Ollie Johnson, cientista político: ‘O racismo segue vivo e perigoso no Brasil e nos EUA’

Professor de Estudos Afroamericanos na Wayne University (Detroit) esteve no Rio para pesquisa e para falar sobre o Partido dos Panteras Negras, em seminário na UFRJ

por Sérgio Luz no Globo

“Nasci e cresci em Atlantic City, Nova Jersey. Eu me graduei em Estudos Afroamericanos e Relações Internacionais na Brown University, onde estudei português. Vim para cá e me apaixonei pelo país. Fiz mestrado em estudos brasileiros e fui à Berkley, para mestrado e doutorado em Políticas Sociais.”

Conte algo que não sei

Os EUA, infelizmente, são um dos principais patrocinadores do terrorismo no mundo. Fizeram intervenções em muitos países em sua história. E isso continua acontecendo. Centenas de milhares de pessoas foram mortas no Iraque, no Afeganistão, no Oriente Médio. E a maioria eram inocentes. É um crime terrível, pelo qual os EUA não se desculparam ou se responsabilizaram. Houve muitas violações dos direitos humanos. E isso é exatamente sobre o que os Panteras Negras falavam há 50 anos, durante a Guerra do Vietnã, quando milhões de vietnamitas perderam suas vidas. Eles nunca representaram ameaça alguma ao governo ou à população americana. Há 50 anos era a Guerra Fria. Agora é a Guerra ao Terrorismo.

Qual o legado dos Panteras Negras?

Os Panteras Negras formavam a liderança do movimento Black Power, entre os anos 1960 e 1970. O movimento dos direitos civis foi um pouco anterior, entre as décadas de 1950 e 1960. Ambos foram importantes na luta de libertação dos negros americanos. Os afroamericanos merecem ser livres politicamente, economicamente e socialmente. E muito veio graças à política de não violência ligada ao reverendo Martin Luther King Jr. O principal legado é de coragem, força e crítica à legitimidade do sistema político americano, que não era justo ou correto. Mostraram que a brutalidade policial e a pobreza não podiam ser realidades para as comunidades afroamericanas. É um legado muito poderoso.

O que mudou na questão do racismo desde os anos 1960?

Infelizmente, o racismo segue bem vivo e perigoso no Brasil e nos EUA. Mesmo que tenha acontecido uma melhora social, a supremacia branca ainda está presente em todas as instituições. Você vê isso na reação policial. Mesmo que estejam integradas racialmente, as forças policiais seguem com a mentalidade enraizada de que jovens afroamericanos representam um perigo maior. E isso ocorre mesmo durante o governo de um presidente negro, com uma família afroamericana residindo na Casa Branca. Os índices sociais e econômicos apontam e confirmam que a desigualdade racial ainda é forte nos EUA. Infelizmente, o presidente Obama foi muito silencioso sobre esse tema. No sul dos EUA, há um órgão chamado Southern Poverty Law Center, uma organização de direitos civis do Alabama que identifica e mapeia grupos racistas e de ódio. Estão espalhados por todo o país. É muito triste que em 2016 a gente tenha grupos de supremacia racial, com nomes neonazistas, a Ku Klux Klan… E um problema ainda maior são as pessoas poderosas que simpatizam com essas ideias, como Donald Trump.

Acha que ele tem chances?

Há muita gente simpática a seu ponto de vista. E outras tantas se submetem a seu discurso do medo. E o medo funciona. São tempos muito perigosos nos EUA. Como alguém pode dizer o que ele diz sobre mexicanos, muçulmanos? É frustrante que a gente tenha que seguir lutando essas batalhas. Mas acho que Hillary será eleita. Contudo, se ela não o levar a sério, ele pode vencer.

E o que achou da candidatura do Bernie Sanders?

Foi um sopro de ar fresco em nossa política. Ele tem um vigor juvenil, apesar da idade. Sua plataforma era uma revolução, com ênfase no sistema de saúde e na educação, para tentar tirar o poder do 1% que controla a riqueza do país. Muita gente apoiou essa mensagem. Mas ele deu de cara com a máquina política dos Clinton. No entanto, motivou milhões de pessoas de uma forma que os outros não conseguiram.

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