Vogue Brasil diretamente de Glasgow, na Escócia, onde o evento está sendo sediado até o próximo dia 12 de novembro.
Em seguida, Mahryan, também embaixadora da juventude da ONU e estudante de Relações Internacionais pela Belas Artes, completa: “A gente traz uma agenda que se relaciona com uma visão de mulheres pretas que falam à partir de suas realidades, com diversas intersecções, onde falamos à partir da periferia, das comunidades. É uma delegação de mulheres que podem ser cis, podem ser trans, mulheres que vem de lugares diferentes do Brasil… Então, isso para mim é muito potente, traz uma agenda que é predominantemente brasileira, onde falamos do sul global”.
A edição 2021 da COP, por sua vez, já é pertencente aos ativistas jovens de países periféricos, que, sedentos por mudanças efetivas, levam à conferência ideias claras e objetivas sobre o que deve ser feito para caminharmos em coletivo rumo à um mundo mais igualitário e harmonioso. “Precisamos pensar o que é o desenvolvimento sustentável, o que é se desenvolver? Quando estamos falando de racismo e população negra, e sobre o que isso tem a ver com desenvolvimento sustentável, precisamos olhar para o fato de que ninguém começa nas mesmas condições”, explica Vitória, mulher trans afro-indígena nascida e criada em Manaus.
“O Brasil tem um passado escravocrata, de mais de 300 anos de escravidão, e quando isso acaba, as pessoas negras são simplesmente alocadas no que hoje são as periferias das grandes cidades. Como podemos falar de desenvolvimento sustentável para essas populações? Isso é algo que me toca muito. Quando estamos, por exemplo, nesse espaço, estamos consumindo a ideia do desenvolvimento sustentável com capital, com dinheiro, e de posição energética, mas no Brasil estamos falando da galera periférica que não tem acesso a água, da periferia que não tem direito sobre a terra, assim como a comunidade indígena não tem direito sobre a terra. Então, precisamos de outro desenvolvimento para essas comunidades, algo que não pense só no capital e que esteja verdadeiramente ligado às nossas necessidades nesse presente momento”, acrescenta a manauense.
Ellen, que além de embaixadora do Perifa Sustentável ainda faz parte do MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas), completa a colega: “Eu sempre estou me questionando sobre o que é desenvolvimento, o que é se desenvolver, e eu peguei ranço disso. A caixinha do desenvolvimento sustentável é só usada para falar sobre acumulação de riquezas e exploração da natureza. O que falta é multidirecionamento, descolonizar o pensamento que já está enraizado nisso. Nós falamos sobre ‘bem viver’, que vem dos povos indígenas amazônicos e que significa viver plenamente. Viver em sintonia e equilíbrio com a natureza. E além do bem viver, para a gente que mora em centros urbanos e que estamos captados nesse sistema, eu coloco como ‘bem conviver’, nós precisamos bem conviver com a natureza, reaprender mesmo, pois vemos a natureza como algo longe e distante, vemos a luta pela natureza como algo trivial, que posso deixar para amanhã. É tipo o governo colocando uma agenda do meio ambiente que sabemos que não engloba tudo que a gente precisa e que é necessário para alcançar mudanças efetivas”.
Está claro até aqui como a inserção da população neste debate é mandatória e urgente, desse modo, chegamos à outro ponto: quero acompanhar a COP26, por onde devo começar? Amanda dá a dica: “Justiça climática. Esse é um dos termos que estão sendo mais discutidos. Então, vale ficar de olho em justiça climática, que é basicamente o fato de que os países que menos contribuíram para a atual crise são os que estão sendo mais prejudicados. Os que menos emitiram gases de efeito estufa são aqueles que estão recebendo os principais eventos climáticos catastróficos. Justiça climática no centro, atrelado – e ai colocamos a nossa causa – racismo ambiental. É importante escurecer o debate climático. Essa agenda não é só de homem branco, rico, privilegiado, que é dono de empresa e tem patrocínio da companhia para oferecer desenhos políticos individuais. Essa agenda climática é coletiva, é uma agenda Inter direcional, e quando a gente faz esse debate de uma forma descolonizada, trazendo uma narrativa de jovens pretas, de um país colonizado e periférico, de um país que enfrenta o governo genocida e ecocida, é importante diferenciar essas diferentes narrativas. Resumindo: Justiça climática, racismo ambiental e visibilidade para narrativas decolonizadas, principalmente de jovens pretas de países do sul global, como o Brasil”.
Abaixo, confira a conversa completa com as meninas do ‘Perifa Sustentável’:
Como surgiu a oportunidade de participar da COP26?
