Hamilton Naki nasceu em 26 de junho de 1926, de uma família negra e pobre em uma pequena aldeia do estado de Cabo do Leste, na África do Sul, de nome Ngcingane. Lá, ele completou seu curso primário. Com 14 anos, foi à procura de trabalho na Cidade do Cabo, arranjando emprego de jardineiro na Universidade da Cidade do Cabo.
Poucos anos depois, passou a trabalhar cuidando dos animais cobaias do laboratório. Curioso e com vontade de aprender, transformou-se num faz tudo da clínica cirúrgica e foi se envolvendo nos procedimentos cirúrgicos em animais, incluindo suturas, anestesias e cuidados pós-operatórios. Apesar da sua carência de estudos formais, sua técnica e capacidade foram reconhecidas por Dr. Christiaan Barnard (primeiro médico a realizar um transplante de coração bem sucedido), que o requisitou para a sua equipe. Anos depois, Barnard teria dito: “se dada oportunidade, o Sr Hamilton Naki poderia ter sido melhor cirurgião que eu”. Durante o trabalho com Dr. Barnard, Naki se converteu em técnico de laboratório de pesquisa da Faculdade de Medicina, recebendo, assim, permissão especial para continuar suas pesquisas em cirurgia experimental, incluindo transplantes. Ele ensinava os estudantes de medicina e médicos recém-formados, técnicas cirúrgicas, embora nunca pudesse ter trabalhado como médico de humanos por causa das leis racistas do apartheid.
Há controvérsia sobre sua participação no primeiro transplante de coração bem sucedido entre seres humanos, feito em 3 de dezembro de 1967, quando foi retirado o coração de Denise Darvall, doadora do coração transplantado para Louis Washanky. O transplante foi realizado no Groote Schuur Hospital, na África do Sul. Por não ter diploma, ele não poderia ter participado da cirurgia, e, por ser negro, não poderia ter contato com pacientes brancos, a não ser como “médico clandestino”. Ele também não podia aparecer nas fotografias da equipe e, quando por acaso foi fotografado, foi identificado pela direção da faculdade como um simples faxineiro. Mas, mesmo registrado nos documentos do hospital como faxineiro e jardineiro, Naki recebia salário de técnico de laboratório, o mais alto do hospital para alguém sem diploma. Vivia em casebre de um quarto numa favela da periferia sem saneamento ou energia elétrica.
Naki se aposentou em 1991, e, após quatro décadas de trabalho na Faculdade de Medicina, passou a receber o salário de jardineiro, cerca de 280 dólares, muito inferior ao de técnico de laboratório. Ele conseguiu doações de seus ex-alunos e continuou trabalhando como cirurgião em um ônibus adaptado como clínica móvel. Na época, o Dr. Barnard disse sobre Naki: “Foi um dos maiores pesquisadores de todos os tempos no campo dos transplantes de coração”.
O fim do apartheid ocorreu em 1994, com a eleição de Nelson Mandela para a presidência da África do Sul. Em 2002, como reconhecimento pelo seu trabalho, Naki foi condecorado com a Ordem Nacional de Mapungubwe, mais alta honraria por contribuição à ciência médica. Em 2003, recebeu um diploma honorário em medicina pela Universidade da Cidade do Cabo.
Com o reconhecimento adquirido após o término do apartheid, Naki se tornou famoso mundialmente, mas nunca se lastimou pelas injustiças sofridas. Em um determinado momento, em entrevista, confirmou sua participação no primeiro transplante de coração: ele teria extraído o coração da doadora. No entanto, não há quaisquer referências e registros “oficiais” sobre o fato. A história desse transplante pioneiro atribui a Marius Barnard (irmão de Christiaan) e Teray O’Donovan a captação do órgão da doadora.
Naki morreu em 29 de maio de 2005, aos 78 anos, em sua casa na cidade de Langa, próximo à Cidade do Cabo.
Em 2008, foi lançado o filme HIDDEN HEART:Hamilton Naki and Christiaan Barnard- A verdadeira história do primeiro transplante de coração. Direção de Cristina Karrer e Werner Schweizer. (www.hidden-heart.com).