Documentário ‘The F Word’ mostra como a quarta onda do feminismo está quebrando tudo

A Internet é um espaço complicado para a maioria das mulheres jovens. Por um lado, é um lugar de frequentes abusos onde vemos corpos de mulheres circulando como objetos, censuradas sem opções, ameaçadas e assediadas violentamente. Apesar disso, a web também cria um campo incrível de criatividade, comunidade, ativismo e inspiração.

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no The Huffington Post por Priscilla Frank

Sendo tanto um espelho que concentra o machismo que existe fora do ambiente virtual como um palco que traz à tona questões pessoais para uma esfera pública, a internet tornou-se um poderoso lugar para o feminismo que fez dela o seu lar.

No seu novo documentário The F Word (“a palavra F”, em português), o diretor Robert Adanto destaca artistas contemporâneas que usam a nova mídia para trazer uma quarta onda feminista para a Internet. Sejam elas promíscuas, puritanas, pró-atletas, estrelas pornôs, viciadas em selfies, devotas cristãs, teoristas, cheerleaders – essas mulheres da quarta geração acreditam que a única escolha verdadeiramente feminista é uma escolha feita livremente pela própria mulher. Então traga esse seu cabelo esvoaçante, esse seu tom de voz, seus decotes e conversas sobre bebês ou qualquer outro hábito tradicionalmente feminino que quiser. Não existe nenhuma vergonha em ser uma mulher mulherzinha ou uma garota toda feminina.

“O feminismo definido por essas mulheres é bem diferente do que você vai ouvir nas notícias”, explicou o diretor Adanto ao The Huffington Post. “Eu acho que nós degradamos essa palavra como cultura. Ela continua sendo a ‘palavra F'”.

Por meio de vídeos, performances, fotografia e uma combinação dos três, as artistas destacadas no filme criam uma arte poderosa por causa, não apesar, de seu gênero. Boa parte disso é conquistado quando elas exploram as dinâmicas do corpo feminino, os papéis de gênero e a sexualidade. Seguindo os passos de rainhas da arte dos anos 60 como Hannah Wilke e Carolee Schneemann, as artistas eliminam as fronteiras entre as suas vidas, os seus corpos e as suas obras.

“Eu queria criar um mosaico de performance feminina”, disse Adanto. “No início eu procurava especificamente no Brooklyn, mas a medida que eu comecei a por tudo em ordem percebi que grande parte da quarta geração está online. Porque eu deveria limitar isso ao Brooklyn se estávamos falando do mundo digital?”

A estrutura do filme recai em algum lugar entre um ensaio e uma exposição com curadoria, de acordo com Adanto. Ele comentou sobre isso quando lhe perguntam se ele se sente desconfortável de ser homem e controlar a narrativa dessas jovens mulheres artistas. “Eu deixo elas explicarem como é o seu trabalho” respondeu Adanto. “Eu faço escolhas, é claro, ao selecionar diversas fotos que ilustram ou reforçam as alegações feitas. Mas eu permito que elas digam o que acreditam e eu apenas coloco tudo isso junto”.

O público-alvo de Adanto é um que aprende sobre o feminismo nas notícias, não em aulas de teoria de gênero. O mesmo acontece com o seu conhecimento de arte contemporânea. “Eu não queria fazer um filme para ter cliques de artistas feministas marginalizadas”, disse ele. “Eu estou defendendo a arte humana. Acho que os seres humanos estão no seu melhor momento quando eles criam significado desde matérias-primas ou de sua imaginação superficial. Eu acho que esse é o nosso mais alto propósito. Mais pessoas deveriam se importar com a arte, mas isso não acontece!”

Abaixo conheça as artistas do documentário The F Word.

1. Narcissister

Narcissister nunca foi vista sem sua máscara de manequim de Barbie. Ela representa inspiradas performances burlescas e sexuais sobre o papel que as mulheres interpretam e, obviamente, também derrubam. “Narcissister não é uma pessoa” disse ela em uma entrevista com a Vice. “É uma máscara plástica animada apenas pela pessoa que a veste. A máscara torna-se um espelho e é bem raro que artistas façam delas mesmas um espelho. É muito mais comum que nós sejamos absorvidas por ela. Dentro de sua subjetividade.”