Amanda – Faltava um mês para a conferência, eu tinha a credencial mas não tinha financiamento para vir. Ai eu ficava pensando: ‘o dinheiro vai chegar, estou fazendo algumas reuniões, vai dar certo’. Passou uma semana, passou duas, e não chegava de jeito nenhum. Até que conversando com uma mentora, a Egnalda Côrtes, onde demonstrei desespero por ainda não ter o dinheiro para ir, ela me falou: “Amanda, minha querida, faz vaquinha online, convida sua rede para engajar junto de você”. Eu não queria, mas como não tinha outra opção, acabei escrevendo uma mensagem e postei no meu Linkedin. Nela eu me apresentava, falava sobre o trabalho que desempenho, que iria para a COP26 mas que precisava de ajuda financeira, e finalizei adicionando todos os custos e a minha chave PIX. Fui dormir. No outro dia eu acordo e estava acontecendo uma coisa doida: muito apoio entrando na minha conta, várias notificações de transferência chegando. E foi um sentimento muito doido, porque eu estava muito grata, mas ao mesmo tempo estava muito incomodada pois não estava entendendo o porquê de eu estar recebendo tanto apoio. Novamente, fui falar com a Egnalda, sobre não estar sabendo lidar com a situação, não estar entendendo o que estava sentindo, pois, teoricamente, eu deveria estar feliz sem contestação. E ela me respondeu: “Amanda, você é uma mulher negra e mora em uma zona periférica. Para você estar onde você está hoje, foi preciso muito esforço da sua parte. E nisso, o seu corpo não está acostumado a apenas receber. Em toda sua vida, você teve que trabalhar demais, teve que se esforçar demais, então toda vez que recebe algo, seu corpo estranha. Isso não é uma coisa de agora, é uma coisa ancestral. Onde estavam as mulheres negras? Elas estavam trabalhando. Então, ao invés de ficar em dúvida, muda a perspectiva e começa a questionar o que você pode fazer com o lugar de influência e visibilidade que você tem hoje. Será que não é o momento de apoiar outras jovens mulheres negras que também não teriam acesso para participar dessa conferência?”. E foi isso, à partir daí decidimos apoiar a Ellen Monielle, que estava quase com a credencial, e foi um ato de fé. Eu sou cristã, acredito em Jesus, e acreditava no meu coração que ia dar certo. Apoiando a Ellen, comecei a fazer alguns movimentos intencionais para captar essa grana. Passou uma semana, Vitória Pinheiro me manda mensagem, falando que conseguiu a credencial mas que ainda precisava da grana. O desafio maior era conseguir o recurso para estar aqui. No dia seguinte, enquanto eu estava orando, senti no meu coração que eu precisava apoiar a Vitória também. De novo, fui conversar com a Egnalda, pois na minha cabeça a gente só ia comprar a passagem da Vitória, que é uma super ajuda. Mas quando eu levo essa narrativa, ela me devolve dizendo que eu não posso fazer só isso, eu preciso pagar toda a estadia dela, todos os custos. A Vitória é uma mulher trans, afro-indígena, de Manaus. Olha o lugar de vulnerabilidade social que ela se encontra. E ai fomos fazendo as reuniões, as articulações, e fomos conseguindo apoio. Até que um dia acordei com a ideia de conseguir uma credencial para a Mahryan, onde falei com alguns contatos e consegui a entrada para ela. Enfim, o apoio foi acontecendo, foi chegando, e hoje temos 5 apoiadores principais: Escritório Daniel, Fundação Tide Setubal, Zentys Medical, a agência Côrtes, e o Clube de Criação.
Vitória – Eu acho que o mais incrível foi conseguirmos nos conectar a apoiadores que estão muito ligados as coisas que a gente defende e trabalha. Isso fez total diferença.
Mahryan – Isso era uma pauta muito clara para gente. Não só ser financiada por uma empresa, mas sim por instituições que carregam as bandeiras que o Perifa Sustentável traz, então diversidade, questão do meio ambiente, mulheres negras em cargos de gestão, mulheres em cargos de tomadas de decisão… Isso é muito importante para gente, fez total diferença.
Vitória – Ainda mais no ativismo, já que o ativismo sempre é colocado como uma coisa teórica e que não tem apoio, ou que tem contato com apoiadores mais institucionalizados. Eu gosto muito de como a Amanda traz isso, por causa do reconhecimento mesmo. O reconhecimento se torna um negócio difícil quando estamos acostumadas com um lugar de subordinação. E ai, isso para uma mulher negra, para a população negra, ainda mais para as juventudes que estão mais marginalizadas, é o que é muito curioso, né? É romper com uma estrutura! Então, eu fico muito feliz de estar nessa comitiva.
