Um espetáculo para derrubar Lula

Quando surgiram as primeiras acusações contra Lula no âmbito da operação Lava Jato, achei que aquele era o início do fim do mito que foi criado em torno do ex-presidente. As denúncias foram se avolumando, empreiteiros foram presos, ameaças de derrubar a república foram feitas. Tudo indicava que seria o fim de Lula. Mas aí…

Aí prenderam novamente o José Dirceu, que já havia sido condenado e preso no processo do “mensalão” e estava cumprindo prisão domiciliar. Além disso, o juizparcialmente implacável Sergio Moro ordenou que fosse confiscada a casa em que vivia a mãe de José Dirceu. Foi quando comecei a estranhar um pouco o andar da carruagem. Mas como o Dirceu tinha mesmo sujado as mãos no mensalão, esse estranhamento logo passou.

Mas voltou quando fizeram a condução coercitiva do Lula. E aumentou quando foi divulgada a conversa telefônica entre ele e a presidente Dilma Rousseff – recuso-me a chamá-la de “ex-presidente”, ainda que não tenha votado nela – que resultou no impedimento de Lula assumir o ministério da Casa Civil.

São muito graves as acusações contra Lula. Porém, fazendo uma alusão da denúncia apresentada pelo Ministério Público com uma das leis de Newton – “a toda ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade” -, as provas contra o ex-presidente deveriam ser contundentes, cabais. Mas não são. O que há de concreto, de cabal, são as “convicções” dos procuradores.

(De fato, um deles afirmou o seguinte: “Não teremos aqui provas cabais…”.)

É inegável que Lula mergulhou de cabeça nos conchavos para garantir a governabilidade nesse nosso ridículo presidencialismo de coalizão. Impossível ele não ter conhecimento, na época em que acontecia, da existência do mensalão. Talvez Lula não tenha orquestrado ou criado o esquema, mas ou deixou levarem adiante ou fingiu que não viu. Isso deve ter se repetido com o petrolão.

Mas o fato é que se, por um lado, está mais do que claro que o ex-presidente Lula não é santo e tem muito o que explicar à Justiça, por outro, num País que se quer justo deveria ser inadmissível alguém ser submetido ao espetáculo acusatório a que Lula vem sendo submetido há meses sem que haja provas de sua culpa.

Causa espanto, também, ver denunciada a esposa do ex-presidente, dona Marisa Letícia. Sempre discreta, dona Marisa não tem, até onde se sabe, empresa alguma registrada em seu nome, registro de gastos exorbitantes no exterior ou sinal de esbanjamento de dinheiro no Brasil.

Há o fato concreto das reformas que foram feitas no sítio de Atibaia cuja propriedade é atribuída a Lula e no apartamento do Guarujá, o tríplex. O problema é que não conseguiram comprovar, mesmo após mais de um ano de investigações, que o apartamento é do casal, e tampouco o sítio. Não provaram nem uma coisa nem outra.

Nesse meio tempo, fui cada vez mais me afastando do grupo que estava crente que Lula seria preso a qualquer momento e me aproximando de um grupo que vê em todo esse espetáculo uma ação para destruir Lula politicamente.

Mas distante, é bom deixar claro, do grupo que ainda acredita numa completa inocência de Lula. Repito: Ele tem muito o que explicar. Mas o que o Ministério Público está fazendo não parece correto. Pode ser legal, mas não é certo.

Sabemos que todos os dias a justiça comete injustiças. Mas uma coisa é, por equívocos aos quais todo ser humano está sujeito, cometê-las sem ter consciência disso. Outra coisa, completamente diferente, é cometê-las de maneira proposital.

Se for esse o caso dos procuradores da Lava Jato, somos todos espectadores do maior assassinato de reputação da história do Brasil.

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