Estampar a graça – Por Fernanda Pompeu

Cronistas batem perna. Mesmo quando trancados em casa não se esquecem da rua. Pois é nela que a vida trota suas mesmices e surpresas. Semana passada, num footing pela Vila Madalena, dei de cara com um carimbo grafitado no tapume de um prédio em ascensão.

O grafite comunicava: Você praça, acho graça. Você prédio, acho tédio. É claro que sorri. De forma dupla. Primeiro, pela delícia da mensagem colorida e afiada. Segundo, por entender que se trata de uma utopia. Afinal, como tantos outros bairros de Sampa, a Vila se verticaliza. E, perdão pela rima chinfrim, vertiginosamente.

Caiem uma a uma as casinhas de construção e inspiração portuguesas. Sobem prédios com o valor do metro quadrado na lua. Riem os bancos e os juros. É o mercado! Mas o grafite continua tendo razão. Vai-se a graça, instala-se o tédio.
Choram cinquentões e sessentões. Em breve, a Madalena não será mais a mesma. Quer dizer, ela já não é. Por exemplo, as famílias mais pobres se foram. Para mais longe. O pãozinho da padoca, frutas e verduras da quitanda se tornaram bem mais caros.

Ocupando os antigos lugares veio uma classe média boa de consumo e renda. Onde antes víamos varandinhas com antúrios e imagem de santo, agora vemos sinistros portões escondendo moradores e seus carrões. Também aumenta o número de vigilantes, assustados e meliantes.

Quem está reivindicando a graça da praça e refutando o tédio dos prédios é a juventude. Gente no energético intervalo entre vinte e trinta anos. Eles não querem saber das razões do capital. Da velha lei da oferta e da procura. Parecem bradar: Nem Karl Marx, nem Wall Street.

É uma gente com o pensamento em movimento. Acreditam no progresso com responsabilidade. No dinheiro com honestidade. Clamam por áreas mais coletivas. Querem o verde afugentando o cinza. Tenho dúvidas que eles consigam deter com poesia a força bruta da grana.

Mas os saúdo! Guerreiros da beleza. Como eles, penso que o estampado é mais alegre que o cimento liso. Que pode haver um caminho do meio, no qual viver seja muito mais do que possuir e ostentar.

Por: Fernanda Pompeu

 

Leia Também:

Colunistas 

 

Fonte: Yahoo

+ sobre o tema

É bem-vinda, e algo tardia, a preocupação de Lula com a inflação dos alimentos

Convém a Luiz Inácio Lula da Silva lembrar que foi levado,...

Trump suspende participação dos EUA no Conselho de Direitos Humanos da ONU

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou nesta...

Fim do trabalho escravo exige novas políticas, dizem especialistas

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) admite que...

Políticas antidiversidade nos EUA reacendem o alerta no Brasil

Não é mais ameaça ou especulação do campo progressista,...

para lembrar

Manifesto pela efetiva autonomia da Defensoria Pública: Derrubada do veto ao PLP nº 114/11

A Articulação Fórum Justiça e outras entidades e organizações...

Doações Emergências para o Fundo Baobá

Ajude o Fundo Baobá a manter aberto, enquanto for...

A revolta é contra o aumento das passagens, mas o movimento é outro

Na quinta-feira (6)  presenciei parte do conflito entre os...

Câmara aprova royalties do petróleo para educação e saúde

  Com a conclusão da votação, o projeto segue agora...

Protesto contra a extrema direita leva 160 mil às ruas de Berlim

"Nein, Friedrich", dizia de forma direta o cartaz. Em um fim de semana de protestos na Alemanha, o alvo preferido dos manifestantes foi Friedrich Merz, o...

Milhares protestam a favor da diversidade na Argentina

Milhares de pessoas se manifestaram neste sábado em Buenos Aires, na Argentina, em defesa da diversidade e contra o presidente Javier Milei, economista e líder da ultradireita...

Trabalho escravo: mais de 2 mil foram resgatados no Brasil em 2024

O Ministério do Trabalho e Emprego realizou, ao longo de todo o ano de 2024, 1.035 ações fiscais de combate ao trabalho análogo à...
-+=