Qual a importância que participar da COP26 desempenha na vida de vocês?
Amanda – Por muitos séculos, as populações pretas e periféricas foram excluídas, silenciadas, oprimidas em diversos sentidos. Então, poder colocar os nossos corpos, nossas narrativas nesse espaço é algo muito doido, muito desruptivo, algo muito inovador. Pois pensa só: vivemos em um mundo patriarcal, heteronormativo, capitalista, de supremacia branca. Quem manda nesse mundo é a figura do homem branco cisgênero velho, que detém certo privilégio. E dentro dessa estrutura social, onde está a mulher negra? Ela está na base! E ai, quando você vê quatro mulheres negras maravilhosas, jovens, com esse sorriso apresentando posições políticas, falando que é necessário demarcação de terras indígenas e quilombolas, falando do enfraquecimento de políticas públicas, falando do desmonte dos órgãos de fiscalização, então trazendo uma pauta, com propriedade, domínio, legitimidade, autoridade, com esse sorriso no rosto, entendendo que a gente carrega uma luta que é séria, mas que a gente também carrega a essência da juventude. Imagina a disrupção que causa em um tomador de decisão ser pautado dessa forma. Ser convidado a pensar em soluções desconolizadas, soluções periféricas, que fogem dessa comunicação centralizada. Para mim é muitos sentimentos estar aqui hoje, mas me mostra que a influência e a visibilidade que eu tenho não é para se tornar algo egocentrado, mas sim para que eu puxe outras mulheres junto comigo, para que elas também contem suas narrativas, dividam suas ideias, e para que a transformação possa ser coletiva. Porque hoje, somos 4 mulheres negras, ano que vem seremos 10, depois 20, depois 30, até a gente de fato causar a transformação social que a nossa nação merece.
Mahryan – Acho que um dos principais pontos para mim dialoga muito com o que foi dito, pois para mim uma das principais importâncias de estar aqui, além de ser mulheres negras ocupando espaços de tomadas de decisão que são extremamente importantes, é o fato de nós carregarmos vivências que são extremamente plurais, mas ainda assim trazermos a nossa agenda. Então, a gente traz uma agenda que se relaciona com uma visão de mulheres pretas que falam à partir de suas realidades, com diversas intersecções, onde falamos à partir da periferia, das comunidades, é uma delegação de mulheres que podem ser cis, podem ser trans, mulheres que vem de lugares diferentes do Brasil… Então, isso para mim é muito potente, traz uma agenda que é predominantemente brasileira, a gente fala do sul global. O Perifa Sustentável busca trazer a visão da periferia a respeito da crise climática. Eu acredito que, por muito tempo, as falas sobre meio ambiente, quando a gente falava de educação ambiental e passava a olhar para a periferia, era sempre com um olhar de que as comunidades, as mulheres, os povos negros deveriam ser ensinados a respeito das pautas climáticas e meio ambiente. Então, é sobre acessibilizar. Só que isso acaba sendo pouco sobre ouvir. Pouco sobre ouvir as mulheres negras sobre as suas pautas, suas necessidades. Por isso, para a gente, estar aqui é tão importante estar nesse espaço trazendo as nossas próprias pautas, que são extremamente plurais. Mulheres sudestinas, mulheres nordestinas, mulheres com histórias que se cruzam, que falam de juventude. Estar aqui de maneira tão plural, é extremamente representativo para gente.
Vitória – Eu acho que o que me traz aqui é que estamos em sonhos coletivos. Antes de eu me conectar com as meninas e a gente conseguir esses apoios, eu estava com uma vaquinha que o nome dela era ‘Sonhos Coletivos’, e não era à toa. Minha trajetória vem muito pelo ativismo e por uma tentativa de impactar por políticas públicas, mas sem saber diretamente como isso pode de fato acontecer. E quando a gente está falando sobre espaços de decisão, já temos uma visão que já historicamente construída sobre o que é isso, né? As meninas estavam falando que, secularmente, a gente sabe quem são as pessoas que estão nesses espaços. E eu acho que a grande mudança nisso está sendo exatamente isso que está sendo construído agora, para além da representatividade, pois ela também é vazia, né? Quando a gente pensa em representar, achamos que é uma pessoa ou um lugar. Mas quando falamos de sonhos coletivos, estamos falando de uma transformação que possa ser socialmente justa e que inclua o máximo de pessoas possíveis. Então, acho que isso é o que mais conecta o motivo de eu estar aqui.
