Festival Latinidades debate a exposição da cultura negra pela internet

A internet como território de diálogo e resistência foi o tema discutido hoje (23) no Festival Latinidades, em Brasília. O Festival Latinidades, criado em 2008 para comemorar o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, é o maior festival de mulheres negras da América Latina. O evento começou ontem (22) em Brasília e vai até domingo (26).

Segundo participantes do evento, a internet, muitas vezes usada como um espaço de perpetuação do racismo, vem sendo apropriada como ferramenta de luta e articulação. Na opinião da artista plástica e cineasta independente Everlane Moraes, o grande desafio é se apropriar da tecnologia para produzir conteúdos que ajudem no fortalecimento da autoestima negra. “Temos que trabalhar com a memória, o imaginário e a melancolia do período colonial. Temos que ter consciência da negritude e lutar por espaços na TV e na internet, espaços de reivindicação política”, afirmou Everlane.

A atriz carioca Kênia Maria, criadora do canal Tá bom pra você?, do YouTube, comentou a importância da família na luta pela afirmação negra. Ela disse que os vídeos que produz sobre a cultura negra surgiram a partir do desconforto de sua filha mais nova que, aos 13 anos, começou a perceber o racismo e a questionar a atitude das pessoas em relação aos negros. “Ela era a única negra da sala de aula e estava sofrendo quando decidiu parar de alisar os cabelos. Eu estava dando todas as armas para que ela se reconhecesse e resgatasse a autoestima. Dai surgiu a ideia do canal, para debochar do racismo”, afirmou.

Militando contra o preconceito desde criança, Mestre TC, músico e fundador da Casa de Cultura Tainã, instituição da Rede Mocambos, disse que trabalha com o desenvolvimento de uma rede, feita a partir de softwares livres e destinada a dar mais visibilidade aos conteúdos que produz. “A internet é um território que temos que ocupar com os quilombos, as favelas, os terreiros… Ter domínio sobre este espaço para se descolonizar e pensar de forma independente”, afirmou. A iniciativa, que promove a comunicação entre mais de 200 comunidades quilombolas, visa a dar mais acesso aos usuários, levar conectividade a lugares distantes e colaborar com a produção e difusão de conteúdos feitos por essas populações.

“Não existe história do Brasil sem o negro”, afirmou Dom Filó, o criador do Cultne, o maior acervo digital de cultura negra do país. Ele disse que começou a fotografar festas negras no Rio de Janeiro na década de 1970. Na década seguinte, após conseguir uma câmera VHS, começou a produzir material audiovisual. Todo o acervo, mais de 3 mil horas, está sendo digitalizado. Atualmente estão disponíveis na internet 300 horas, com mais de 6 milhões de visualizações. “A história está presente nesse acervo. A história do negro no Brasil é invisível, aprendemos pouco nas escolas. Quando a gente vê, a gente consegue entender um pouco melhor.”

Segundo Everlane Moraes, a internet não cria o racismo, ela é só um meio de difusão dos preconceitos. “A gente precisa de formação, saber filmar bem, publicar os conteúdos de forma qualificada, para que não chegue ao receptor com ruídos. Podemos usar usar o audiovisual nas redes para expressar nossas ideias”, afirmou.

Além de sessão de curtas e de mesas de debate, a programação do festival conta com diversos shows. Hoje, às 18h30, haverá apresentação da orquestra de berimbaus e, às 21h30, show do Folakemi Quinteto. Todas as atrações do evento são no Cine Brasília.

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