A programação de setembro na plataforma de streaming Itaú Cultural Play começa com a segunda temporada de Trajetórias, série dedicada à carreira e à contribuição de personalidades brasileiras para as artes e a cultura do país. Cada sexta-feira, de 8 de setembro a 6 de outubro, sobem para o catálogo dois episódios com entrevistas dos 10 vencedores do Prêmio Milú Villela – Itaú Cultural 35 anos, em uma produção elaborada pelo IC e dirigida por Murilo Alvesso.
A data dessa estreia celebra o aniversário de Milú Villela, presidente da instituição de 2001 a 2019, e começa com duas mulheres fundamentais para a arte e a cultura brasileiras: a poeta e pesquisadora Leda Maria Martins e a atriz Léa Garcia (março 1933-agosto 2023). O acesso para a série na IC Play é gratuito e pode ser feito via site www.itauculturalplay.com.br e dispositivos móveis Android e IOS.
“As 10 personalidades que compõem esta série receberam o Prêmio Milú Villela por serem figuras referenciais no cenário artístico brasileiro, dentro das categorias aprender, criar, experimentar, inspirar e mobilizar”, observa Eduardo Saron, presidente da Fundação Itaú. “Ao apresentá-las neste conjunto de mini docs, procuramos expandir o objetivo do prêmio reverenciando suas trajetórias longevas e definitivas na construção e transformação da nossa cultura, ajudando a refletir e discutir o Brasil contemporâneo e desenhar futuros”, completa.
Leda
Com importante participação na pesquisa e construção da história do teatro contemporâneo brasileiro e do pensamento decolonial, neste primeiro episódio da nova temporada de Trajetórias Leda Maria Martins – premiada na categoria “aprender” –, narra sua trajetória do Rio de Janeiro para Minas Gerais, passando por importantes universidades estrangeiras. A tradição afro-brasileira, a poesia e vontade de aprender são marcas de sua trajetória.
Leda é professora, doutora, escritora, teatróloga e vem traçando uma trajetória de destaque na academia, passando por instituições de ensino em Minas Gerais, Nova York e Rio de Janeiro, da posição de aluna à chefia de departamentos. Atuou também no teatro e possui bibliografia com livros, de poesia e ensaios, publicados em português e traduzidos para o inglês e o espanhol.
Ela também carrega o título de rainha de Nossa Senhora das Mercês, da Irmandade Nossa Senhora do Rosário do Jatobá, em Belo Horizonte (MG), com a qual convive há décadas. Sua mãe, Alzira Germana Martins (1930-2005), era rainha; ela, princesa – durante um tempo, distanciou-se do núcleo real, dedicando-se aos estudos fora do Brasil –, depois coroada rainha com a morte da mãe.
No livro Afrografias da memória: o Reinado do Rosário no Jatobá (1997), ela conta a história dessa irmandade em que reina e, por consequência, da tradição dos congados e de outras festas tradicionais em que escravizados realizavam coroações de seus reis, instituindo uma hierarquia do poder africano a partir de uma estrutura mítica – refazendo a história por outro olhar, um olhar ancestral.
Sua obra acadêmica e seu pensamento são indispensáveis na investigação do teatro contemporâneo e na percepção da cultura no Brasil, como as obras que escreveu sobre Qorpo Santo (José Joaquim de Campos Leão, 1829-1883) e Abdias do Nascimento (1914-2011). Sua atuação no campo do teatro a fez também dar nome ao Prêmio Leda Maria Martins de Artes Cênicas Negras de Belo Horizonte, com cinco edições e cujas categorias refletem conceitos de seu pensamento.
Com sua poética e pesquisas meticulosa, ela criou conceitos que ultrapassam o campo das artes das cenas e norteiam um modo de pensar para além do eurocentrismo. Entre eles estão a encruzilhada (um espaço místico de encontro de caminhos governado pelo tranca-ruas), a oralitura (um modo de analisar a transmissão de mensagens, histórias e saberes pela oralidade e outras formas de falar, sem palavras, o que muitas vezes não é permitido, como a música, a dança e os ritos) e o tempo espiralar (uma maneira de olhar o tempo à luz de conceitos bantos que dialogam diretamente com a física moderna e nos mostram que o tempo não é linear).
Léa
Léa Lucas Garcia de Aguilar morreu no passado dia 15 de agosto de 2023, em Gramado, no Rio Grande do Sul, quando seria homenageada no Festival de Cinema da cidade por sua carreia. Por sete décadas, a atriz atuou no teatro, cinema e na TV brasileiros. Sua trajetória reflete a história das artes dramáticas nacionais e como as diferenças raciais são determinantes em nosso país. Ela recebeu o prêmio Milú Villela na categoria “criar”.