Ellen – Eu parto muito das palavras de Vica (Vitória), eu também acredito muito em sonhos coletivos e estou aqui para construir esses sonhos, trazendo a voz do povo preto e pobre para esse espaço. Eu sou do MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas), além do Perifa Sustentável, e estou com esse intuito de representação e pesquisa. Estou fazendo pesquisas, estudando diplomacia indígena, e hoje, inclusive, tive o prazer de entrevistar uma mulher indígena do Panamá. E eu pensei: ‘Nossa, eu estou aqui fazendo isso, sabe? Estou aqui vivendo com objeto de pesquisa’. A mulher preta dentro da academia é você estar em um lugar onde as pessoas não te querem. Por causa de todo o sistema que estamos inseridos, eles não querem que você questione, se aproprie de conhecimentos que nos foram negados. E eu estudo teorias descoloniais, isso me faz questionar até dentro do espaço que eu estou inserida. Eu amo questionar. Estou aqui para isso e também para trazer muito das coisas que eu estou vivendo e aprendendo. Esbarrei com um senador aqui, que é lá da minha cidade, e eu falei: “Olha, eu vou marcar uma reunião com você, vice? A gente vai marcar uma reunião”, daí peguei o cartão e é isso, sabe? Não adianta nada eu vir para cá, falar, falar, e apenas estar aqui e não levar nada de volta, não levar estratégias e mudanças para onde eu vivo. E, quem sabe, eu impacto o local que eu vivo, quem sabe eu alcance mais um pouco junto com esse coletivo. Porque quando você é individuo, vale até fazer umas mudanças dentro de onde você está, mas não vai ter o mesmo impacto de quando tem pessoas do seu lado para segurarem sua mão e guiar. Por isso que eu amo estar aqui nesse ambiente com as meninas. Me faz acreditar!
Como tem sido essa vivência até agora? De que maneira esses dias na conferência ajudarão o trabalho que vocês desenvolvem daqui para frente?
Ellen – Eu estava conversando com essa mulher indígena, do Panamá, e, comentando sobre o fato dela ser mulher, perguntei o porquê mulheres não tinham centralidade nas tomadas de decisões. E ela respondeu: “Porque eles sabem que quando a mulher está à frente desses espaços, a gente toma as decisões com bondade e com cuidado. E a gente consegue alcançar mudanças porque a gente vive a terra. A gente sente a mãe terra dento da gente”. E eu fiquei tão impactada com isso. Essa fala me deu muitas forças para as pequenas disputas que vivemos aqui. Estamos em um espaço que está discutindo, basicamente, adaptação, financiamento, coisas que, enfim, são importantes dentro de um contexto capitalista, e temos que tomar cuidado para não cairmos dentro dessas coisinhas que acabam sendo debatidas aqui e justamente entre o espaço de disputa. É um espaço branco, heteronormativo? Sim! Mas é um espaço de questões profundas, que vivemos no nosso sistema. Existem muitas outras pautas que as meninas estão trazendo e que não são totalmente inseridas nisso. Acho que estamos fazendo um bom trabalho, estamos falando, estamos aqui. Enfrentamos muitas coisas, individualmente, para estarmos aqui. Mas, levar para onde eu quero levar as coisas que tenho aprendido aqui, não tem como dimensionar, pois é uma coisa que completa. É uma bolinha de cristal, contendo todo o conhecimento que só vou entender quando terminar tudo e eu sentar para escrever.
Amanda – Um ponto que é válido destacar é que por muito tempo nos colocaram em um lugar de disputa, no sentido de: Se eu consegui, outras pessoas não vão conseguir mais, só tem espaço para uma pessoa só. E eu acredito que o que a gente carrega não é nem uma disputa de narrativa, mas uma nova possibilidade, estamos criando o que não existe. Trouxe as meninas comigo para essa entrevista, por exemplo, temos uma narrativa do norte, do nordeste, e estamos ampliando essas vozes. Criar esse novo lugar é também o que estamos fazendo aqui. Às vezes esses líderes mundiais estão olhando para determinado ponto, mas nós sabemos que a solução vai ser diversa, ela vai ampliar múltiplas vozes. Parte da nossa dinâmica dentro desse espaço é tanto promover nossas próprias vozes, que carregam pautas políticas, que denunciam o que está acontecendo no nosso governo, que trazem o genocídio, o ecocidio e, assim como diz a Ellen, todos os ‘cidios’ possíveis, mas que também possui o objetivo de promover outras pessoas, outras causas, promover outras organizações, e mostrar que o ativismo climático jovem é diverso. A pauta ganhou muita visibilidade por conta da Greta Thunberg, o que é muito massa! Mas não podemos esquecer que ela é uma mulher branca, do norte global, que tem muita apoio, tanto de contatos, quanto de recursos e financiamentos…
Vitória – E que ela não fala por nós, né? Apesar de falarmos das mesmas coisas, são outras realidades. Para mim estar aqui é justamente confrontar essas outras realidades, que, por exemplo estamos em um painel, e são pessoas de outros países discutindo sobre um problema que é totalmente diferente dos do Brasil, do que é a nossa realidade no nosso país. Hoje, o sistema financeiro anunciou um commitment de 15 trilhões, uma coisa surrel, sabe? E ontem o Doria estava aqui e ele anunciou um investimento de 4 bilhões para despoluir o rio. E eu fiquei pensando: ‘Nossa, imagina 4 bilhões para justiça social, para os grupos de base que estão agindo nas pontas ambientalistas’.