2. Ann Hirsch

Ann Hirsch é uma artista visual e de performance cuja obra analisa a interseção entre a tecnologia, o sexo e o gênero. A sua peça virtual Twelve(“doze”) que esteve disponível como um app para iPhone até ser censurada e retirada da internet, acompanha a vida de uma garota de 12 anos que começa um relacionamento virtual com um homem de 27 anos através do programa de mensagens instantâneas da AOL.

“Era pior quando eu comecei a peça e não existia nenhum diálogo sobre nada disso”, disse ela em uma entrevista para a New York Magazine. “Tive professores de arte que diziam, ‘Você não deveria estar fazendo isso. Você é mais inteligente do que isso’. Ultimamente a discussão sobre o tema aumentou. Selfie é uma palavra que todo mundo conhece. Nós realmente estamos mudando como vemos o narcisismo e como mostramos isso e o seu significado e há mais interesse nisso, especialmente no mundo da arte”.

3. RAFiA Santana

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RAFIA SANTANA, SEE THROUGH (2015)
RAFia Santana cria autorretratos com aspecto de sonho centrados na cultura afro que transformam uma selfie de um estado de auto registro banal para uma forma de transcendência cósmica.

“Qualquer pessoa que acha os selfies apenas uma questão de vaidade quer reduzir a importância do ser humano. Eu não sei bem de onde vem o julgamento”, disse ela em uma entrevista anterior ao HuffPost. Nós todos deveríamos refletir sobre quem somos seja quando estamos bem ou quando estamos mal. Os selfies nos ajudam a trazer o lado ruim para fora e nos elevar, nos conectando com outras pessoas”.

4. Kate Durbin

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Kate Durbin é uma artista e escritora de performance cujo trabalho funciona como ponte que une o privado e o público, o pessoal e o político, especialmente por pertencer à feminilidade. A sua série Cloud 9 (“nuvem nove”) convida artistas que se identificam com as causas femininas a confessarem as coisas mais estranhas que elas já fizeram por dinheiro para sustentar as suas carreiras na arte.

Ela explicou ao HuffPost: “Eu comecei a notar que tudo no mundo ao meu redor tinha alguma coisa a ver com a arte e o dinheiro e comecei a prestar atenção a isso em vez de ignorar – em vez de acreditar na fantasia que esses eram todos ‘indivíduos fracassados’ e que nenhuma dessas pessoas eram artistas ‘suficientemente bons’ para dar certo”.

5. Rebecca Goyette

Rebecca Goyette é uma artista multidisciplinar cuja obra centrada no sexo explora a fantasia, o lado perverso e queer e o tabu. Através de seu alter-ego, Lobsta Girl, Goyette faz parte de uma deliciosamente bizarra lagosta pornô que brinca com a dinâmica do poder, os papéis não-normativos e a psicologia do desejo.

“Eu me inspiro no que eu vejo que é bem estruturado e conservador na arte, eu me inspiro nisso, eu também me inspiro com a história”, disse ela à Posture Mag. “Estou ficando cada vez mais ligada a história Puritana. Eu gosto de muito de ler não-ficção”.

6. Sadaf

Sadaf é uma DJ e artista multimídia que atua entre as linguagens experimentais no estilo ‘DIY’ (faça-você-mesmo, em português) e de celebridade popular. Como ela explicou ao The Quietus: “Eu acho que até o momento culturalmente falando nós estamos em um ponto onde estar confinado a um gênero é algo conservador na minha opinião! Seja isso no âmbito experimental ou no âmbito pop. Eu realmente queria desafiar o que esses dois gêneros representam e misturá-los um pouco”.