Com seu talento, conquistou espaço, trabalhos e fama, mas sua atuação, em geral, esteve restrita a um recorte pré-estabelecido do que podem ser os personagens negros. Essa situação se transformou nos anos 2000, com a ascensão de diretores e realizadores pretos, que passaram a dar vida a projetos com mais equidade. Léa sempre teve consciência de sua cor e agiu em prol desse ativismo.
Sua estreia se deu no grupo Teatro Negro Experimental (TEN), em 1952, com Abdias do Nascimento. A primeira personagem no cinema, Serafina (em Orfeu negro, de 1959, dirigido por Marcel Camus), fez dela a primeira brasileira a concorrer ao Prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes, na França. Tinha 24 anos. Circulou nas rodas do cinema mundial vestindo Dior e sendo cortejada por atores como Sidney Portier (EUA, 1927-2022), mas não se dobrou aos deslumbramentos.
A popularidade veio em 1976 na novela Escrava Isaura [de Gilberto Braga (1945)], encarnando a vilã Rosa. A partir daí, começou a ser conhecida por alterar textos e abordagens que reproduziam o racismo estrutural. Fez isso também interpretando a professora Leila, na novela Marina , de 1980, dirigida por Herval Rossano (1935-2007), ao dar uma aula sobre quem foi Zumbi dos Palmares (1655-1695), sem subterfúgios históricos conservadores.
Suas atuações memoráveis são diversas – no teatro, por exemplo, fez Josephine Backer (1906-1975) em Piaf – a vida de uma estrela da canção, em 1983, com Bibi Ferreira (1922-2019), e participou da histórica montagem de A missa dos quilombos, em 1988, com direção de João das Neves (1935-2018). No cinema, ao lado da amiga Ruth de Souza (1921-2019), foi uma das protagonistas de Filhas do vento, em 2004, com direção de Joel Zito Araújo, pelo qual dividiu com Ruth o Kikito de Melhor Atriz do Festival de Gramado. Foi também Jerusa em Um dia com Jerusa (Viviane Ferreira, 2018), rodado com uma equipe composta quase exclusivamente de mulheres negras.
Trajetórias
A série estreou na Itaú Cultural Play em junho do ano passado. Também com produção do IC, mas sob direção de Tobias Rodil, a série de dez episódios abordou temas como arte-educação, artes visuais, música, dança, patrimônio, meio ambiente, questões raciais, movimentos sociais e desenvolvimento sustentável.
As entrevistas foram realizadas com personagens que protagonizam, defendem e discutem a cultura brasileira, entre elas o xamã e líder político ianomâmi Davi Kopenawa, a coreógrafa Lia Rodrigues, a filósofa Sueli Carneiro, a ativista Eliana Souza Silva, o músico Hermeto Pascoal e a educadora Ana Mae Barbosa.
Veja abaixo as datas de apresentação dos episódios 3 a 10 e quais são as personalidades entrevistadas.
SERVIÇO:
Série Trajetórias
Segunda temporada
Em: www.itauculturalplay.com.br
Produção: Itaú Cultural
Direção: Murilo Alvesso
Gratuito
EP. 1 – Leda Maria Martins e EP. 2 – Léa Garcia
Estreia: Sexta-feira, 8 de setembro.
Classificação indicativa: Livre
EP. 3 – Ói Nóis Aqui Traveiz e EP. 4 – Claudia Andujar
Estreia: Sexta-feira, 15 de setembro.
Classificação indicativa
EP.3: Para maiores de 10 anos (Temas sensíveis e violência)
EP. 4: Livre
EP. 5 – Cátia de França e EP. 6 – Danilo Santos Miranda
Estreia: Sexta-feira, 22 de setembro.
Classificação indicativa
EP.5: Para maiores de 10 anos (Droga lícita)
EP. 6: Livre
EP. 7 – Nego Bispo e EP. 8 – Inaycira Falcão
Estreia: Sexta-feira, 29 de setembro.
Classificação indicativa: Livre
Livre
EP. 9 – Marcos Terena e EP. 10 – Neon Cunha
Estreia: Sexta-feira, 6 de outubro.
Classificação indicativa
EP.9: Livre
EP. 10: Para maiores de 12 anos (Temas sensíveis e violência)