Cantora registrou ocorrência, e polícia já identificou mais de cem perfis de suspeitos de cometer o crime
por Giselle Ouchana no O Globo
A cantora Preta Gil é a vítima mais recente de ofensas e ataques racistas pela internet. Ontem, após receber dezenas de mensagens preconceituosas pelas redes sociais, ela registrou uma ocorrência na Delegacia de Repressão a Crimes de Informática (DRCI). A especializada já identificou mais de cem perfis no Facebook que podem ter ligação com o crime.
Preta chegou à delegacia visivelmente abalada. Acompanhada do marido, ela prestou depoimento por aproximadamente uma hora. Depois, emocionada, disse que recebeu as mensagens anteontem, por meio de sua página no Facebook.
— Contei para a delegada como eu fiquei ciente dos ataques. Ontem à noite entrei na minha página e vi uma série de ofensas à minha pessoa. Xingamentos, muitos ataques racistas, me chamando de macaca, (dizendo) que eu tinha que voltar para a senzala. Coisas absurdas, que me chocaram. Fique muito nervosa e decidi vir denunciar — disse, acompanhada dos empresários e do marido.
À polícia, Preta relatou ainda que todas as mensagens tinham uma mesma hashtag, como se aquela fosse a assinatura de um grupo. A cantora afirmou ainda que não é a primeira vez que recebe ofensas pela internet.
ASSINATURA COMUM
— É um grupo que assina os xingamentos com uma hashtag. Falam: “Agora você vai ter que nos aturar”. São coisas horrorosas. De uma certa forma, convivo com os haters (pessoas que não gostam dela), mas nunca foi tão grave, nunca foi tão organizado, um monte de uma vez só, de uma maneira tão agressiva — relatou.
Ela contou ter observado que a maioria das publicações foi feita por jovens:
— Isso me deixa mais triste, mais preocupada, porque a gente vê a violência que está instaurada no mundo e como as redes sociais podem ser usadas de uma maneira tão equivocada pelos jovens; para eles se reunirem e atacarem pessoas — concluiu.
Preta vai enviar à delegacia uma série de endereços de perfis, os quais fizeram as declarações de ódio. A polícia vai pedir a quebra de sigilo desses endereços, e fará uma investigação para saber se o grupo criminoso que agiu contra a cantora é o mesmo que fez ataques racistas à atriz Tais Araújo.
Os criminosos serão indiciados por injúria por preconceito e podem ficar de um a três anos na prisão. A pena, no entanto, pode ser aumentada em caso se avanço nas investigações.
LISTA DE PERFIS
Preta vai enviar à DRCI endereços de perfis que fizeram as declarações de ódio, e a polícia vai pedir a quebra de sigilo deles. Os investigadores querem saber se os criminosos que agiram contra a cantora são os mesmos que fizeram ataques racistas à atriz Tais Araújo recentemente, já que a hashtag usada nos dois casos foi a mesma.
— A página usada para os ataques à atriz foi extinta. No entanto, é possível que seja o mesmo grupo, já que os integrantes podem ter criado uma nova conta. Vamos cruzar os dados para saber se há, efetivamente, alguma ligação — explicou a delegada assistente da DRCI, Fernanda Fernandes.
Os responsáveis serão indiciados pelo crime de injúria por preconceito e poderão ficar de um a três anos na prisão. A pena pode ser aumentada, dependendo do resultado das investigações.
Ao deixar a delegacia, a cantora acrescentou que decidiu fazer a denúncia para incentivar todas as vítimas de crimes deste tipo a registrarem ocorrência:
— A impressão que eu tenho é que (os criminosos) são pessoas muito carentes, com problemas psicológicos sérios, que precisam chamar atenção. É preciso correr atrás dos nossos direitos. Eu vim principalmente para incentivar qualquer pessoa que sofra isso no dia a dia, não só virtualmente, a entender que racismo é crime e que temos que denunciá-lo para que a sociedade evolua.
DESABAFO NA REDE
Em seu perfil no Facebook, a cantora fez um desabafo: “Ontem fui atacada com diversas mensagens de ódio em minha página no Facebook; uns atacaram minha cor, meu trabalho, meu corpo, outros tentando fazer piadas de péssimo gosto apenas para tentar me diminuir ou magoar, eles assinaram todos os posts com uma #, agiram em bando. São organizados e cruéis. Saibam esse tipo de ataque só me fortalece, eu conheço o meu valor”.
Na postagem, a cantora também diz que, desde muito nova, conviveu com o preconceito de “quem não aceitava ver filho de negro em uma escola particular, de quem não consegue aceitar que uma pessoa pode se chamar Preta”. E afirmou que os agressores usam imagens falsas em seus perfis, para não serem reconhecidos. “São covardes, são pessoas vis. Não sei quem são. Será que eu deveria não dar atenção ou querer me preocupar com isso? Não! Vou me defender em meu nome e no de quem mais se sentiu ultrajado com essa verdadeira doença social. Essa epidemiade desamor e ódioque se alastra e atinge a todos”.