“Cheguei de propósito aos 261 quilos por medo de ser estuprada se novo”

A vida de Roxane Gay mudou totalmente quando ela tinha somente 12 anos e foi vítima de um estupro coletivo. O rapaz que era seu namorado a levou a um bosque e, juntamente com um grupo de amigos, a estupraram várias vezes. Morta de medo e sentindo muita culpa por ter confiado na pessoa que amava como uma ingênua, ela começou a se odiar e sentir nojo do seu próprio corpo.

Do Portal Raízes

Foto: Eva Blue / Flickr

“Na minha história de violência houve um rapaz. Eu o amava. Ele se chamava Christopher. Na realidade, ele não se chamava assim, mas eu não preciso lhes dizer isso. Christopher e vários amigos me estupraram no bosque, em uma cabana de caça abandonada, onde ninguém, a não ser aqueles rapazes, podiam escutar os meus gritos”. Roxane Gay

Roxane Gay e a comida como defesa diante do estupro

Este ódio e o medo de sofrer de novo um estupro a levaram a utilizar a comida como cura para as feridas da sua alma. Ela escolheu comer para se anular diante do mundo. A comida se transformou em sua defesa e na sua rota de fuga diante da dor.

Roxane sabia que as mulheres são estupradas só pelo fato de serem mulheres. Ela sabia que praticamente não existe nada que nós possamos fazer para evitar ser a presa de um animal, ou de animais que acreditam ser os donos de nossos corpos. Ela não podia fazer nada, exceto uma coisa: se tornar algo tão repulsivo, que nenhum homem fosse capaz de gostar dela ou tocá-la novamente.

“Sabia que eu não seria capaz de suportar outro estupro como aquele, de modo que comi porque pensei que, se o meu corpo se tornasse repulsivo, poderia manter os homens longe, seria mais desprezível, e já conhecia muito bem o seu desprezo”. Roxane Gay 

Sua ideia, essa ideia que ensinam às mulheres desde meninas, é a de que não devemos ocupar espaço. As mulheres devem ser magras e bonitas para agradar a vista e, especialmente, os homens na nossa sociedade. Não vamos esquecer que a televisão, as revistas e tudo o que consumimos nos envia a mensagem de que estar magro é um valor social, que fará as pessoas nos aceitarem e gostarem mais de nós.

Isto a levou a pesar 261 quilos, que a conduziram a uma cirurgia bariátrica para tentar salvar a sua vida. O seu corpo se transformou em uma prisão, onde ela guardou o ódio que sentia por si mesma. O silêncio diante do estupro foi o começo desta espiral de autodestruição que a mergulhou nas garras de uma compulsão alimentar.

Aprenda a se amar além do que a sociedade diz sobre o seu corpo

Na atualidade, Roxane Gay é uma importante escritora, colunista, professora universitária e feminista americana. Ela aprendeu a valorizar o seu corpo da forma como ele é. Agora ela sabe se amar muito além do que a sociedade, ou os meios de comunicação, dizem sobre o seu corpo.

“Fui capaz de admitir que me amo, apesar do aborrecimento de suspeitar que não deveria me amar”. Roxane Gay

Amor próprio

Em seu livro “Fome, Memórias do meu Corpo”, ela rompe o seu silêncio e incentiva o resto das mulheres a fazer o mesmo. Roxane ensina como deixou de se odiar, porque aprendeu que aquilo que aconteceu não foi culpa dela. Ela aprendeu a se amar da forma como ela é. A comida já não domina a sua vida, é ela mesma quem a conduz, sem deixar que o seu passado marque os seus passos.

Roxane é uma “sobrevivente”, ela não se considera uma vítima. Contando a sua verdade, sua vivência e a relação com o seu corpo, ela não quer provocar pena. Ela quer que o silêncio que nós acatamos quando estupram o nosso corpo se rompa, e ensina a nos amarmos muito além da nossa aparência. Ela ensina que, apesar de muitas coisas acontecerem em nossas vidas, somos nós as que decidimos como vivê-la, não somos culpadas, nem responsáveis diante de um estupro, e o ódio por nós mesmas nunca é a saída.

+ sobre o tema

Giovana Xavier: “Resistir é visibilizar o que fazemos todos os dias”

Convidada do Mulher com a Palavra, professora da UFRJ...

Lúcia Xavier lidera lista triplice para Ouvidoria Geral do RJ

Lúcia Maria Xavier de Castro, Pedro Daniel Strozenberg e...

As fontes ornamentais, o feng shui, a política e a democracia

Desconfiai de gente muito áspera e dura que nunca...

para lembrar

Dilma Souza Campos participa de livro da USP

CEO da Outra Praia é coautora do livro Publicidade...

Charlottesville é aqui: por que o brasileiro acha que é diferente do americano?

O Brasil é um país de exaltação escancarada da...

Antes o pessoal era político, hoje o pessoal é pessoal

- Trechos transcritos de palestras da feminista Gail Dines Por Carol...

Um ato de resistência

Escrever é uma maneira de sangrar. A sentença escolhida...
spot_imgspot_img

Prêmio Faz Diferença 2024: os finalistas na categoria Diversidade

Liderança feminina, Ana Fontes é a Chair do W20 Brasil, grupo oficial de engajamento do G20 em favor das mulheres. Desde 2017, quando a Austrália sediou...

Dona Ivone Lara, senhora da canção, é celebrada na passagem dos seus 104 anos

No próximo dia 13 comemora-se o Dia Nacional da Mulher Sambista, data consagrada ao nascimento da assistente social, cantora e compositora Yvonne Lara da Costa, nome...

Mulheres recebem 20% a menos que homens no Brasil

As mulheres brasileiras receberam salários, em média, 20,9% menores do que os homens em 2024 em mais de 53 mil estabelecimentos pesquisados com 100...
-+=