Projeto Incluir Direito prepara estudantes negros para escritórios de advocacia

Um conjunto de entidades lançaram nesta segunda-feira (10/3), em São Paulo, uma iniciativa com o objetivo de ajudar estudantes de Direito negros a terem condições de igualdade nos processos seletivos de escritórios. O projeto Incluir Direito contará com uma série de cursos ao longo de 2017, incluindo postura profissional, línguas e produção de textos.

no Conjur

A iniciativa é uma parceria entre o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), o Instituto Presbiteriano Mackenzie e a Universidade Presbiteriana Mackenzie. A princípio, dez estudantes serão escolhidos. O edital do processo seletivo deve ser lançado na segunda quinzena de abril.

As entidades organizadoras esperam que, no final dos cursos, os participantes disputem vagas em escritórios de advocacia vinculados ao Cesa e garantam sua inserção profissional nos melhores postos de trabalho.

Até 2016, menos de 1% do quadro profissional de escritórios associados ao Cesa era formado por negros. Segundo o mesmo levantamento, nas seleções promovidas para a contratação de estagiários — principal meio de ingresso aos escritórios de advocacia —, o número de candidatos negros é ínfimo ou, em alguns casos, inexistente.

No futuro, o projeto pretende promover ações para alunos do ensino médio interessados na área jurídica, principalmente os autodeclarados negros, para orientá-los e direcioná-los quanto às suas escolhas profissionais.

O lançamento do projeto aconteceu as 19h desta segunda-feira (10/4), na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo (Rua da Consolação, 930).

MANIFESTO
Por uma advocacia mais diversa e inclusiva

As sociedades de advogados têm um longo caminho a percorrer para garantir maior diversidade étnico-racial em seus quadros profissionais.

De acordo com dados do IBGE de 2014, mais da metade da população brasileira (53,6%) é negra. No entanto, um levantamento informal realizado em 2016, junto a alguns dos escritórios associados ao CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, demonstrou que menos de 1% de todo o quadro profissional é composto por pessoas negras. Segundo o mesmo estudo, nas seleções promovidas para a contratação de estagiários – principal meio de ingresso aos escritórios de advocacia – o número de candidatos negros é ínfimo ou, em alguns casos, inexistente.

A baixa presença de advogadas e advogados negros é reflexo do acesso desigual à educação formal de qualidade desta parcela da população e do histórico de discriminação racial estruturante da sociedade brasileira, o que faz com que a população negra, sobretudo as mulheres, apresente condições de vida inferiores às da população branca no tocante a quase todos os direitos sociais: educação, saúde, trabalho e moradia, entre outros.

A implantação de políticas públicas de cunho afirmativo, na última década, deu início à democratização do acesso à universidade, Segundo dados do Ministério da Educação, em 1997, o percentual de jovens negros, entre 18 e 24 anos, que cursavam ou haviam concluído o ensino superior era de 1,8% e o de pardos, 2,2%. Em 2013, esses percentuais já haviam subido consideravelmente: para 8,8% e 11%, respectivamente.

Embora tenha havido avanços, as políticas universalistas estão longe de serem suficientes. Os números demonstram que o acesso da população negra à educação ainda é extremamente desigual. O fato de que jovens negros não estejam presentes nas principais sociedades de advogados do país somente evidencia esta situação de iniquidade no acesso à educação formal, ao ensino do Direito e, consequentemente, às carreiras jurídicas.

Para superar as desigualdades estruturais e valorizar a pluralidade étnica da sociedade brasileira, é necessário avançar muito mais, tanto no aprimorarmento de políticas públicas em todas as frentes quanto no fortalecimento de iniciativas da própria sociedade civil.

A faculdade de Direito é o curso com maior número de estudantes matriculados no Brasil, segundo dados do Censo da Educação Superior de 2015. Contudo, sabemos que não basta o acesso à universidade para que um estudante se desenvolva plenamente e tenha condições de acessar o mercado de trabalho. Para que jovens negros possam integrar-se nas carreiras jurídicas, além de uma educação de qualidade, devem ter oportunidades de desenvolvimento profissional que os permitam atuar como operadores do Direito e em condições de participar do processo prático de aprendizagem que se dá no dia a dia da atuação jurídica.

