Conheça youtubers que debatem temas importantes para as mulheres negras

Vlogueiras ganham notoriedade e representatividade ao lidar com temáticas importantes mesclando bom humor e informação

Por  Adriana Izel, do Correio Braziliense

Gabi Oliveira, do canal DePretas, retrata o cotidiano das mulheres negras com linguagem mais simplificada e muito bom humor

Tratar algo com humor não é necessariamente fazer piada. Pode ser a capacidade de discutir de forma descontraída. Essa tem sido uma ferramenta usada por muitas youtubers para tratar de assuntos sérios ligados à militância negra, como forma de atingir um público maior garantindo representatividade e empoderamento. “Sempre que possível, trato os assuntos com bom humor, até porque, acredito que temas que contribuem para uma melhora da sociedade não necessariamente precisam ser tratados de forma pesada e impositiva”, defende Gabi Oliveira, responsável pelo canal DePretas.

O canal foi criado por Gabi Oliveira em 2015 por uma necessidade da jovem em compartilhar o conhecimento adquirido durante a experiência de estudar em uma universidade — oportunidade que ainda é inferior para população negra. No ano passado, pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que o percentual de negros nas universidades é 12,8%. “O canal, então, serviu como uma ponte entre assuntos acadêmicos e pessoas que talvez nunca teriam a oportunidade de acessar esses temas se não fosse pelo YouTube”, explica.

Atualmente, DePretas possui mais de 71 mil pessoas inscritas interessadas em acompanhar os vídeos da youtuber, que falam sobre o cotidiano das mulheres negras, estética e relações étnico-raciais no Brasil. “A estética, além de ser um assunto que me interessa pessoalmente, pois a maioria de nós mulheres negras só descobrimos nossa beleza tardiamente devido aos padrões impostos, entendo-a como isca para trazer pessoas de diversas camadas sociais ao canal”, revela. Para Gabi, o DePretas é uma forma de representatividade: “Acredito que não é necessário uma forte militância negra na internet, mas sim uma forte presença negra, seja falando do que for”.

Esse é um pensamento similar ao da jornalista Maíra Azevedo, conhecida pela alcunha Tia Má no YouTube: “Representatividade não é apenas palavra da moda. Observo que a minha visibilidade ocorre justamente por isso. Eu tenho a cara igual à de milhares. Preta, gorda e nordestina falando de amor, de autoestima… Então quando eu chego falando desses assuntos outras mulheres que são parecidas comigo se sentem representadas”.

2016. Crédito: Latinidades NINJA/Divulgação. Blogueira baiana Tia Má, uma das maiores influentes da internet atualmente.

Sucesso em diversas redes sociais, o canal de Tia Má foi criado em 2015 de forma despretensiosa — antes ela escrevia textos curtos em sua página oficial do Facebook como forma de orientação — e hoje possui quase 55 mil inscritos. Lá, a jornalista fala de autoestima, relacionamento, racismo, machismo, homofobia e assuntos comentados do momento, tudo isso com humor e bastante clareza. “Utilizo o humor como ferramenta de reflexão”, defende.

Além da internet

Crédito: Lucas Gabriel/Divulgação. Kenia Maria, atriz e youtuber.

A atriz, escritora e youtuber Kenia Maria é outro exemplo. Responsável pelo canal Tá bom pra você?, ela escancara a ausência da representação negra na publicidade brasileira ao recriar as propagandas em formato de esquetes da história de uma família negra de classe média. “Quando recriamos as peças publicitárias, a nossa ideia era chamar a atenção para uma realidade bizarra. Somos mais de 50% da população, consumimos mais de R$ 1 trilhão por ano e não somos respeitados como consumidores para uma indústria que insiste dizer que não existimos e que nosso dinheiro não existe. A ideia não é criticar marcas e, sim, dialogar com todo um conceito de propaganda que parece pertencer ao século 18, quando ainda nem tínhamos televisão”, defende Kenia.

O canal Tá bom pra você? surgiu em 2007 e desde então possui quase cinco mil inscritos. A repercussão na internet garantiu que Kenia Maria, ao lado do marido, o também ator Érico Brás, transformasse o projeto também em stand-up, o espetáculo Double black, que deve estrear no próximo semestre no país. Além disso, o trabalho no canal com a união de vários outros projetos de Kenia Maria ligados à negritude garantiram a youtuber um título inédito, o de Defensora dos Direitos das Mulheres Negras da ONU Mulheres. “Representa muito, praticamente um caminho de vida. Somos muitas e eu não estou só. É claro que fico lisonjeada com o cargo, mas também não só pelo status que essa nomeação traz e sim pelo reconhecimento da minha história”, comenta.

Kenia Maria ainda possui outro canal no YouTube, Tá bom pra elas, dedicado ao público negro feminino, em que faz entrevistas e discute temas voltados às mulheres negras, como violência doméstica e assédio sexual. “O Brasil é o quinto país mais violento para uma mulher viver. A lei Maria da Penha ajudou muito na redução da violência contra mulher. A violência contra mulheres brancas diminuiu 10% em 10 anos de lei. O movimento #mexeucomumamexeucomtodas foi um avanço e milhares de pessoas se comoveram. No entanto, nós não conseguimos a mesma comoção quando se trata de mulheres negras, que em 10 anos sofreram um aumento de 54% nos casos de violência. E isso é um fato”, completa.

Na telinha

Chewing gum
A comédia britânica acompanha a protagonista Tracey Gordon (Michael Coel), uma jovem que cresceu em uma família religiosa e nunca teve uma experiência sexual. Por trás desse enredo, a personagem percebe os problemas que enfrenta por ser mulher, negra e da periferia de Londres. As duas temporadas estão disponíveis na Netflix.

Insecure

Protagonizado pela atriz Issa Rae (que ganhou repercussão exatamente no YouTube), a produção de comédia mostra o dia a dia da mulher negra nos Estados Unidos por meio das personagens Issa (papel de Issa Rae) e Molly (Yvonne Orji). O principal trunfo é mostrar as inseguranças das mulheres negras, que são bem diferentes das mulheres brancas. Primeira temporada disponível na HBO GO.

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