Em livro, pesquisadores desmistificam suposta ausência de negros na Amazônia

por Monica Prestes

Obra produzida por 13 pesquisadores relata a influência da presença negra na literatura, na educação e nas manifestações culturais da região

Pesquisas inéditas e pioneiras sobre comunidades quilombolas, escravidão, alforrias, fugas escravas, a influência negra na literatura e na educação, festejos e manifestações culturais e racismo são abordadasno livro “O Fim do silêncio: presença negra na Amazônia”, obra coletiva que reúne 13 pesquisadores e uma perspectiva renovada sobre a influência dos negros na região.

“O livro é resultado de anos de pesquisa e meses de trabalho na organização dos temas. Ele vem para desmistificar um discurso secular de que na Amazônia não existiram negros nem escravidão e dar fim a esse silêncio. A presença negra é efetiva, significativa e marcou a história da nossa região, nos ajudando a desvendar o passado e entender o presente”, conta a historiadora Patrícia Melo Sampaio, organizadora da publicação.

Pesquisa

O livro, de 312 páginas, é resultado dos trabalhos finais de curso dos alunos das turmas de mestrado/doutorado em Sociedade e Cultura na Amazônia e de mestrado em História da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), e foi produzido com apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas (Fapeam) e do CNPq.

A obra, que foi construída ao longo do ano passado e organizada este ano, reúne pesquisadores de diferentes níveis, de alunos de mestrado a doutores em história, destacou Patrícia.

O grupo de pesquisa de História indígena e Escravidão africana na Amazônia, criado pela historiadora em 2000, também fundamentou as pesquisas, conta ela. “É um livro que tem muitas facetas e trata de diferentes aspectos da presença negra na Amazônia. Ele é resultado de uma ampla e sólida pesquisa e vai além do discurso.”

Revelações

Parte importante da história negra na Amazônia deve ser recontada a partir das pesquisas apresentadas no livro, disse Patrícia. A alforria escrava no Amazonas, tema do estudo do historiador Provino Pozza Neto, é uma delas. De acordo com a organizadora da obra, Neto revela informações de cartórios de Manaus que desvendam o mito de que a elite do Amazonas era a mais abolicionista do Brasil.

“Pelo contrário, a pesquisa mostra que 60% das alforrias de negros do Amazonas foi paga pelos próprios escravos, a maioria mulheres que trabalharam a vida inteira e guardaram recursos para comprar sua liberdade. Isso desmistifica um discurso de ideal abolicionista da sociedade amazonense”, apontou.

Outra pesquisa inédita presente na obra foi produzida pelo pesquisador Ygor Cavalcante. No capítulo “Fugido, ainda que sem motivo”, ele relata como famílias inteiras de escravos usavam o Amazonas como uma rota de fuga do Pará, atravessando áreas de várzea, desbravando a floresta e cortando rios, até chegar a Manaus ou à fronteira com o Peru.

Autores

Participam do livro os autores Ygor Olinto Rocha Cavalcante, que conta histórias de escravidão, liberdades e fugas no Amazonas imperial, Provino Pozza Neto, que trata das alforrias, Luís Carlos Bonates, relatando a história da Capoeira no Amazonas, Emmanuel de Almeida Farias Júnior, pesquisador dos quilombolas, e Maria José Nunes, no capítulo sobre negros e mulatos na selva.

As manifestações culturais também são retratadas por Sérgio Ivan Gil Braga, nas ‘danças e andanças’ negras, Jamily Souza, que conta a história da festa de São Benedito e Sidney Barata, que relata as experiências da cultura hip-hop. Por fim, os pesquisadores Arlete Anchieta e Gláucio Gama relatam a presença de estudantes universitário negros, enquanto Ednailda Santos fala dos docentes negros na Ufam.

A obra teve lançamento neste domingo, no Museu Amazônico, na rua Ramos Ferreira, Centro.

Fonte: A Critica

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