Amanda – É que esse dinheiro não chega na ponta. Geralmente, ele é intermediado e as pessoas que estão realmente fazendo, como nós aqui, não tem acesso. Então, muitas vezes a juventude está nesse lugar de inspiração, mas não somos apenas isso. Somos inspiradoras para caramba, olha o que estamos fazendo, porém é importante discutir que o financiamento tem que estar na nossa mão, o recurso tem que chegar direto para nós. A gente tem propriedade e domínio, tem recurso para estar aqui, imagina como seria se tivéssemos investimento e apoio. Imagina quando temos pessoas mais experientes olhando para gente, não de um lugar de infantilização, nem de apenas inspiração, mas de um lugar de igualdade. E é isso que estamos trazendo para esse espaço. A tarde tivemos uma reunião com alguns tomadores de decisão, por exemplo o Milton Tato, que é Deputado Federal pelo PT, e o Senador Jaques Wagner, para falar, principalmente, em nome da colisão negra por direitos, que o Perifa Sustentável é um membro, e, também alinhado com a CONARC, para trazer a visibilidade preta para esse espaço. Para trazer a visibilidade da nossa raça.
Mahryan – E faz toda a diferença quando a gente está nesse espaço gigantesco de tomada de decisão sendo mulheres, ativistas e jovens, na forma que a gente é olhada até pelos próprios líderes dos nossos territórios. Então, quando a gente fala com esses lideres, com esses políticos, e começamos a nossa articulazação a partir de um espaço tão importante, tao potente quanto a COP, a gente tem que levar para as nossas comunidades, a gente tem que implementar na nossa realidade local as nossas vozes. Elas são ouvidas, recebidas, de uma forma totalmente diferente. A gente percebe que a receptividade dos líderes e políticos que nos recebem são extremamente diferentes, e quando a gente voltar para o Brasil, vamos ter muita articulação para realizar diversos projetos para implementar, que é o que chamamos de pós COP. Estar na conferência é extremamente importante, a gente faz reuniões, vamos falar em nome da juventude, que é o que viemos fazer, só que existe um trabalho muito importante e aprofundado no pós. Ele não é feito em apenas duas semanas de conferência, é um trabalho anual, um trabalho de uma vida, de décadas. Que é o trabalho do ativismo, colocando as pautas da juventude para frente, as pautas de mulheres, as pautas mulheres pretas, racionalizadas ali, junto a esses líderes mundiais que encontramos aqui. Então, com certeza, é dialogar com essa visão internacional que está sendo colocada aqui, quando ela é diferente das nossas realidades locais, como as Europeias, e quando ela é similar, como alguns países africanos que sofrem com problemáticas parecidas com as nossas, como, por exemplo, a desertificação. Só que também é pensar em nível local, pois existem outros representantes brasileiros que estão aqui, que estão dispostos ao diálogo, então a gente volta para o Brasil com o coração quentinho. Sabendo que plantamos uma sementinha nesse espaço que vai ser super regada com muito trabalho, mas que tem um gosto de um começo de uma transformação muito importante, que é essa terceira via, o caminho do coletivo, é o caminho de realizar quanto mulheres negras, quanto ainda ativistas.
Vitória – Isso não é nada além do que a gente já faz! Para mim tem sido muito incrível também me encontrar com outros jovens, de outros países, de poder trocar. Acho que a própria COP tem esse caráter. É um evento de duas semanas, que acontece uma vez no ano, mas que é fruto de um engajamento que acontece durante todo o resto do ano, reuniões que são destrinchadas entre grupos, movimentos, com governos… E isso é muito do trabalho do ativista, agindo na base. Mas para mim é muito um sentido da gente precisar expandir ainda mais o que é a juventude, o que são as juventudes brasileiras. Porque criamos uma visão do que é o jovem, e de qual é o jovem que está nesses espaços de decisão, principalmente quando falamos de países como o Brasil. Temos uma gama variada de juventudes, e juventudes que não vistas ou que tem sua juventude negada propriamente. E ai entra o caso de pessoas travestis, de pessoas LGBTs, as juventudes indígenas. O que nos traz até aqui e que faz esse nosso ajuntamento ser tão potente, são esses cruzamentos, não só de trajetórias, mas dessa diversidade. E poder fazer um recorte das diferentes coisas que a gente vive em nossa realidade.