Diante disso, nós, Sociedades de Advogados associadas ao CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, estamos dispostos a colaborar para a transformação dessa realidade.

Para alinhar a prática e o discurso quanto à incorporação da diversidade nos escritórios de advocacia, manifestamos o nosso compromisso em promover a maior participação de negros no universo jurídico. Queremos contribuir com a formação acadêmica e complementar de jovens negros interessados em atuar como advogados.

Para tanto, nos comprometemos a apoiar um projeto piloto a ser realizado em parceria com o Instituto Presbiteriano Mackenzie, alunos da graduação, autodeclarados negros (pretos ou pardos), por meio do auxílio ao seu desenvolvimento educacional e pessoal. O Projeto INCLUIR DIREITO visa, incialmente, que jovens negros participem em condições de igualdade nos processos seletivos das sociedades de advogados associadas ao CESA e tenham, portanto, maior índice de aprovação.

Além disso, no futuro, iremos promover, junto aos alunos do ensino médio, ações voltadas principalmente aos estudantes autodeclarados negros que apresentem interesse na carreira jurídica, de modo a orientá-los e direcioná-los quanto às suas escolhas profissionais. Queremos que eles tenham as portas abertas e que vislumbrem reais possibilidades de atuar profissionalmente em um escritório de advocacia.


A realização deste projeto possibilita ao CESA e às suas associadas colaborar diretamente na busca de soluções que garantam igualdade de oportunidades e de desenvolvimento profissional a todos, atendendo, assim, aos desafios éticos da sociedade contemporânea.

Por meio desta iniciativa, pretendemos não só proporcionar um ambiente profissional mais diverso e igualitário, mas, sobretudo, manifestar o nosso compromisso com a redução das desigualdades e com a criação de oportunidades reais para que jovens negros formem parte da advocacia brasileira.

Somente quando mulheres e homens negros, que constituem mais da metade da população do país, puderem exercer o direito básico de participar das decisões políticas, sociais e econômicas, ou seja, o direito de participar de forma digna e integral de todas as instituições, sejam públicas ou privadas, teremos condições de afirmar que vivemos em uma sociedade plural e verdadeiramente democrática.

Orientados por este objetivo, subscrevemos este manifesto.

+ sobre o tema

Índios já viviam na Amazônia 11 mil anos antes da chegada dos colonizadores

Quando os primeiros exploradores espanhóis e portugueses descobriram a...

Polícia cumpre lei da vadiagem, de 1941, em Assis (SP)

    Polícia cumpre lei da vadiagem, de 1941, em Assis...

Alagoas vai sediar 1º Encontro Nacional de Jornalistas pela Igualdade Racial

  Cerca de 100 jornalistas devem participar, na próxima quarta-feira...

para lembrar

15 museus recebem programação especial sobre Direitos Humanos

Espaços recebem debates, oficinas, palestras e apresentações sobre o...

SP: sindicato protesta contra trabalho escravo em rede varejista

  O Sindicato dos Comerciários de São Paulo...

Vítimas de esterilização em projeto de eugenia ganham indenização

Legisladores do Estado americano da Virgínia determinaram o pagamento...

Conferência Internacional “As Fronteiras Raciais do Genocídio”

A Conferência Internacional “As Fronteiras Raciais do Genocídio” ocorreu...
spot_imgspot_img

Estudo relata violência contra jornalistas e comunicadores na Amazônia

Alertar a sociedade sobre a relação de crimes contra o meio ambiente e a violência contra jornalistas na Amazônia é o objetivo do estudo Fronteiras da Informação...

Brasil registrou 3,4 milhões de possíveis violações de direitos humanos em 2023, diz relatório da Anistia Internacional

Um relatório global divulgado nesta quarta-feira (24) pela Anistia Internacional, com dados de 156 países, revela que o Brasil registrou mais de 3,4 milhões...

Apenas 22% do público-alvo se vacinou contra a gripe

Dados do Ministério da Saúde mostram que apenas 22% do público-alvo se vacinou contra a gripe. Até o momento, 14,4 milhões de doses foram...
-+=