Aventuras de uma feminista no engate online

O que é que pode acontecer quando uma mulher se descreve como “feminista” no seu perfil do Tinder (para os que ainda não ouviram falar, é uma popular ‘app de encontros’ atualmente na berra)? Quando me colocaram esta questão achei, no cúmulo da minha ingenuidade, que a resposta masculina não poderia ser assim tão agressiva e idiota quanto isso. Talvez umas quantas piadas de mau gosto, mas pouco mais. Estava redondamente enganada. Laura Nowak, uma canadiana de 24 anos, decidiu fazer a experiência e o resultado é de deixar qualquer pessoa pasmada. Valem as suas respostas acutilantes, que tanto dão que pensar, quanto provocam umas belas gargalhadas a quem tem acompanhado a sua jornada nesta aplicação.

Por PAULA COSME PINTO, do Expresso

Descobri a aventura de Laura durante as minhas férias e desde aí faço parte dos muitos que seguem essa jornada e que não resistem aos print screens de algumas das conversas que ela depois partilha na sua conta de Instagram. Invariavelmente as suas respostas são certeiras, com um grau de ironia invejável e escritas com a destreza de quem já olha com muito sangue frio para as barbaridades que lhe chegam do mundo masculino. Onde mesmo muitos daqueles que tentam fazer um discurso de igualdade acabam por meter um pé na argola com uma tirada sexista.

“VAI PARA CASA FRITAR BACON, SUA FEMINISTA”

Muitos dos homens que abordam Laura tentam fazer-lhe ver que deve mudar a sua descrição no site, uma vez que ser feminista é tudo menos sexy (espreitem a explicação dela para este ponto, é maravilhosa). Outros mandam-na ir para casa cozinhar bacon, que é “onde as feministas devem estar” (e provavelmente todas as outras mulheres… certo?). Outros abordam-na com tiradas sexuais, partindo do princípio de que é “frígida” ou “lésbica” para se assumir com feminista. Outros, quando confrontados com as suas respostas e factos incontornáveis sobre desigualdade de género ou sobre a necessidade de respeito, mesmo que aquele seja um site de engate, insultam-na de alto a baixo. “Feia” e “puta” são os adjetivos favoritos destes senhores quando perdem a capacidade de argumentação. Altamente construtivo, não?

Não gosto de pôr toda a gente no mesmo saco – e quero acreditar que Laura até recebe muitas abordagens positivas no meio disto – mas pus-me a olhar com atenção para os perfis destes homens e concluí que não há um padrão entre eles. A única coisa que parecem, à partida, ter em comum é o facto de estarem inscritos numa app de encontros para conhecerem mulheres. Mas uma feminista, pelos vistos, não pode ser inserida nesse grupo.

Laura não se apoquenta e tem dado verdadeiras lições de civismo a muitos dos homens (ou melhor, das bestas) que a têm abordado. As dez conversas que partilho hoje convosco são algumas das minhas preferidas e que tão bem transmitem a forma como o sexismo persiste nos tempos de hoje. Mas se quiserem acompanhar diariamente a experiência desta jovem empregada de mesa canadiana basta entrarem no perfil dela no Instagram. Vale mesmo muito a pena.

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