Vocês falaram sobre a Greta Thunberg e como ela, apesar da importância que tem para a pauta, não representa a realidade da maioria dos brasileiros. Acho importante fazer esse recorte, pois muitas pessoas não entendem ou não sabem que as problemáticas institucionalizadas na nossa sociedade afetam o desenvolvimento sustentável no nosso país. De que maneira a desigualdade social e o racismo afetam o desenvolvimento sustentável no Brasil?
Vitória – Eu gostaria de problematizar um ponto antes. Precisamos pensar o que é o desenvolvimento sustentável, o que é se desenvolver? Que tipo de desenvolvimento a gente quer, principalmente da onde a gente parte? Quando estamos falando de racismo e população negra, o que isso tem a ver com desenvolvimento sustentável, precisamos olhar para o fato de que ninguém começa nas mesmas condições. O Brasil tem um passado escravocata, de mais de 300 anos de escravidão, e quando isso acaba, as pessoas negras são simplesmente alocadas no que hoje são as periferias das grandes cidades. Como podemos falar de desenvolvimento sustentável para essas populações? Que tipo de desenvolvimento essa massa precisa? Que tipo de justiça, por exemplo… Isso é algo que me toca muito. Quando estamos, por exemplo, nesse espaço, estamos consumindo a ideia do desenvolvimento sustentável com capital, com dinheiro, e a posição energética, mas no Brasil estamos falando da galera periférica que não tem acesso a água, da periferia que não tem direito sobre a terra, assim como a comunidade indígena não tem direito sobre a terra. Então, precisamos de outro desenvolvimento para essas comunidades, algo que não pense só no capital e que esteja verdadeiramente ligado as nossas necessidades nesse presente momento.
Mahryan – Uma das principais dificuldades que a gente enfrenta também, ao comunicar a crise climática, não só para jovens, pessoas negras e periféricas, mas para o povo brasileiro no geral, é comunicar a crise climática de uma maneira que faça sentido. Porque o discurso ativista climático não é só branco, ele ainda é muito europeu, extremamente ocidental e voltado para o olhar do norte global, e existem coisas que não se aplicam. Por muito tempo se falava de ambientalismo e a justificativa, o que usavam como frase de impacto, era que tínhamos que preservar o meio ambiente e lutar contra o super aquecimento do planeta porque senão nossos filhos nunca veriam um urso polar. Mas perai, a gente vive no Brasil, estamos falando a partir da visão do sul global. Eu, provavelmente, vou morrer e nunca vou ver um urso polar, não é sobre isso… É o tipo de fauna e de flora que exite em países como Estados Unidos e Canada, e a gente tem que descolonizar esse discurso. Essa é uma tarefa muito árdua para nós, quanto juventude, só que é extremamente recompensador pois passamos a comunicar a crise climática de uma forma que faça sentido. Então, por exemplo, quando falamos com populações litorâneas, com um jovem sudestino do Rio de Janeiro, a abordagem é tipo: “Você gosta de praia? Você mora em uma cidade litorânea, ne? Você sabe que ela pode desaparecer?”. É acessibilizar, o que não é subjulgar as comunidades e periferias, as mulheres, os povos negros e indígenas, e achar que eles não sabem sobre crise climática. É acessibilizar um discurso que é extremamente embranquecido, europeizado, e trazer para as nossas realidades. É fazer esses paralelos, trazendo essa visão para a juventude, para que ela entenda cada vez mais como a crise climática afeta cada vez mais as suas realidades, e como falar de clima, de meio ambiente, também é falar de justiça social, racial, de gênero. E trazer essas pautas para gente, para que cada vez mais a discussão climática possa ser apropriada pelas nossas juventudes e possa ser nossa.
