Um grupo de amigos se reuniu no WhatsApp para conversar sobre as manifestações antirracistas que varrem o mundo. Formado por historiadores como Maria do Carmo Aguilar e Marçal de Menezes Paredes, o bate-papo evoluiu para a decisão de agir contra o racismo coletivamente a partir das suas vidas cotidianas. Virou o manifesto “Porto Alegre contra o racismo na rua”, petição recém-criada que já ultrapassa 600 assinaturas e que ganhou o apoio de diversas entidades unidas ao propósito de alterar o nome da rua Barão de Cotegipe, personagem da história brasileira que batiza várias localidades brasileiras e também um logradouro no bairro São João, área nobre da capital gaúcha.
O objetivo é eliminar a homenagem a “um barão, um senador, isolado em um contexto cultural que já reconhecia a brutalidade da escravidão, e que votou contrário à sua abolição”, explica o manifesto. “A Porto Alegre que reconhece Abdias do Nascimento, que se encontra no Largo Zumbi dos Palmares, nos Campos da Redenção, que afirma a dignidade do Areal da Baronesa, não merece uma rua com o nome de Barão de Cotegipe! É uma violência silenciosa que se perpetua no cotidiano da cidade.”
O documento é endossado por instituições como Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), Associação dos Trabalhadores em Educação do Município de Porto Alegre, Democracia Gremista, Federação Israelita do Rio Grande do Sul, Jornal Estado de Direito, Laboratório de Ensino de História e Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico e Grupo de Trabalho Ensino de História e Educação da Associação Nacional de História (seção Rio Grande do Sul).
“A história é um embate”
A petição será encaminhada à Câmara de Vereadores de Porto Alegre, onde os organizadores afirmam que também já há adeptos à causa. “Não nos parece adequado neste momento propor um nome em substituição, mas sim abrir o debate sobre a construção dos símbolos e democratizar a memória da cidade”, diz ao Preta, Preto, Pretinhos Plínio Melgaré, professor de direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), que deu início à iniciativa.
“Não queremos apagar uma história para substituir por outra. Do que se trata é de dar visibilidade, de que há uma multiplicidade de histórias negras nas Américas que precisam ser contadas”, afirma ao blog Maria do Carmo Aguilar, doutora em história pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e também impulsora do movimento. “A história é um embate. As pessoas no presente estão disputando histórias do passado, e não há problema nenhum nisso. A história sempre está em processo de disputa e mudança. Por que algumas histórias são absolutas, e outras não?”, reflete a investigadora.
“As pessoas não conhecem a trajetória desse sujeito, que foi um dos heróis do Império. Não sabem por que ele é homenageado no Brasil inteiro, um sujeito perverso e infame. E essa não é uma pauta só dos negros, mas sim de todos”, diz Melgaré. “Porto Alegre tem outros escravagistas homenageados, mas esse é um começo.”