7. Leah Schrager

8. Rachel Mason

Rachel Mason é uma artista multidisciplinar cuja recente opera-rock experimental The Lives of Hamilton Fish (“as vidas de Hamilton Fish”) foi inspirada por uma manchete de jornal de 1936 em que dois homens chamados Hamilton Fish tinham sido declarados mortos. Um era um político e o outro um assassino em série de crianças. “No decorrer de quase meia década eu imaginei como esses dois homens poderiam ter se conhecido e tramei uma história imaginária que me levou a uma jornada a lugares que incluem o Museu Sing Sing Prison e a Sociedade Americana de Pesquisa Psíquica”, disse ela ao AnimalNY.

9 e 10. Go!PushPops (Elisa Garcia de la Huerta e Katie Cercone)

Go!PushPops é uma forma de arte coletiva feminista radical e queer transnacional que usa o corpo feminino como uma forma de resistência e celebração. Lideradas por Elisa Garcia de la Huerta e Katie Cercone, a comunidade do sexo positivo abraça influências incomuns como a ioga, o xamanismo, a bruxaria e o hip hop. Este verão, o coletivo organizou Orações com Feministas na Praia de Babylon, um ritual de mulheres topless que não teve falta de cânticos, infusões de ervas e “condução de milagres sagrados”.

11. Damali Abrams

Damali Abrams é uma artista visual cujo trabalho incorpora os elementos de performance e colagem. O seu contínuo trabalho de ficção na rede televisiva “Self-Help TV” (“TV de Autoajuda”, em tradução livre) pega emprestada a linguagem dominante de autoajuda e auto-aperfeiçoamento ao mesmo tempo que está atenta como a questão racial, de classe, a história pessoal e outros elementos podem afetar o bem-estar das pessoas.

“A colaboração é realmente uma incrível maneira de aprender sobre a arte e sobre mim mesma” disse ela em uma entrevista ao Delve. “Eu aprendi tanto de todos com quem colaborei. Penso que a lição mais valiosa é manter a mente aberta assim como um coração aberto e realmente usar a oportunidade para sair da minha zona de conforto e tentar coisas novas”.

12. Claudia Bitran

Bitran é uma artista multidisciplinar cuja obra de cultura pop se une a um grupo de fãs obsessivos com um gosto pelo estranho. Para a sua série “Britney” Bitran recria os vídeos icônicos da Britney Spears, renderizando um conjunto de cópias feitas por ela mesmo, inclusive uma coreografia perfeitamente decorada.

13. Faith Holland

Faith Holland é uma artista multidisciplinar cujo trabalho analisa temas como a beleza, a pornografia, os gatos e a Internet. Sua série Porn Interventions (“intervenção pornográfica”) é uma coleção de vídeos feitos para um site pornô, o RedTube, nos quais Holland emprega e subverte teorias pornográficas para produzir a uma mistura de excitação, frustração e absurdo.

“Minha relação com a pornografia está sempre evoluindo” disse ela ao AQNB“particularmente por estar procurando TANTO por esses projetos. Nunca fui contra a pornografia e para mim esse é um fator realmente importante quando considero a minha obra. Mas eu percebo falhas na pornografia – na sua homogeneidade, na produção que atinge o público masculino, o seu privilégio do corpo de mulheres magras e brancas e a fetichização de todos os outros corpos. Então eu tento intervir em alguns desses problemas através do meu trabalho para abrir um diálogo sobre os preconceitos na pornografia e o potencial para termos um pornô melhor. Foi feito com o intuito de ser uma crítica amorosa”.

 14. Michelle Marie Charles

Michelle Charles é uma artista visual cujos vídeos pegajosos e falhos parodiam os vídeos musicais de hip hop. Charles mesma interpreta vários papéis, dessa forma subvertendo o espaço objetificado reservado para as mulheres negras em vídeos de rap. Letras como “Girl, I love you so / for all your emotional attributes such as your titties” (“Garotas, eu adoro vocês / com todos os seus atributos emocionais como as suas tetinhas”, em tradução livre) iluminam as armadilhas do gênero de uma forma crítica e ao mesmo tempo amorosa.

(Tradução: Simone Palma)

Este artigo foi originalmente publicado pelo HuffPost US e traduzido do inglês.

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