Amanda – Acho que um exemplo bem característico, para sustentar o que a Mahryan traz, é interseccionalidade. Quando eu comecei no ativismo climático eu fui muito questionada. O pessoal ficava: “Amanda, você vai falar de clima? A galera preta ta morrendo, olha a polícia matando a gente, olha o encarceramento, e você vai falar de clima? Pauta de gente branca, rica, privilegiada. Vai virar vegana também, né? Vai virar faria limer?”. O desafio é comunicar que a pauta climática também é uma pauta racial, que o discurso climático foi embranquecido, mas que é necessário escurece-lo e fazer com que a justiça climática, à partir da nossa narrativa, da vivência das pessoas que estão nos territórios, povos indígenas, quilombolas, pretos, periféricos, favelados, sejam evidenciados. E é um desafio duplo, porque escolhemos comunicar tanto a galera que está nas comunidades, falando de um lugar que eles já vivem, mas também habitar outro espaço, falar com tomador de decisão em inglês em uma conferência da ONU, representar a juventude do nosso país. Ter essa flexibilidade, e esse dinamismo para transicionar em diferentes espaços, tanto na quebrada, quanto em um lugar de luxo, é o que demanda um amadurecimento muito profundo. Eu sei que a gente só pode fazer isso hoje porque temos apoio, e ai volta para isso. Como vamos falar de desigualdade, crise climática, como um discurso se conecta no outro? Bom, quando a gente traz a palavra coletivo, quando não estamos pensando apenas na nossa narrativa. Estou furando uma bolha para que outras pessoas de quebrada, outros jovens pretos de periferia, enxerguem na revista, por exemplo, um lugar que vem para elas. Entendendo que a causa que elas vivenciam e defendem, também pode ser um lugar de furar bolhas e conectar diferentes narrativas. Só estamos aqui, nesse momento, fazendo essa entrevista, porque recebemos apoios. Queremos, de fato, levar esse conhecimento que colhemos aqui para os nossos territórios, e quando a gente pensa em transformação, a gente ta pensando em recursos financeiros, em recursos de contatos, de articularizações… e quando a gente traz essa intersaccionalidade, mostrando que falar de clima é falar de gênero, de raça, de territórios e juventudes, traz profundidade para nossa narrativa.
Ellen – Eu estudei intersaccionalidade por um tempo, mas não gosto muito desse termo, eu usaria transversalidade. Isso porque, acho que a ideia interseccional vão ter muitas relações, como a Amanda falou, mas quando falamos de clima, a pauta vai ser transversal. Interseccionalidade vão ser relações, transversal é cruzar, ela vai transvergir sobre tudo aquilo que foi citado. E eu sempre estou me questionando sobre o que é desenvolvimento, o que é se desenvolver, e eu peguei ranço disso. A caixinha do desenvolvimento sustentavel é só usado para falar sobre acumulação de riquezas e exploração da natureza, sabe? Falam de um modo mais bonitinho, de um modo de ‘tem riqueza aqui então vamos falar como os povos indígenas tem que se desenvolver’. Que ignorância! Pode vir o presidente da ONU aqui falar isso e eu foi falar: ‘Quem é você para dizer como esses povos devem viver?’. O que falta é multidirecionamento, descolonizar o pensamento que já está enraizado nisso. Nós falamos sobre ‘bem viver’, que vem dos povos indígenas amazônicos, que significa viver plenamente. Viver em sintonia e equilíbrio com a natureza. E além do bem viver, para a gente que mora em centros urbanos e que estamos captados nesse sistema, eu coloco como ‘bem conviver’, nós precisamos bem conviver com a natureza, reaprender mesmo, pois vemos a natureza como algo longe e distante, vemos a luta pela natureza como algo trivial, que posso deixar para amanhã. É tipo o governo colocando uma agenda do meio ambiente que sabemos que engloba tudo que a gente precisa e que é necessário para alcançar mudanças efetivas.
Vitória – É uma questão crítica mesmo, de não aceitar tudo que nos é dito, e de se ‘redesenvolver’. Por não sabermos a urgência disso, a importância do clima, nossas vidas são ceifadas. A questão de reaprender é fundamental, e às vezes reaprender olhando para trás. Como que meus antepassados indígenas viveram milênios na Amazônia sem destruir a floresta, sem a ajuda de branco nenhum, e ai a gente agora, que estamos com 500 anos de colonização, já estamos chegando em um ponto de crise climática. Será que a gente sabe realmente viver? Será que não precisamos olhar para trás e reaprender com os nossos ancestrais? Esse ponto de questionamento é realmente nesse sentido, de poder olhar e imaginar outras alternativas.
O Brasil está sendo representado na edição deste ano pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, e chega na COP26 com o discurso de aproveitar o espaço para mostrar a todo mundo uma nação que cuida sim das suas florestas, além de focar muito na questão do empreendedorismo, o chamado ‘crescimento verde’. Quais as criticas vocês fariam a abordagem do nosso governo no evento?
Ellen – Eu vou usar uma frase que minha vô sempre me diz: “Menina, você está tapando o sol com a peneira”. Acho que essa frase é autoexplicativa.
