Caso Aranha: “Não se combate racismo com direito penal”

A opinião é de Silvio de Almeida, presidente do Instituto Luiz Gama, que questiona a aplicação de pena como única saída para o combate à discriminação racial; na manhã desta segunda (24), a Justiça fez um acordo com a algoz do goleiro Aranha, Patrícia Moreira, que terá que assistir aos jogos do Grêmio de uma delegacia 

Por Ivan Longo   Do: Spresso sp

A torcedora do Grêmio, Patrícia Moreira, e mais três acusados de injúria racial contra o goleiro Aranha, do Santos, aceitaram um acordo proposto pelo juiz Marco Aurélio Xavier para que o processo que os acusa seja suspenso. Ficou decidido, na audiência realizada em Porto Alegre, na manhã desta segunda-feira (24), que a jovem e os outros rapazes terão que se apresentar, durante 10 meses, a uma delegacia toda vez que houver jogos oficiais do Grêmio.

A medida se deu em detrimento de outra proposta, rejeitada pelos acusados, que era de usar uma tornozeleira eletrônica.

“Dada a repercussão, estamos tentando preservar a vida particular dessas pessoas”, afirmou, ao final da audiência, o juiz Marco Aurélio Xavier.

Para o advogado Silvio de Almeida, presidente do Instituto Luiz Gama, o acordo é um caminho justo até por ser previsto pela Constituição, mas é insuficiente no combate ao racismo.

“A questão vai além do âmbito jurídico: passa pelo modo como nós tratamos o racismo. A criminalização do racismo é insuficiente até porque as próprias instituições que deveriam combater o racismo, são racistas: os juízes, os promotores, advogados…  Todas as instituições partem do paradigma da exclusão racial. Temos que mudar as estruturas”, analisou.

Almeida pontuou ainda que, independente da decisão judicial, seja ela um acordo ou até uma pena mais severa, sempre vão passar a sensação de insuficiência, tendo em vista a própria natureza que tem a temática do racismo.

“Apostar no sistema penal para resolver problemas que são da estrutura da sociedade, vai causar a sensação de injustiça, porque quem é negro se sente dessa forma, sabe que na próxima esquina vai ser alvo de injúria ou de racismo propriamente dito (…) Isso serve até para mascarar o caráter do racismo, você acaba jogando tudo num plano subjetivo, como se racismo fosse só a pessoa se sentir atingida. O sistema penal despolitiza a questão do racismo”, disse.

O goleiro Aranha, desde que foi xingado de “macaco” e ridicularizado pelos torcedores gremistas naquele 28 de agosto, assumiu uma postura firme em não deixar passar em branco e assumir, com orgulho, sua condição de negro em um ambiente racista que é o futebol. Silvio de Almeida destaca essa postura como algo extremamente representativo para o combate ao racismo no país.

“Ao contrário de se submeter ao racismo, que é tão naturalizado no ambiente do futebol, ele agiu contra isso, até sofrendo críticas pessoais. Eu acho que é um caso emblemático pois ele rompe com a normalização do racismo num ambiente racista”, concluiu.

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