“Se uma pessoa perde duas horas por dia para ir e voltar do trabalho, em cinco dias por semana, ela perde 480 horas ao ano. Considerando que o salário de uma pessoa é de R$ 5/hora ou R$ 880/mês, o custo social por pessoa será de R$ 2.400/ano sem o custo da passagem e o custo ambiental” (Halan Moreira, da Associação Brasileira de Monotrilhos e do Consórcio Floripa em Movimento, em 9.4.2013, em entrevista para a coluna de César Borges, no jornal “Notisul”).
Por: Fátima Oliveira
A constatação acima mostra a crueldade das dificuldades à mobilidade urbana nas metrópoles e facilita a reflexão sobre o Movimento Passe Livre (MPL), o mentor das manifestações pelo Brasil afora e na cidade de São Paulo, em junho de 2013 (dias 6, 7, 11, 13 e 17): uma reação ao aumento consensuado das tarifas de ônibus da prefeitura de Sampa, além das de trens e metrô, a cargo do governo estadual.
O último 13 de junho foi estarrecedor. Um massacre policial a mando do governador Alckmin, numa cidade governada pelo PT, cuja vice é Nádia Campeão, do PCdoB, na data, prefeita em exercício. E eu, que a tenho como amiga pessoal, chorei pelo seu silêncio, que eu não esperava e não compreendo.
O MPL é uma incógnita para a maioria das pessoas comuns. Mas não só. Estão rindo pelos botecos de o prefeito Haddad ter tomado um susto ao ver que um dos líderes das mobilizações “tinha idade (e aparência frágil) para ser colega da sua filha”. Há quem diga que nem os serviços de inteligência dos governos sabem ao certo o que é o MPL: “Até a semana passada, o Palácio do Planalto pouco sabia sobre o MPL”. Será?
Sabiam, mas subestimaram. O que revela o quanto os movimentos sociais são desconsiderados hoje, à direita e à esquerda, além da facilidade que têm para criminalizá-los. Da direita é o esperado, mas da esquerda é burrice política não sentir o pulsar das ruas. Uma subestimação tosca, gerada pelo sonho equivocado de que o PT no governo é o povo no poder. No capitalismo, governo é governo, e povo é povo, mesmo reconhecendo que nosso país em muito mudou para melhor sob os governos do PT. Não nego os avanços, ao contrário: eu os defendo, sem carneirice política.
Muita gente que ataca quem diz que algo não vai bem ou reivindica mais empenho na resolução dos problemas sociais não tem lastro para entender sequer as bases teóricas do MPL: a tarifa zero; muitos nunca amassaram barro; grande parte nunca andou de ônibus ou qualquer outro transporte público (nada público, sempre foi pago por quem o utiliza!). Uns diziam que a moçada do MPL era ligada ao PSDB, filhotes do “Cansei”. Setores da grande imprensa, quando “acordaram”, pareciam ter descoberto a pólvora, a exemplo de Josias de Souza, que escreveu em seu blog, cheio de candura: “Ocupa as ruas de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro com o apoio de pelo menos três partidos: o esquerdista PSOL e os ultraesquerdistas PSTU e PCO” (“Movimento ‘apartidário’ é apoiado por partidos”, 15.6.2013). E daí, qual é o crime?
Ainda não sei muito sobre o MPL, mas estou matutando sobre ele, buscando informações, tentando ler nas entrelinhas, mas, como entusiasta da tarifa zero, ideia bem-trabalhada no Brasil pelo engenheiro Lúcio Gregori, secretário municipal de Transportes do governo Luiza Erundina, rendo deferências à legitimidade do MPL, muito pela declaração de Marcelo Pomar, um dos fundadores do grupo: “O Lúcio foi o responsável por dar um subsídio teórico ao movimento. Suas ideias levaram um movimento que reivindicava o passe livre estudantil a se tornar um movimento pelo direito à cidade. Ele abriu horizontes”.
Fonte: O Tempo