Vitória – Para mim é uma cortina de fumaça para o que é o real problema. Quando todo mundo está caminhando em uma direção de evidenciar a crise climática e quanto isso tem impactado já agora, não só as comunidades, mas também as cidades dos nosso países, o Governo Bolsonaro, em detrimento do lucro, o lucro de poucos, prefere prejudicar. E a gente vê uma política que é isso, né? A gente tem falado muito de política de Estado, dessa política partidária, e a polarização burra que não serve aos interesses de nós brasileiros. E ai cria cortina de fumaça para atender outros interesses que não os nossos.
Mahryan – É um governo que nega a existência de uma crise social e uma crise ambiental o tempo todo. Desde que assumiu. Quando falamos de racismo é negado pelo governo, quando falamos de crise climática, super aquecimento do planeta… Então, o que a gente tem hoje é um reflexo desse negacionismo que presenciamos em todos esses meses, todos esses anos do nosso atual governo, do governo Bolsonaro. É o reflexo do negacionismo. Todo mundo está falando de crise climática, estão evidenciando isso como urgência, e nós temos um governo que não aceitava nem que o termo ‘mudanças climáticas’ fosse usado, com relação a ação do homem potencializando esse super aquecimento. O que temos hoje, ainda no Governo Bolsonaro, é uma culpabilização infundada de povos indígenas e organizações que olham pela preservação e pela proteção do meio ambiente, assim como os ativistas, para desviar o foco dessa pauta que é prioritária. Nosso governo também utiliza muitas estratégias de distração, e para um espaço como a COP, para que o Brasil esteja representado, eles trazem uma pauta que não é a mais urgente, e não é a pauta prioritária, como a territorialização dos povos indígenas, a questão da demarcação, do desmatamento e diversas outras. Isso não é abordado. Possuímos duas disputas de narrativas brasileiras nesse espaço, que é a voz do governo, que também é a voz do negacionismo, mas que tenta dialogar com esse sistema internacional para que o Brasil não sai tão queimado. Então, ele não vai chegar na Conferências das Nações Unidas para Clima negando a existência da crise climática, mas ele vai tentar desviar o foco e a voz da sociedade civil. Quer dizer, eu não concordo com o que está acontecendo no Governo Federal, eu quero que o Brasil volte a ser um exemplo de preservação do meio ambiente, eu quero lutar por essas pautas. Então, temos essas duas disputas de narrativas, mas também é sobre o que as meninas falaram, é tampar o sol com a peneira, é sobre uma estratégia de distração política e coisas que eles querem projetar como se o sistema internacional e a própria sociedade civil brasileira não soubessem o que acontece dentro desse território.
Vitória – A Mahryan tocou em um ponto muito importante, que é identificar isso e evidenciar que isso também é uma política intencional. E assim como uma política desenhada para promover alguma mudança, essa intencionalidade também vai gerar um resultado, vai resultar em algo que vai ser danoso. E como medimos esses danos? É a perda de vidas, a perda de territórios… e quando a gente está falando de justiça climática e ambiental, estamos falando de território, de comunidades, de direito das pessoas de ocuparem os espaços, se alimentarem, de ter moradia, de ter acesso a coisas básicas. E como uma política que é feita nesse sentido, é essa política genocida, que não está disposta em prover cidadania, mas sim de fato a prejudicar.
Na sua visão, qual é o assunto mais urgente a ser tratado na COP26? O que merece mais destaque nessa edição?
Amanda – Tem um termo chamado justiça climática. E esse é um dos termos que estão sendo mais discutidos, pois essa COP é a COP dos ativistas, dos ativistas jovens de países periféricos, ou seja, países do sul global. Então, ficar de olho em justiça climática, que é basicamente os países que menos contribuíram para a atual crise são os mais prejudicados, os que menos emitiram gases de efeito estufa são aqueles que estão recebendo os principais eventos climáticos catastróficos. Justiça climática no centro, atrelado – e ai colocamos a nossa causa – racismo ambiental. É importante escurecer o debate climático. Essa agenda não é só de homem branco, rico, privilegiado, que é dono de empresa e tem patrocínio da companhia para oferecer desenhos políticos individuais. Essa agenda climática é coletiva, é uma agenda interdirecional, e quando a gente faz esse debate de uma forma descolonizada, trazendo uma narrativa de jovens pretas, de um país colonizado e periférico, de um país que enfrenta o governo genocida e ecocida, é importante diferenciar essas diferentes narrativas. Resumindo: Justiça climática, racismo ambiental e visibilidade para narrativas decolonizadas, principalmente de jovens pretas de países do sul global, como o Brasil.